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Histórias

VIDA REAL: seu Ary, o fazedor de ternos e gravatas

A moça já estava de saída. Mas o senhor de cabelos brancos gentilmente pediu que ficasse um pouco mais por ali. Queria que todos à sua volta soubessem que ela, há muitos anos, é  uma de suas clientes mais ilustres. “Sabe quem é ela?”, pergunta ele ao rapaz recém chegado. “É uma das princesas da Oktober”, conta, sorrindo e orgulhoso. Depois seu Ary, ou Polaco como é conhecido, segue o ritual: acompanha a soberana até o portão, como faz com todos os clientes, e retorna para sua máquina de costura.

Embora resida em Santa Cruz do Sul há mais de cinquenta anos, seu Ary, quando jovem, também foi um ilustre morador em Vila Teodoro, interior de Venâncio Aires. Em 1956, então com 13 anos, Ary Waclawovski iniciou sua vida profissional em uma função um tanto inusitada. Filho de marceneiro, por muitas vezes era acordado no meio da noite e, à espreita, ouvia a notícia que geralmente seu pai, Otto, era o primeiro a saber:  “Morreu fulano de tal, tem como fazer o caixão?”. Na mesma hora, pai e filho se dirigiam até a casa do falecido para tirar as medidas e providenciar o caixão para o velório.

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Na hora do funeral, também era o menino Ary que, com um traje preto, estava à frente da procissão segurando uma cruz com as duas mãos. “Eu não podia andar muito depressa senão o padre já me puxava para trás”, recorda. Na época, era muito comum os filhos darem sequência aos negócios da família.  Mas Ary, meio assustado com históricos de morte, optou por não seguir a profissão do pai.

Passado e presente – Em Vila Teodoro, assim como na maioria das localidades da época, havia um alfaiate. E os serviços eram muitos. Especialmente às vésperas das chamadas kerbs, festas promovidas pelo menos uma vez ao ano em cada comunidade. Por tradição, os homens deveriam usar terno. E os pedidos para confeccionar casacos e calças apareciam às dezenas. Foi então que o jovem Ary tomou uma decisão: em vez de auxiliar seu pai na lida com caixões para defuntos, aprenderia a pregar botões e colocar fechos.

Seu primeiro mestre, Otilo Weiss, um distinto alfaiate do lugar, morava a poucos metros de sua casa. Foi com ele que o garoto sonhador descobriu que sua profissão, dali em diante, seria a de manusear agulhas finas, mesmo  que inicialmente insistissem em escapar de suas mãos. De tanto furar os dedos, seu Ary aprendeu a confeccionar até seu próprio traje para o casamento com sua amada, Marsalda. Mas o seu sonho era o de dar um passo a mais. Queria deixar de ser um mero auxiliar e ter sua própria máquina de costura. E foi o que fez. Adquiriu uma com o dinheiro que guardou no período de serviço militar.

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Do tio Hugo, dono de uma alfaiataria em Porto Alegre, ganhou um livro, uma espécie de manual para cortar bem os tecidos. Mudou-se para Linha Saraiva, depois para Santa Cruz do Sul, onde trabalhou com Erwino Staub, um renomado costureiro. Em pouco tempo, o filho do marceneiro deixou de ser o simples Ary para se tornar o senhor Waclawovsky dos ternos e gravatas, ofício que mantém até hoje, aos 75 anos, no Bairro Cohab.  A máquina de costura, da marca Torpedo, a primeira que adquiriu há mais de cinquenta anos, é sua fiel companheira no ambiente mais singelo da casa. Ah, só há um detalhe a lamentar nessa história: ele não se sente mais em condições em aceitar pedidos. Portanto, alguém ousa dar sequência a esse nobre e necessário legado? 

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