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Polícia

A violência que começa precocemente

A ousadia de assaltantes, que renderam 60 pessoas em um salão comunitário em Santa Cruz do Sul e atacaram um clube em Rio Pardo, no fim desta semana, contrasta com a pouca idade dos possíveis envolvidos. Entre quinta e sexta-feira, três suspeitos de participação nesses crimes foram presos. Dois deles tinham 19 anos e o outro, 23. Também identificado como autor do roubo a um armazém, foi preso outro jovem, de 18 anos. O comparsa dele, de 21, está foragido. A polícia capturou ainda um rapaz de 19 anos, que confessou ter roubado e batido um carro.

Os jantares nas quinta-feiras já são tradicionais entre os frequentadores do Clube de Bolão Gororoba, inaugurado há 70 anos em Rio Pardo. Desta vez, no entanto, a confraternização foi interrompida mais cedo. Quando os criminosos invadiram o salão, na Rua Apolinário Francisco de Borba, alguns jogavam cartas e outros conversavam junto às mesas. Um aposentado, de 70 anos, estava sentado de costas para a porta, quando foi derrubado da cadeira. “Me deram uma coronhada no rosto e pontapés nas pernas. Ele ficou indignado porque eu não tinha dinheiro. Ficou irritado. Fizeram isso com outras pessoas. Vários receberam pontapés. Botavam o revólver na cabeça das pessoas e pediam dinheiro”, relata.

Em uma ação rápida, os criminosos vasculharam os bolsos das vítimas e roubaram celulares, dinheiro e cheques, além de uma quantia que estava no caixa do clube. Na fuga, eles ainda colidiram o carro em que estavam, mas conseguiram escapar. “A gente já comentava que podia acontecer. Mas eram dez horas da noite. Ninguém esperava. Todos ficaram muito assustados.” Mais cedo tinha sido realizada uma reunião sobre a reforma da Previdência, com a participação do deputado federal Elvino Bohn Gass (PT). O parlamentar já havia deixado o local quando o assalto aconteceu. 

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No fim da manhã, a Polícia Civil prendeu um rapaz em flagrante por tráfico de drogas. Gabriel de Borba Nicaretta, 19 anos, foi preso na Vila Pinheiros com um revólver, porções de crack e de maconha. Segundo o delegado Anderson Faturi, o preso usava tornozeleira de monitoramento eletrônico para apenados e estava traficando. Ele é suspeito de ter participado do assalto ao clube. 

Na noite de quarta-feira, um roubo semelhante foi registrado em Santa Cruz do Sul. Cerca de 60 pessoas ficaram na mira de quatro criminosos durante um roubo no salão comunitário da Comunidade São Francisco Xavier, em Linha João Alves. Na fuga, os bandidos bateram o carro que tinham roubado e tiveram que se embrenhar em matagais. Dois suspeitos foram presos pela Brigada Militar. Um deles, de 23 anos, era foragido do Presídio Estadual de Rio Pardo. 

Câmeras e grades não impedem crime

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Em julho do ano passado, o dono de um armazém na Rua General Osório, em Rio Pardo, decidiu começar a atender seus clientes através de um portão de ferro. Aos 70 anos, o comerciante foi rendido e agredido por um assaltante com um facão. Depois disso, decidiu reforçar a segurança. Além das grades, instalou uma câmera. Esse dispositivo foi essencial para que a Polícia Civil descobrisse a autoria de um novo assalto, do qual ele foi vítima no início deste mês. 

Nessa sexta-feira, os policiais cumpriram dois mandados de prisão no Parque São Jorge. Maicon Rosário, 18 anos, foi preso. Na casa dele foi encontrado um simulacro de arma de fogo, que teria sido usado no roubo, e uma camiseta idêntica à usada pelo assaltante. Elias Mallet Moreira, 21 anos, está foragido. Os policiais apreenderam uma espingarda e munições na casa dele.

Assaltantes atacam fazenda no interior

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Pelo menos sete pessoas foram rendidas durante um assalto a uma fazenda, no interior de Rio Pardo. Os criminosos permaneceram no local por nove horas e roubaram três tratores. Segundo a Polícia Civil, um casal de caseiros contou que foi atacado por volta das 20h30 de quinta-feira. 

Quatro homens encapuzados, armados, com luvas e roupas longas, invadiram a propriedade em Iruí, às margens do quilômetro 231 da BR-290. O local fica a cerca de 15 quilômetros da área urbana de Pantano Grande. Eles renderam os dois e uma menina, filha deles. Com pistolas e revólveres, mantiveram as vítimas na mira das armas. 

Os criminosos ainda renderam o dono da propriedade e outros funcionários que estavam na fazenda. O proprietário foi obrigado a seguir com parte do bando em seu carro até a casa dele, em Cachoeira do Sul, onde roubaram eletrônicos e joias. Os ladrões então regressaram à fazenda, de onde levaram três tratores. Um caminhão-prancha foi usado para transportar os veículos, que estavam ao lado da residência dos caseiros. Por volta das 6 horas dessa sexta-feira, eles deixaram a propriedade. 

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Segundo o delegado Anderson Faturi, os assaltos a propriedades rurais para roubo de tratores estão sendo investigados em parceria com o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) de Porto Alegre. No mês passado, outro caso idêntico foi registrado em Pantano Grande. “A princípio é a mesma quadrilha que está agindo em todo o Estado”, explica o delegado. A polícia já recuperou dois tratores que haviam sido levados em outros roubos.

Audiência pública

Uma série de assaltos, que preocupa agricultores de Pantano Grande, levou à realização de uma audiência pública na noite dessa sexta-feira. Os moradores se reuniram com vereadores, outras autoridades do município e representantes das polícias. Segundo o vice-prefeito, Ivan Trevisan, já houve uma reunião com o secretário de Segurança Pública do Estado, Cezar Schirmer, pedindo reforço no efetivo policial. Um novo encontro foi marcado para a próxima semana, quando uma comissão deverá levar mais informações e reivindicações ao governo estadual.

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Jovem confessa que roubou e bateu veículo

A investigação de um roubo de veículo, ocorrido no Centro de Santa Cruz do Sul, terminou com um preso. Israel Bernardes Sizilia, de 19 anos, foi capturado pela equipe da Delegacia Especializada em Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas (Defrec) nesta semana. Ele confessou que roubou o carro e ainda o bateu durante a fuga. 

No início da manhã de 28 de janeiro, a proprietária do veículo chegava em um prédio onde trabalha, na Rua Fernando Abott, próximo do entroncamento com a Rua Marechal Floriano, quando foi vítima do assalto. A mulher estacionou o Sandero e logo depois foi abordada por uma dupla. Um dos criminosos apontou uma arma para a cabeça da vítima e ordenou que ela descesse do carro sem levar nada. 

Israel, preso nessa quinta-feira, confirmou que caminhava com um amigo quando viu a motorista estacionar o carro e decidiu abordá-la. Disse que usou um simulacro de arma de fogo para intimidar a vítima. O rapaz alegou que tinha passado a madrugada em uma distribuidora de bebidas e circulando de carro com outros amigos, por isso estaria embriagado no momento do roubo. 

O preso foi quem saiu dirigindo do local do crime. A proprietária relatou que o assaltante parecia não saber dirigir, pois demorou a conseguir sair do estacionamento. Durante a fuga, ele acabou batendo a lateral do veículo contra um poste. Eles abandonaram o carro em uma região de mata perto do Residencial Viver Bem. Israel alegou que seu comparsa teria roubado o celular, um carregador e uma máquina de cartões da vítima que estavam dentro do veículo. Preso de forma preventiva, ele foi encaminhado ao Presídio Regional.

Em Sobradinho

Uma residência foi alvo de bandidos em Sobradinho na noite dessa quinta-feira. Na localidade de Linha Quinca, dois criminosos encapuzados e armados invadiram uma casa por volta das 20 horas. Eles surpreenderam a caseira e levaram um aparelho celular, uma televisão e um notebook. No local ainda moram o filho e o neto da mulher. Os assaltantes fizeram ameaças às vítimas e fugiram logo depois. A Polícia Civil está investigando o caso.

“Onde a escola falha, o crime acolhe”

Doutor em Sociologia e consultor em segurança pública e direitos humanos, Marcos Rolim é autor do livro A formação de jovens violentos: estudo sobre a etiologia da violência extrema, lançado no ano passado. Ele esteve em Santa Cruz do Sul nesta semana, na Unisc, para uma palestra sobre o tema. A obra é baseada em uma pesquisa na qual  ele ouviu jovens para tentar compreender o que os leva a praticar crimes violentos. Para isso,  buscou entender a história de vida de cada um. “O que menos me interessava eram os delitos cometidos por eles”, conta. 

A pesquisa, que durou quatro anos, teve início com 17 internos da Fundação de Atendimento Socio Educativo (Fase) e acabou se estendendo para ex-colegas deles. Cada interno indicou um colega de infância do qual tivesse certeza que não tinha se envolvido com o mundo do crime. 16 foram indicados. Destes, Rolim conseguiu localizar 11. “Então eu tinha dois grupos de jovens homens, com a mesma idade, que se criaram na mesma região, e foram para rumos completamente diferentes. Um grupo de jovens trabalhadores e um grupo de jovens matadores.” 

Após as entrevistas com os dois grupos, o sociólogo decidiu expandir a pesquisa. Ele ouviu detentos do Presídio Central, um grupo de presos condenados por crimes sem violência e outro de condenados por homicídio. Ainda fez contato com jovens da periferia de Porto Alegre, sem antecedentes criminais. No total, foram 111 entrevistados. Ao fim da pesquisa, Rolim concluiu que um fator que ele chama de “treinamento violento” contribui para empurrar os jovens ao mundo do crime. 

O autor explica que isso é o que acontece com jovens quando, por volta dos 12 ou 13, fracassam nos estudos e decidem abandonar a escola. Muitos desses meninos acabam sendo recrutados pelo crime, especialmente o tráfico, onde alguém  irá ensiná-lo a usar uma arma e matar. “Exatamente ali onde a escola falha, o crime acolhe esses jovens. Há uma socialização perversa, portanto. Do ponto de vista estatístico, isso corresponde a 52% dessa disposição de matar. É praticamente metade do problema”, alerta o especialista.

PONTO A PONTO

Crime x educação
Se a pesquisa estiver correta, a coisa mais importante que um gestor de um município pode fazer para prevenir a violência é reduzir a evasão escolar. A evasão é um tema importantíssimo no Brasil para compreender essa dinâmica do que eu chamo de socialização perversa na periferia. Isso chama a atenção para o tema da educação, que a gente vem subestimando talvez no que diz respeito à violência e à criminalidade.

Novo perfil do tráfico
Há uma mudança no perfil do tráfico no Rio Grande do Sul. Era comum que nós tivéssemos um tráfico no qual havia o líder de um grupo que atuava em certo bairro e era filho daquela região. Ele tinha nascido e se criado ali. Eram traficantes que tinham inclusive um papel de relação com a comunidade, de ajudar aquelas pessoas em momentos difíceis. Faziam esse tipo de ‘assistência’ até para se legitimar e ter apoio da comunidade. Esse padrão vai sendo substituído por um outro padrão, que é o das facções criminais. 

Presídios x facções  
Os presídios brasileiros funcionam como recrutadores para as facções. Se um jovem é preso, um traficante que não está vinculado a facção nenhuma, ele vai ter que escolher uma delas. E depois dessa experiência é muito comum que esse jovem, quando sair, acabe tendo tarefas a cumprir para a facção. Vai ter que assaltar para mandar dinheiro e uma série de ações desse tipo. As facções criminais estão sendo ajudadas pelo Estado. O Estado, ao prender de forma descriteriosa e em massa, recruta mão de obra para elas. 

Prisões 
Se o Brasil continuar nessa burrice de encher os presídios com jovens pobres ligados ao tráfico, a gente vai ampliar o poder do crime no Brasil, como está fazendo há muito tempo. A prisão deve ser um lugar para aquela pessoa que matou, que estuprou, praticou um crime com violência. Não para que a gente se vingue dessa pessoa, mas para se proteger dela. A prisão significa uma proteção social. Esse não é o perfil dos presos no Brasil. O Rio Grande do Sul tem 3% de homicidas na massa carcerária. São 35 mil presos e 3% estão na cadeia porque mataram alguém. O Brasil tem 10% e já é muito pouco. A grande maioria dos encarcerados é por crime patrimonial ou tráfico de drogas. A gente tem muita dificuldade de prender autores de crimes mais graves porque isso demanda investigação. Há muitos matadores soltos. E a gente segue prendendo traficante.

Combate ao tráfico
Quando a polícia prende um menino de 19 anos, que está traficando na periferia, essa prisão não produz nenhum efeito na guerra contra o tráfico. Dez minutos depois, há uma fila para ocupar o lugar desse jovem que foi preso. Então eu não toco no negócio, mas agencio a possibilidade de esse rapaz se somar a uma facção. Se vamos insistir na repressão, seria preciso que fôssemos nos financiadores do negócio, em quem transporta, quem traz a droga, que se reconstruísse as rotas que alimentam o tráfico. Por exemplo, o Rio Grande do Sul não produz cocaína. Então de onde vem a droga? Esse é o trabalho que a polícia deveria fazer.

Guarda Municipal
Eu sou muito a favor das guardas municipais, mas guardas pensadas naquele papel que cabe ao município, que é a prevenção das dinâmicas criminais e violentas. Em Canoas, por exemplo, eles desenvolveram o projeto ‘todo jovem conta’. Esse projeto identificava quais eram os meninos que tinham alguma conduta problemática e os riscos de que ele saísse da escola. A guarda começava a visitar as famílias, para fazer um trabalho de prevenção e descobrir o que estava acontecendo, qual era o problema que esse garoto vinha enfrentando. É um trabalho fundamental na redução da evasão escolar. Então, se a gente pensar a Guarda Municipal nessa linha preventiva, acho um ótimo investimento. Se pensar como uma pequena polícia militar, é perda de tempo e dinheiro. 

Como agir
Se todos deixarem de sair à noite, as ruas ficam sem pessoas, se elas ficarem sem pessoas, os bandidos tomam conta. A presença nos espaços públicos protege as pessoas. Mas o mais importante é que as pessoas cobrem do poder público políticas de segurança, cobrem resultados. Uma política de segurança pública se faz com educação, com saúde, com polícia. O cidadão acaba sendo envolvido por esse discurso demagógico, de que é tão simples resolver o problema da violência no Brasil,é só ter mais presídios e mais polícia. E tudo se resolve. A gente vem perseguindo
esse caminho há muito tempo e a prova de que ele não dá certo está aí.

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