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Aplicação de silicone industrial

“É como usar água de esgoto para beber”, diz cirurgião plástico

Foto: Reprodução/Facebook

Mélani Aguiar teria pago R$ 2 mil pelo procedimento que a matou, segundo a polícia

A polícia investiga uma morte que ocorreu em Santa Cruz do Sul após a aplicação de silicone industrial no corpo de uma jovem de 20 anos. A vítima, Mélani Aguiar, era transexual e veio de Santa Maria até Santa Cruz para fazer o procedimento estético clandestino. Ela foi hospitalizada no dia 27 de agosto deste ano, após se submeter a aplicação da substância nos glúteos, e acabou falecendo quatro dias depois.

O cirurgião plástico Oscar Sachett, de Santa Cruz, alerta que, apesar de em muitos procedimentos estéticos não ser necessária a internação hospitalar ou ação pós-operatória, a prática sempre requer cuidados. Quando realizados de forma inadequada, podem apresentar sérios riscos à saúde dos pacientes.

Para Sachett, médico desde 1978 e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, o uso ilegal de silicone industrial, como no caso de Mélani, é um exemplo da falta de comprometimento de pessoas que não são profissionais de saúde e não têm conhecimento do que fazem. O cirurgião plástico salienta que o produto que matou a jovem, apesar de ser de um tipo semelhante ao usado nas próteses de mama, é impuro e tem seu uso médico proibido.

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“A origem da coisa é a mesma, mas a purificação do produto, não. A grosso modo, seria como usar água do esgoto para beber”, comparou o profissional. Ele alerta que existe um mercado muito grande ligado à clandestinidade, praticado por pessoas que não têm formação médica. Muitas delas aproveitam o interesse da população em realizar procedimentos estéticos a um custo baixo e acabam oferecendo um serviço ilegal e muito perigoso. O resultado de tudo isso são práticas malsucedi das, sem qualquer regulamentação e sem o cumprimento de medidas sanitárias.

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“O que se tem visto nesse meio, em que uma pessoa sem formação injeta produtos ilícitos na outra, é que no momento pode até ficar bonito. Mas isso não tem compatibilidade com o organismo humano. A reação é proporcional ao volume que foi colocado e à pureza ou não do que foi colocado. Na maioria das vezes, o silicone industrial é aplicado com uma seringa e agulha. Se essa agulha penetrar numa veia, isso gera uma trombose, uma embolia pulmonar, e o sujeito morre na hora ou alguns dias depois”, alerta o médico.

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De acordo com Sachett, quando ocorrem problemas com a utilização de silicone industrial, este se desloca com uma velocidade muito grande pelo organismo e o tratamento é muito difícil. Ele lembra também que a qualidade do produto empregado em implantes de silicone é fundamental. Existem diferentes opções no mercado e a característica pode variar de acordo com quem fabrica a prótese. O cirurgião ressalta que os procedimentos realizados no mercado legal sempre utilizam materiais com procedência de fabricação.

“A prótese vem lacrada, com número de referência. Quem compra é a paciente da distribuidora, que entrega para o médico. Então, existe uma sequência, na qual ninguém consegue comprar se não for cadastrado no local, com confirmação de especialista, pelo menos do Conselho Regional de Medicina.”

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Responsável
Oscar Sachett ressalta que o profissional é o responsável pelo material que aplica no cliente. Por isso, o mercado exige uma formação qualificada dos profissionais da medicina e conhecimento para dominar o que é ministrado ao paciente. “O botox, por exemplo, é uma substância que paralisa determinados músculos, assim como a toxina produzida em um alimento estragado. É o mesmo produto. Só que esse produto é induzido a ser feito no laboratório e tem que ficar hermeticamente fechado e na temperatura ideal o tempo inteiro, desde produzido até ser aplicado”, comenta o médico.

“Tu tens que saber se o laboratório é sério, tens que saber até quem trouxe, pois se veio em um caminhão sem condições, o produto já não tem função. É uma série de aspectos técnicos que devem ser cumpridos para ser bem-feito”, finaliza o cirurgião plástico.

Entenda
A investigação do caso está a cargo da delegada Ana Luísa Aita Pippi, titular da 1ª DP de Santa Cruz. Por meio do telefone celular de Mélani, a polícia chegou até a autora do procedimento, que seria conhecida por aplicar silicone de forma clandestina em transexuais em todo o Estado. A polícia também encontrou no telefone da vítima o comprovante de uma compra feita pela internet do silicone que seria usado em seu corpo.

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Em Santa Cruz do Sul, Mélani submeteu-se ao procedimento em uma residência onde alugou um quarto. Logo após receber a aplicação do silicone industrial nos glúteos, a vítima começou a passar mal e foi abandonada, agonizando, pela mulher responsável pelo procedimento clandestino. “Na hora ela já se sentiu mal. A mulher foi embora e deixou a vítima naquele estado. Ela foi socorrida pela dona da casa na qual ela ficava, que chamou o Samu e os familiares, haja visto a gravidade dessa aplicação, desse silicone totalmente irregular”, afirmou a delegada. Mélani Aguiar morreu no dia 31 de agosto, após ficar em coma no Hospital Santa Cruz.

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Confissão
Moradora de Caxias do Sul, a mulher confessou o crime após o cumprimento de mandado de busca e apreensão em sua residência, na Serra Gaúcha. Segundo a Polícia Civil, ela já realizava esquemas do tipo há quatro anos. Na casa, os policiais encontraram produtos que eram utilizados nos procedimentos estéticos ilegais, como seringas e material de aplicação do silicone industrial. A mulher será indiciada por homicídio doloso e exercício ilegal da medicina com fins lucrativos. A investigação apurou que há relatos de outras pessoas que passaram por procedimentos com a mesma responsável por aplicar o silicone em Mélani Aguiar, e que convivem com dores pelo corpo. A acusada já teria praticado seus serviços em diferentes cidades do Rio Grande do Sul.

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O silicone que causou a morte de Mélani é utilizado na indústria mecânica, na limpeza de peças de motores, ou como vedação de pisos e azulejos. O emprego estético desse tipo de produto é proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pois é uma substância tóxica que representa grandes riscos para a saúde. Sua aplicação em humanos é tipificada na lei como crime contra a saúde pública.

“É um silicone totalmente líquido, cheio de partículas impróprias para o corpo, que podem causar inflamações e infecções gravíssimas, e até o óbito, como aconteceu no caso da Mélani”, explicou a delegada Ana Luísa Pippi. “É um fato grave, que chama a atenção. É triste, mas espero que sirva de alerta para as pessoas que desejam modificar o corpo em busca da forma perfeita, mas, atraídas por um valor econômico bem baixo, acabam aplicando esse silicone industrial ao invés de serem submetidas a práticas com o produto correto: o silicone em gel, aplicado por um médico, cirurgião plástico, em uma clínica, um local apto para isso”, completou a titular da 1ª DP.

Em entrevista para a imprensa de Santa Maria, parentes de Mélani revelaram surpresa com o caso, dizendo que a família agora espera por justiça. “Ela era uma menina incrível, de bom coração e que nunca fez nada para ninguém. Uma boa filha, uma boa cunhada e uma boa irmã. Esperamos por justiça porque ela não foi a primeira e nem será a última vítima disso”, disse Cleunice Pereira, cunhada de Mélani. A vítima teria pago R$ 2 mil pelo procedimento ilegal.

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