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Reflexos da operação que recolheu 12 toneladas de produtos considerados impróprios ao consumo são percebidos nas gôndolas e refrigeradores dos supermercados de Santa Cruz do Sul. Basta dar um giro pelos principais estabelecimentos para perceber que não estão sendo vendidos frios fatiados e carnes em bandejas. A ação do Ministério Público ocorreu no final da semana passada e acabou servindo de alerta a consumidores e, principalmente, empresas do ramo. Mesmo os mercados que escaparam à força-tarefa precisam se adequar, sob risco de serem os próximos alvos da Promotoria.
Na blitz, os fiscais levaram em consideração uma regra que baliza todas as questões: para que a qualidade seja mantida, a condição do produto não pode sofrer alterações no percurso entre a indústria e o consumidor. Dessa forma, os alimentos congelados, por exemplo, devem ficar no máximo a 18 graus negativos nos pontos de venda. Já os alimentos resfriados ou refrigerados devem ser mantidos entre 0 e 7 graus, conforme explica Paulo César Rutkowski, médico veterinário e servidor concursado da Vigilância Sanitária.
Segundo ele, um item que vem de fábrica congelado não pode ser vendido refrigerado, e vice-versa. Produtos que chegam ensacados ao supermercado, como salsichões e frangos, não podem ser fornecidos de modo fracionado, já que terão a validade modificada em relação ao que está especificado no rótulo.
A mesma exigência impede o fatiamento de produtos de fiambreria, tais como queijo e mortadela. As peças devem ser expostas inteiras e o fatiamento só pode ser feito a pedido do cliente, na hora. Mesma regra deve ser adotada em relação às frutas: o freguês deve estar presente no momento do corte.
A reembalagem – que ocorre quando o supermercado vende porções do produto em bandeiras envoltas por plástico – só pode ocorrer mediante registro que garanta a procedência e indique um responsável técnico. Também tem chamado a atenção que alguns supermercados de Santa Cruz colocaram ovos em refrigeradores. Não se trata de uma obrigatoriedade, a menos que o produto já venha refrigerado da indústria.
Rótulo
Paulo Rutkowski salienta que o consumidor deve ficar de olho nos rótulos. Ele ressalta que qualquer mercadoria deve ter a rotulagem completa, com as informações nutricionais, exigências para o armazenamento – como a temperatura ideal –, indicações de ingredientes que possam causar alergias ou não podem ser consumidos por intolerantes. “O cliente precisa ler o que está escrito e, caso não esteja claro, deve pedir auxílio a um funcionário do estabelecimento. É importante que cada um saiba ao menos o básico sobre os direitos do consumidor”, alerta.
Agas defende atualização da regra
A assessoria de imprensa da Associação Gaúcha dos Supermercados (Agas) se manifestou afirmando que a entidade sempre defendeu a segurança alimentar dos consumidores e concorda com a ação que apreendeu produtos de má qualidade em Santa Cruz. No entanto, a Agas entende que é necessária uma atualização das regras para que o varejo possa se adequar, já que, segundo a assessoria, as leis que regulam o comércio de carnes e frios têm mais de 60 anos.
A Agas, há quatro meses, formou um grupo de trabalho em parceria com governo do Estado e entidades de defesa do consumidor para atualizar a regulamentação e evitar divergências sobre a manipulação de produtos de origem animal. Agora, a associação aguarda a publicação de um decreto do Estado, que deve alterar as leis consideradas defasadas.
A Gazeta do Sul entrou em contato com o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios (Sindigêneros) dos Vales do Rio Pardo e Taquari, Celso Canísio Müller. Entretanto, a entidade prefere não se manifestar sobre esse assunto.
O CERNE DA LEI
A regra básica é que os supermercados mantenham as condições de fábrica do produto.
Dessa forma:
Os alimentos que vêm congelados de fábrica devem ser mantidos a, no máximo, 18 graus negativos nos pontos de venda. Não podem, portanto, ser comercializados em balcões de resfriamento, apenas em congeladores.
Pelo mesmo motivo, carnes, frios, frutas e outros produtos que vêm inteiros dos fornecedores não podem ser expostos fracionados, mesmo que em bandejas lacradas com plástico. O fracionamento deve ser feito na hora, diante do consumidor.
Consumidores elogiam a operação e as mudanças
O esforço dos supermercados em se adequar às exigências do Ministério Público não tem passado despercebido aos clientes. O recepcionista Paulo César Winder notou melhoras na qualidade da carne e na limpeza dos estabelecimentos. Ele se sente mais seguro para comprar, já que os produtos apreendidos na semana passada poderiam prejudicar a sua saúde e a da família. “É importante essa ação, porque a gente não enxerga o que está atrás das prateleiras”, observou.
O eletricista Gilvani da Silva Stein se tornou mais atento nos lugares que frequenta. Ele revela já ter feito compras em supermercados que apresentavam goteiras ou eram muito sujos. No entanto, para Stein, o principal problema são as mercadorias com prazo de validade vencido. “Eu olho bastante para verificar se não está estragado, mas tem gente que não percebe, tampouco volta ao mercado para fazer a troca”, apontou.
A dona de casa Camila de Lima revela que já trabalhou em supermercados onde produtos velhos, como frios, frutas e legumes, eram reembalados e reinseridos nas gôndolas. Para ela, a força-tarefa serviu para alertar os consumidores sobre a importância da atenção na hora de comprar. “Foi um susto bom para os clientes e para os mercados”, disse.
Camila: um susto
Promotoria não descarta realizar nova fiscalização
A fiscalização coordenada pelo Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) – Segurança Alimentar, do Ministério Público, vistoriou sete dos principais supermercados de Santa Cruz entre a quinta e a sexta-feira da semana passada. Segundo o promotor Érico Fernando Barin, da Promotoria de Justiça Especializada de Santa Cruz, outros estabelecimentos que não foram visitados durante a 35ª etapa da força-tarefa poderão ser alvos em futuras fiscalizações. Ele ressalta que a operação da semana passada teve o intuito de prevenir e orientar.
O MP aguarda os autos de infração para a abertura de inquéritos civis contra os sete mercados fiscalizados, que vão precisar corrigir a conduta e até pagar eventuais indenizações caso necessário. Barin salienta que alguns dos problemas verificados podem comprometer a saúde dos consumidores, como caixas de leite abertas por ação de roedores, carnes deterioradas e embutidos fora da temperatura considerada ideal.
“É nosso interesse que a população seja alertada. Que os cidadãos passem a se preocupar mais, que façam um controle maior do que será consumido. Os problemas constatados devem ser denunciados”, disse. A equipe ainda contou com representantes da Secretaria Estadual da Saúde, da Secretaria Estadual da Agricultura e da Vigilância Sanitária Municipal.