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Educação

Escola Mânica: um descaso sem fim

Em 2012, a Escola Estadual José Mânica, no Bairro Esmeralda, em Santa Cruz do Sul, tornou-se um exemplo emblemático das dificuldades enfrentadas pela educação pública quando o seu prédio principal, construído 35 anos antes e tomado por rachaduras, teve que ser interditado às pressas. O que não se esperava, à época, era que o drama se estenderia por tanto tempo: passados cinco anos, uma solução definitiva está longe e os estudantes seguem convivendo com o improviso e a precariedade.

Dos 560 alunos atualmente matriculados, 400 têm aula nas salas modulares inauguradas sete meses após a interdição. Embora todos estejam recebendo atendimento, a estrutura, concebida para ser provisória, já está com problemas. No início desta semana, uma turma do 3º ano do ensino fundamental viu a sala inundar durante a chuva devido às goteiras. A água que vertia em vários pontos se espalhou pelo chão e molhou apagadores, livros e cartazes. Os alunos tiveram que se amontoar em um canto da sala (que já é pequena) e o quadro negro não pôde mais ser usado. “Em 30 anos de magistério, eu nunca tinha visto algo assim”, relata a professora Márcia Schulz. A situação foi registrada em vídeo, que foi enviado para a 6ª Coordenadoria Regional de Educação (6ª CRE) e pode ser assistido no Portal Gaz.

No início do ano, a estrutura modular, que abriga dez salas, já teve que receber pintura e reparos para cobrir falhas nas paredes e no assoalho. A intervenção foi bancada com a verba de autonomia repassada pelo Estado, que se limita a R$ 3,6 mil por mês para conservação do patrimônio, pagamento da conta de telefone e compra de material pedagógico e de secretaria e limpeza. Para piorar, um dos antigos prédios, onde ainda hoje funciona a administração, biblioteca, informática, quatro salas de aula e banheiro, também está com rachaduras, infiltrações e problemas no piso.

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Diretora Daiane Lopes: além da insegurança, limitação de espaço também afeta a parte pedagógica
Foto: Bruno Pedry

“Não tem como inovar na educação assim”

Mais do que um problema de segurança, as limitações de infraestrutura interferem na parte pedagógica, segundo reconhece a própria diretora Daiane Lopes. Como as salas modulares só comportam 20 alunos cada, os professores mal conseguem se deslocar entre as classes. Além disso, algumas atividades especiais, como palestras, só se tornam possíveis em espaços fora da escola, que nem sempre estão disponíveis. Algumas atividades extraclasse, como aulas de xadrez, têm que ocorrer na parte externa – e, por isso, se tornam inviáveis em dias chuvosos.

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“Temos que negar coisas aos alunos porque não temos espaço. Não tem como inovar na educação assim”, lamenta a diretora. Apesar disso, o Mânica esteve entre as dez escolas com o melhor desempenho no Enem de 2015 em Santa Cruz – foi a quinta da rede pública e a nona no ranking geral. 

Para Elisângela Rodrigues da Silva, que além de trabalhar como servente na escola é mãe de dois alunos, a situação é motivo de preocupação. “Tenho um filho pequeno e fico pensando como vai ser. Essas salas modulares eu não acredito que vão durar mais de dois ou três anos”, diz.

Estudantes sentem na pele

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Aluna do Mânica desde pequena, Cintia Luisa Bauermann, que hoje está no 2º ano do ensino médio e faz parte do Grêmio Estudantil, emociona-se ao falar da situação da escola. “Estou aqui desde o 1º ano do ensino fundamental. É onde eu quero e vou me formar. Isso mexe com a gente”, diz. Cintia acompanhou de perto o drama do educandário e, para ela, a demolição do antigo prédio principal foi o momento mais difícil. “Nós estávamos ansiosos para ter aula ali porque era o prédio ‘dos grandes’. E aí, no ano em que fomos para lá, houve a interdição”, recorda.

Os problemas também levaram a uma debandada de alunos, que antes chegavam a mais de mil. “Muitos amigos saíram. E acabamos perdendo contato com eles. Meus pais também quiseram me trocar de escola, mas preferi ficar”, conta Julio César dos Santos Júnior, também do 2º ano. Apesar disso, os estudantes acreditam que vão sair da escola preparados. “Os professores são excelentes e se esforçam. Tem um professor que traz o datashow de casa. Quem quer aprender, aprende. Mas o problema é a falta de recurso”, completa Cintia.

Assim como eles, Alice Dias Cardoso Fagundes e Julia Gabriele da Silva, alunas do 9º ano, viveram o período em que, antes da inauguração das salas modulares e já com o prédio principal interditado, os estudantes assistiam a aulas provisoriamente em uma escola particular do Centro, para onde eram levados todos os dias de ônibus, junto com a merenda. Além da distância, muita coisa era na base do improviso. “A educação física era feita na praça. E perdíamos muito tempo com os deslocamentos”, lembra uma delas.

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Até agora, sequer há projeto

Apesar das renovadas promessas do Estado de que um novo e definitivo prédio para o Mânica seria prioridade, até agora sequer existe um projeto arquitetônico pronto, e muito menos previsão de recursos para a obra.

De acordo com o titular da 6ª CRE, Luiz Ricardo Pinho de Moura, o pedido está tramitando junto à Secretaria Estadual de Educação. Diferente da ideia inicial, levantada ainda durante a gestão anterior, que era substituir as salas modulares por um prédio de grande porte, agora o plano é manter a estrutura atual e construir algo menor. “Hoje a escola não tem mais o mesmo número de alunos, então não é mais. A ideia é acrescentar, e não retirar o que existe”, observou.

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Conforme Moura, o prédio que ainda está de pé já foi vistoriado por um engenheiro, que concluiu que os problemas não são estruturais. Segundo ele, os reparos terão que ser bancados com a verba de autonomia. Sobre os problemas nas salas modulares, Moura disse não ter conhecimento. “O emergencial já foi atendido, que era o refeitório (inaugurado em 2015)”, alegou.

A TRAJETÓRIA DO DRAMA

MAIO DE 2012
Com desníveis no chão e rachaduras espalhando-se pelas paredes, o espaço que abrigava a secretaria e a sala dos professores é interditado. Com isso, vários setores tiveram que ser realocados, afetando a rotina da escola. Parecer de um engenheiro da Prefeitura aponta que situação é de “grande risco”.

SETEMBRO DE 2012
Rachaduras continuam aumentando e prédio principal da escola, construído há 35 anos, acaba interditado após engenheiros do Estado determinarem a desocupação imediata. Mais da metade dos alunos fica sem aula por várias semanas até que passam a ser atendidos no Colégio Dom Alberto, no Centro.

JANEIRO DE 2013
Com parte dos alunos assistindo às aulas em salas improvisadas em uma casa alugada pelo Estado, prédio interditado começa a ser demolido. Antes do início da demolição, quando operários trabalhavam na remoção de janelas, o segundo pavimento – que era a ala mais nova – desaba. Ninguém fica ferido.

MAIO DE 2013
Sete meses após a interdição e com mais de cem alunos a menos matriculados no educandário, é inaugurada a estrutura modular com dez salas, erguida no pátio da escola. A promessa é de que a solução seria provisória, até a construção de um novo prédio, mas não há previsão de quando a obra vai começar.

JANEIRO DE 2015
Escola continua sofrendo com a falta de refeitório, cozinha e laboratório, a ponto de a merenda (que, devido à falta de fogão, se limita a frutas, sanduíches e bolachas) ter que ser servida no corredor e em escadarias. Comunidade escolar se mobiliza para pedir providências urgentes ao novo governo.

ABRIL DE 2015
Novo secretário estadual de Educação, Vieira da Cunha, faz visita à escola e promete que construção do novo prédio do Mânica será “prioridade” para o governo estadual. “Estamos mais do que sensíveis a essa reivindicação”, afirma. Na ocasião, representantes da comunidade escolar insistem na urgência do assunto.

DEZEMBRO DE 2015
Estado inaugura uma estrutura provisória, de contêineres, para servir de refeitório e cozinha. Na ocasião, o secretário-adjunto de Educação, Luís Alcoba de Freitas, afirma que, para viabilizar a construção do novo prédio, Mânica será incluído no programa Escola Melhor: Sociedade Melhor. Mas novamente não há prazo.

MAIO DE 2016
Passados quatro anos da interdição do prédio, escola continua funcionando com improvisos e limitações e ainda não há previsão para o prédio sair do papel. Novos problemas começam a aparecer, principalmente no antigo prédio que ainda está de pé, onde já se veem problemas de rachaduras e infiltrações.

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