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Rincão do Sobrado

João-de-barro inova e constrói ninho em meio a lavoura de tabaco

Foto: Giovane Weber

Rodrigo, Luana, Liane e José junto ao ninho que o pássaro fez diretamente no chão, em meio às plantas cultivadas na propriedade

Que o tabaco é, entre as culturas agrícolas, uma das que utilizam menor volume de princípio ativo de agrotóxicos ou defensivos agrícolas, isso pesquisas já revelaram e reforçaram ao longo dos anos. Ao mesmo tempo, não envolve a movimentação de muitas máquinas e implementos motorizados ou pesados. Mas pássaros e animais revelam um cenário ao que tudo indica ainda mais tranquilo para a natureza em meio às lavouras dessa planta. Foi o que pôde testemunhar o casal José Astor Kroth, 63 anos, e Liane Maria Schuh Kroth, 58, que há quase quatro décadas planta tabaco e produtos de subsistência em área de sete hectares na entrada de Rincão do Sobrado, a cerca de um quilômetro do perímetro urbano de Passo do Sobrado.

Foi seu José quem, há um mês, deparou com um joão-de-barro ocupadíssimo em construir seu ninho. No chão, sobre o camalhão formado para dispor as mudas de tabaco, e protegido entre duas plantas, sob as folhas. Surpreso com a descoberta, por saber que essas aves costumam fazer ninhos em locais elevados e protegidos de predadores, José chamou a esposa para mostrar a casa em construção. “E o joão-de-barro até foi bem lento na obra”, comentou Liane, por telefone, em entrevista à Gazeta do Sul. “Levou bastante tempo para concluir o ninho. Mas ficou uma casa bem bonita.”

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Quem também se interessou por conferir a “inovação” do joão-de-barro foi o produtor rural Giovane Luiz Weber, colunista da Gazeta do Sul, na qual assina a coluna “Por Dentro da Safra”, nas edições das terças-feiras. No último final de semana, Weber foi até a propriedade dos Kroth e registrou a família ao lado da “residência” do joão-de-barro. José e Liane plantaram cerca de 60 mil pés, dos quais atualmente fazem o desponte, a retirada das flores, e ainda não começaram a colheita.

Nessa etapa, têm a ajuda da filha Luana Jamille, 21 anos, estudante de Enfermagem na Unisc, e que estagia em posto de saúde em Passo do Sobrado, e do namorado dela, Rodrigo Guilherme Lersch, 25, que trabalha em empresa fumageira. Ao final do expediente, nos dias mais longos da primavera e do verão, Luana e Rodrigo ajudam nas tarefas na propriedade. Josiane, a outra filha de José e Liane e que também cursou Enfermagem, reside em outra localidade, e já lhes deu a netinha Luiza.

Liane comenta que nunca haviam encontrado um ninho de joão-de-barro no chão. No entanto, reforça que nesta época muitos pássaros da espécie podem ser vistos na redondeza. “Vários já têm ou estão construindo ninhos em locais aqui perto de casa”, comenta. Agora, os Kroth vão se esmerar em cuidados para não incomodar ou não comprometer o ninho feito em plena lavoura de tabaco, mesmo que ainda esteja pela frente toda a etapa da colheita das folhas.

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“É atípico, mas ele deve ter achado que é seguro”, diz biólogo

Um joão-de-barro fazer seu ninho no chão, no meio de uma lavoura, é realmente muito atípico, assegura o biólogo e professor Andreas Köhler, da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). Informado do fato, e consultado acerca das possíveis motivações para tal procedimento, diz que isso não chega a sinalizar para mudança de comportamento mais ampla dessa espécie. “Quando só um ou outro agem assim, não se pode falar em padrão ou em motivações de cunho ambiental”, frisa. “É algo muito pontual e localizado.”

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Köhler ressalta que a probabilidade de o casal de pássaros ser bem-sucedido em seu intento de fazer o ninho no chão e criar os filhotes é muito pequena. Lembra que o joão-de-barro constrói sua casa mais alto, sobre postes, galhos de árvores ou outras construções, justamente para ficar mais longe de predadores, que são muitos. “No chão, o ninho fica muito exposto a serpentes, gatos e tantos outros inimigos ou ameaças”, cita. Não só porque a casa fica de fácil acesso, mas pelo longo período de exposição ao perigo. A fêmea precisa ficar por cerca de três semanas chocando os ovos, e depois outros 20 dias são necessários até que os filhotes, frágeis e indefesos, consigam voar e se proteger sozinhos. “Ou seja, por quase dois meses o ninho estará muito exposto a todo tipo de predador”, observa.

Köhler: risco de diversos predadores

Porém, o biólogo também comenta que o pássaro, sem as reflexões e os raciocínios sobre prós e contras que os humanos tendem a fazer, seguiu o instinto e, por alguma razão, concluiu que o local era seguro e protegido. “Talvez pela temperatura, por estar sob folhas, menos suscetível a chuva ou vento, ou até pela praticidade e comodidade de ter a terra próximo, à disposição, sem precisar se deslocar por longa distância, ele optou por construir sua casa ali.” Köhler ressalta que é algo incomum até pelo fato de a espécie ter como tendência reaproveitar o mesmo ninho no ano seguinte.

“Mas, veja bem, o pássaro não sabe de nada disso, não pensa a respeito. Ele intuiu que ali era bom e seguro. E, depois, também entre os pássaros acontece como entre os humanos. Por vezes, algum inventa algo muito fora do padrão. Esse arriscou fazer a casa no chão”, brinca. “De fato, disso não se pode tirar qualquer conclusão mais ampla, ou querer imaginar mudança de comportamento ou padrão. Que é atípico e incomum, isso é”, salienta. “Algo ali agradou a ele. Agora, será tarefa árdua manter os predadores afastados do ninho por tanto tempo.”

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