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MEIO AMBIENTE

Município cassa licença da RGE para corte de árvores

Foto: Alencar da Rosa

Bailinho da Borges ocorre neste sábado, 11

O corte de quatro jacarandás históricos, posicionados na Rua Borges de Medeiros, no Centro de Santa Cruz do Sul, às vésperas do Natal, serviu para multiplicar os protestos contra a supressão de árvores no município. As plantas, que ajudam a contar a história de Santa Cruz, na região mais boêmia do Centro, vieram ao chão em uma ação justificada pela necessidade de preservar a fiação de energia elétrica. Rede de energia que provavelmente foi instalada bem depois do plantio daqueles jacarandás. A retirada deles provocou a indignação da população, e esta revolta ecoou no Palacinho. Da Prefeitura, o prefeito Telmo Kirst (PSD) ordenou que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Saneamento e Sustentabilidade rompesse o acordo firmado com a distribuidora. Desde setembro de 2018, a RGE possuía uma licença prévia para substituir cerca de 140 árvores, ao longo de cinco anos. Por não ter respeitado o prazo e nem municiado a Prefeitura com informações sobre a atividade, agora a RGE está proibida de cortar um galho sem que antes explique os atos praticados nos últimos dois meses.

A derrubada que revoltou Santa Cruz

O corre-corre para as compras no sábado que antecedeu o Natal no Centro de Santa Cruz foi interrompido pelo som das motosserras. O corte de quatro jacarandás na Rua Borges de Medeiros, na quadra entre a Marechal Floriano e a Marechal Deodoro, irritou a comunidade naquele instante de vésperas das festas de final de ano.

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As árvores situavam-se junto ao prédio que abriga a Livraria e Cafeteria Iluminura e ajudavam a compor o retrato de uma floresta urbana, que agora ficou desfalcada. A esquina, tida como uma das mais charmosas de Santa Cruz, reúne parte da vida noturna, com bares, cafés e choperias do município, e hoje tem quatro canteiros vazios.

O corte irritou também o chefe do Executivo. Assim que soube da derrubada, o prefeito Telmo Kirst (PSD) solicitou que a RGE deixasse o local. “Nem mesmo a retirada da raiz e a reforma dos canteiros foi permitida. O prefeito quer que nosso pessoal faça este manejo agora”, explica o secretário municipal de Meio Ambiente, Saneamento e Sustentabilidade, Raul Fritsch.

Fritsch espera a manitestação da RGE


A partir da retirada daquelas quatro árvores, a licença de autorização para a supressão de 140 plantas que estão no caminho da rede elétrica acabou sendo retirada. “Não está autorizado mais nenhum corte. Primeiro eles terão de comparecer na secretaria para apresentar uma série de documentos”, frisa o secretário. Conforme Fritsch, o maior erro da RGE foi não respeitar o cronograma de supressão das árvores.

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O titular do Meio Ambiente revela que em agosto de 2018 a distribuidora procurou a Prefeitura para apresentar o projeto “Arborização + Segura”. Nele, a RGE tinha se comprometido em cumprir um cronograma de cinco anos para supressão e replantio de árvores nos pontos em que os espécimes com problema comprovado fossem removidos. “Eles decidiram fazer tudo de uma vez, e ainda sem sinalizar com clareza o que está ocorrendo”, complementa.

O corte decorreu de uma autorização estadual, por parte da Divisão de Energia da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), de Porto Alegre. No entanto, entre as queixas do município está a falta de diálogo da distribuidora, que não presta informações atualizadas sobre o serviço, além de ela ter realizado boa parte da supressão das árvores de uma vez.

Os cortes iniciaram-se em novembro de 2018 e envolvem as árvores que foram condenadas. Na Rua Júlio de Castilhos, no trecho que fica entre as ruas Tenente Coronel Brito e Marechal Floriano, nove exemplares já foram removidos e outros dois estão sinalizados para corte. O espaço, que possuía amplas áreas de sombra, hoje apresenta mudas de árvores pequenas, as quais substituíram as adultas que foram derrubadas.

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De acordo com a bióloga Daiane Geiger, da Divisão de Licenciamento Ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Saneamento e Sustentabilidade, a troca da árvore condenada por um muda nova deve seguir regras internacionais. “Elas precisam ter no mínimo 1,8 metro de altura, no ponto onde começam os primeiros galhos, ou, no total, 2,2 metros”, frisa. As nove mudas plantadas na Júlio de Castilhos estão abaixo deste padrão. “Esta é outra situação que necessita de explicações por parte da empresa”, cobra o secretário Raul Fritsch.

A Secretaria espera, ainda para o mês de janeiro, uma manifestação formal da RGE, para que, de posse de informações como espécie utilizada, características da planta e atenção ao cronograma, o programa possa ser retomado. “Até que isso ocorra, nenhuma árvore poderá ser cortada pela RGE”, reforça Fritsch.

Jacarandás já estavam condenados

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A bióloga Daiane Geiger revisou a licença estadual da RGE para o corte de árvores. Conforme ela, o plano inicial da distribuidora era retirar 350 plantas. “Nós verificamos uma a uma e baixamos para o corte de 140 unidades”, diz.

Entre elas, os quatro jacarandás da Rua Borges de Medeiros. “Todos tinham problemas, com a presença de parasitas, tronco com podridão e estruturas condenadas”, explica. As árvores cresceram na direção contrária da rede elétrica; por isso, pendiam para o centro da rua, imprimindo risco para pedestres e veículos estacionados naquela área.

De acordo com Daiane, naquele espaço da Borges, entre as ruas Marechal Floriano e Marechal Deodoro, não há mais nenhuma indicação de corte. Assim como no Túnel Verde, da Marechal Floriano. “No Túnel Verde eles não podem fazer nada sem a presença da fiscalização da Prefeitura. Para mexer nas tipuanas tem de ser nossa equipe”, destaca o secretário Raul Fritsch. Neste domingo, equipes do Meio Ambiente e dos Transportes, Serviços e Mobilidade Urbana farão podas preventivas no Túnel Verde. A ação faz parte da força-tarefa criada em 2018 para cuidar das tipuanas e da segurança de pedestres no espaço.

Empresa coleciona problemas em todo o Estado

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Eduardo Santana é engenheiro químico do Balcão Ambiental Unificado, órgão que representa a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) e a própria Fepam para os vales do Rio Pardo e Taquari. De acordo com ele, a RGE coleciona reclamações em todo o Estado por conta das autorizações de corte de árvores para preservação da rede elétrica.

“Além de Santa Cruz, cidades próximas, como Rio Pardo e Candelária, têm registros semelhantes para cortes de árvores que geraram problemas”, conta. Conforme Santana, a licença emitida pela Fepam Estadual permite que a RGE faça o corte das árvores sim; porém, condiciona ao município a permissão, a fiscalização e até uma eventual punição à empresa, quando detectada alguma irregularidade.

Santana explica que a carência de servidores do Estado para a fiscalização acentua o problema. No balcão localizado em Santa Cruz, a equipe, que é reduzida, responde ainda por 65 municípios, em duas regiões. “Qualquer pessoa pode denunciar cortes, quando considerar que a retirada das árvores é irregular. O primeiro passo é avisar a Prefeitura, assim como o Balcão Ambiental Unificado”, reforça Santana.

O que diz a RGE

Por meio de sua assessoria de imprensa, a RGE informou à Gazeta do Sul que todos os vegetais elencados para supressão, removidos pelas equipes da empresa, estavam sob a rede elétrica. Consequentemente, algumas partes das árvores ficavam dentro da área de risco e de domínio da rede, no raio de um metro da baixa tensão e no raio de dois metros para média tensão.
O comunicado destaca ainda que a maioria das árvores suprimidas é de espécies exóticas, que são invasoras e devem ser erradicadas dos ambientes urbanos e rurais devido a sua capacidade de prejudicar o ecossistema. A RGE destaca que esta resolução está na Portaria n° 79, de 2013, editada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente.

No caso da retirada dos quatro jacarandás da Borges de Medeiros, a RGE frisa que segue as legislações federal, estadual e municipais para a realização de qualquer interferência na arborização, seja para podas ou supressões de árvores. Segundo a empresa, em várias cidades da área de concessão, entre elas Santa Cruz do Sul, a RGE desenvolve, em parceria com o município, o programa Arborização + Segura. Nele, o objetivo é promover maior segurança à população por meio do plantio de espécies arbóreas que convivam de forma mais harmônica com o contexto urbano e suas estruturas, como redes de água, esgoto, telefonia, elétrica, calçamentos e iluminação pública. Todas as ações do programa, segundo a empresa, ocorrem em regime de cooperação com as prefeituras, que emitem as devidas autorizações.

Sobre o plantios de compensação, a RGE explica que existe um cronograma, instituído pelo programa Arborização + Segura. A distribuidora revela que plantará 129 novas árvores, entre abril e agosto de 2020, em Santa Cruz do Sul. As mudas que serão utilizadas têm dois metros de altura, com quantidade de substrato e hidrogel suficiente para o bom desenvolvimento da planta, bem como também a implementação de tutores e grades para estabilidade e segurança da nova planta.

Corte preza pela rede elétrica

Conforme o engenheiro florestal Juarez Pedroso, da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), normalmente as empresas distribuidoras de energia apenas observam a segurança da rede, ignorando as funções estéticas e de conforto térmico que são oferecidas pelas árvores. “Basicamente, fazem isso como forma de remediar o uso inadequado de determinadas espécies e a ausência do manejo adequado ao logo da vida das árvores”, pontua.

Pedroso lembra que o município de Santa Cruz do Sul tem um plano diretor de arborização, e, por conta disso, o que determina este conjunto de regras precisa ser seguido. Destaca ainda que a figura do engenheiro florestal é fundamental para evitar este tipo de problema. Receitas caseiras e modismos, no que se refere à arborização, são situações que atrapalham o trabalho de reposição de árvores. “Um ponto-chave é a escolha da espécie adequada para o futuro local de transplante, quando ele é necessário. Isso requer um profundo conhecimento das plantas”, frisa.

O engenheiro pondera que as árvores selecionadas para corte, até aqui, condizem com a real necessidade. A RGE espalhou comunicados, fixados nas árvores que serão removidas, e Pedroso concorda com a seleção de plantas feitas pela empresa. Porém, segundo ele, tão importante quanto fazer a remoção é realizar a reposição de forma rápida. “A cidade não pode ficar carente, não pode sentir falta da sua arborização. Para isso, é necessário planejamento, responsabilidade, atenção e sensibilidade”, adverte o engenheiro florestal da Afubra.

MINISTÉRIO PÚBLICO

A reportagem contatou o Ministério Público (MP) de Santa Cruz do Sul. Em regime de plantão, com atendimento focado em procedimentos de emergência, o órgão confirmou que ainda não existe nenhum expediente para acompanhamento do corte de árvores feito pela RGE no município.
No entanto, a repercussão do caso e a própria confirmação de irregularidade, apontada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Saneamento e Sustentabilidade, ao barrar a licença de corte, poderão motivar uma investigação por parte da Promotoria de Defesa Comunitária do MP.

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