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A guerra que esquecemos de ver

Há guerras que não se declaram, apenas se insinuam nas esquinas. No Brasil, a violência deixou de ser ruptura e há tempos é rotina. Tiroteios, assaltos, mortes: tudo passa pelo noticiário como se fosse previsão do tempo. Quando o espanto se dissolve na repetição, a barbárie muda de nome e passa a se chamar normalidade.

A chacina que aconteceu no Rio de Janeiro no final do último mês de outubro foi a explosão de uma bomba-relógio. A quantidade de mortos é vergonhosa e toda a vida perdida em abordagens policiais é uma derrota para a cidadania.

Todas as vidas têm o mesmo valor. Não podemos perder isso de vista, mesmo com a crescente voracidade do sistema penal por sua presa favorita: jovens pretos e pobres.

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O país convive com índices de homicídio que rivalizam zonas de conflito armado. Ainda assim, fala-se mais em segurança pública do que em dignidade social. A guerra brasileira não é movida por ideologia, mas por ausências: ausência de Estado, de perspectiva, de compaixão. O território da violência é o mesmo onde o Estado só chega armado.

A desigualdade cria um campo de batalha invisível. Nas periferias, jovens disputam espaço, futuro e sobrevivência. Nas classes médias, a mesma violência se traduz em medo, muros e câmeras. O conflito muda de forma, mas não de essência: é sempre a negação da convivência. E quem mais sofre é quem menos aparece.

A banalização do horror corrói o senso de comunidade, como ensina Hannah Arendt. As redes sociais amplificam o medo, enquanto o debate público se resume a slogans: “bandido bom é bandido morto” ou “direitos humanos demais”.

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Nenhum desses extremos toca o essencial – a violência é sintoma, não causa. Ela nasce de estruturas que produzem exclusão e depois a punem pelo simples fato de existirem grupos de pessoas que são identificados como inimigos.

O problema não é apenas policial; é civilizatório. Um país que naturaliza a morte cotidiana perde a capacidade de se indignar. A segurança vira mercadoria e o medo, moeda política.

Governos se elegem prometendo mais repressão, como se o gatilho sanasse o abismo social entre a classe que concentra grande parte da renda e a massa desfavorecida em vários aspectos, mas principalmente no socioeconômico.

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Há uma guerra que o Brasil trava sem perceber: a guerra contra si mesmo. Ela não tem fronteiras nem trincheiras, mas ceifa vidas e silencia consciências. A violência urbana não é apenas um drama das ruas – é o espelho de uma nação que ainda não aprendeu a reconhecer “o outro” como parte de si.

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Lavignea Witt

Me chamo Lavignea Witt, tenho 25 anos e sou natural de Santiago, mas moro atualmente em Santa Cruz do Sul. Sou jornalista formada pela Universidade Franciscana (UFN), pós-graduada em Jornalismo Digital e repórter multimídia na Gazeta Grupo de Comunicações.

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Lavignea Witt

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