Gostaria de começar o novo ano escrevendo num tom de otimismo, mas os primeiros dias de 2017 ainda não ajudaram. A violência extrema e irracional que explode com frequência no Brasil desafia as explicações lógicas, a sensatez, os argumentos. Mais do que isso: quando parte significativa da opinião pública apoia – sim, apoia – crimes hediondos como a chacina de Campinas, o que se constata é um franco retrocesso civilizatório.
Todos sabem o que houve. Nos primeiros minutos de 2017, em meio à queima de fogos, Sidnei Ramis de Araújo, 46 anos, pulou o muro de uma casa em Campinas e matou a tiros 12 pessoas, dentre elas a ex-mulher e o filho João Victor, de 8 anos. O motivo do massacre seria a separação do casal e uma briga judicial pela guarda do filho, que estava sob custódia da mãe. O assassino, um técnico em laboratório, suicidou-se em seguida.
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Quantas vezes já não li coisas semelhantes, em comentários de sites jornalísticos ou redes sociais? Sidnei era, provavelmente, um psicopata. Tinha contra si cinco queixas de ameaças e violência doméstica, uma acusação de abuso sexual, a Justiça decidiu que não poderia conviver com o filho. Nada disso impediu que “justiceiros da internet” se solidarizassem com o matador: “Essa mulher deve ter feito coisas que deixou (sic) esse cara tomado de ódio”; “Isso só aconteceu pq ela plantou”; “Daqui para frente, as aproveitadoras vão pensar com pânico antes de brincar com os sentimentos dos homens de bem”; “Eu entendo esse cara, atitude nobre!”; “O culpado é quem inventou esta lei de pensão”; “Ele foi muito macho para levar a cabo tal atitude”; “Sempre esse mimimi de feminicídio”; “Certamente a mãe era feminista”… e por aí vai.
Metade das manifestações sobre o assunto tinha esse teor. Aplausos ao pai injustiçado que matou o filho com um tiro na cabeça, de tanto amor. Empatia zero por 12 mortos, simpatia comovente pelo assassino. Há mais gente doente nas ruas do que eu pensava.
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