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“Acredito que ele deu a vida dele por mim”, relata filha de empresário morto em assalto

Kethlin Meurer, de 20 anos, estava sozinha em casa, em Linha Nova, no interior de Santa Cruz do Sul, quando o pai foi rendido por criminosos do lado de fora da residência na noite da última quarta-feira. Os bandidos se aproximaram gritando “perdeu, perdeu, perdeu”. Ao perceber o assalto, a jovem ainda tentou pedir socorro por telefone, quando ouviu o estampido do lado de fora. 

Gerson Arthur Meurer, de 51 anos, foi baleado e não resistiu. Há dez anos, o empresário tinha um posto de combustíveis em Linha Nova. O sonho de ter o estabelecimento fez com que ele mesmo auxiliasse na construção. “Meu pai era o cara. Foi de tudo um pouco nessa vida, engenheiro, arquiteto, foi pai, foi amigo, foi líder, foi torneiro mecânico, empresário…”, resumiu a jovem, que nesta sexta-feira, 15, concedeu entrevista à Gazeta do Sul. Dois suspeitos de envolvimento no latrocínio (roubo com morte) foram presos pela polícia na noite de quinta-feira. 

Gazeta – O posto de vocês já havia sido alvo de assaltantes. Depois disso, vocês tinham medo que isso voltasse a acontecer? Teu pai se preocupava com isso?

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Kethlin Meurer – Tínhamos muito medo que assaltos voltassem a ocorrer. Ainda neste ano, há cerca de três meses, dois caras vieram com uma moto aqui no posto e ainda de cara limpa. Um ficou em cima da moto e outro entrou na conveniência para comprar cigarro. Meu pai, como fazia com todas as pessoas, atendeu super bem e ainda fez uma brincadeira, até porque ele sempre foi brincalhão. Então foi neste momento que o cara sacou a arma e anunciou o assalto. O pai alcançou o dinheiro do caixa e o cara roubou, também, três celulares. Graças a Deus, não tirou a vida de ninguém. Na semana passada, roubaram todos os gases de cozinha nos fundos do posto. Arrombaram a casa velha ao lado do posto que também é nossa. Não tínhamos absolutamente nada de valor lá e não foi a primeira vez que arrombaram. Nos últimos dias, todos estávamos preocupados. Muito mesmo. O pai me disse no sábado passado: “Bah filha, o cara começa a ficar cada vez mais preocupado com tudo isso. Temos que ficar de olho e pedir muita proteção”. Com o assalto há três meses, meu pai reforçou as câmeras de segurança no posto. Foram instaladas mais câmeras. Nesta segunda, de noite, ainda comentei com a mãe sobre o medo que dá toda essa violência e criminalidade.

Gazeta – Você foi a primeira a ter contato com ele depois do roubo?

Kethlin – Escutei do quarto o barulho do tiro. Ouvi que os ladrões tinham ido embora. Pensei que tinham levado o pai junto, porque não vi mais ele. Mas logo me dei conta de que ele estava deitado no chão, no escuro. Disse para ele se acalmar. Que eu iria buscar ajuda. Que tudo iria ficar bem. Perguntei onde tinham dado o tiro e ele respondeu “na barriga”. Saí correndo até a casa da minha tia. Quando voltei da casa da minha tia que é do ladinho do posto, vi que o pai tinha conseguido caminhar sozinho um pedaço. Encontrei ele no chão. Ele só gemia. Veio meu tio e logo minha mãe, que levaram o pai para o hospital. Eu estava sozinha em casa. 

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A filha de Gerson já sentia medo pela insegurança por que a família
passava devido a outros assaltos que ocorreram no estabelecimento

Gazeta – Pelas imagens vocês acreditam que ele tentou reagir?

Kethlin – Meu pai era um herói sem capa. No assalto ele não reagiu, mas tentou impedir que os ladrões subissem, porque sabia que eu estava em casa. Acredito que ele deu a vida dele por mim. Meu pai era um ser humano incrível. Sempre ajeitava as situações para que tudo pudesse ocorrer bem. Era um cara inovador, extremamente inteligente. Me ensinou valores. Foi um pai de verdade que fazia tudo, absolutamente tudo por mim. Sabe, o que me conforta é que sempre demonstrei muito o amor que sentia e sinto por ele. Não tinha um dia que eu não dizia te amo. Não tinha um dia que eu não dava um beijo e um abraço de boa noite e bom dia.

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Gazeta – Ter suspeitos presos traz alguma forma de conforto?

Kethlin – Existem algumas coisas em nossas vidas que não entendemos por que ocorrem. Hoje, sei que não posso mais ter ele de volta. Não tenho uma varinha mágica. Tudo dói muito. Ver meu pai deitado no chão gemendo de dor, dói. Ver esses vagabundos chegando e eu não poder fazer nada, dói. Ver que seres humanos de bem têm a vida tirada por gente drogada e de mau caráter, dói. Meu pai foi uma das milhares e milhares de pessoas que sofrem com a violência e criminalidade. Que tirassem nossos bens materiais, mas não a vida! Tudo dói, dói muito. Perder um pai maravilhoso, incrível, espetacular não é fácil. Sempre fui muito sonhadora e queria que ele visse tanta coisa ainda. Ele, com certeza, queria viver mais. A morte faz parte do ciclo da vida. Mas esse tipo de morte é difícil de aceitar. Nunca pensei que iria acontecer conosco. Nunca. Eu só digo o seguinte, se temos pais, temos que valorizá-los, amá-los. A vida é curta, as pessoas não são eternas e hoje eu faria de tudo para ter meu pai de volta.

Gazeta – Como vocês acreditam que será a vida daqui pra frente?

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Kethlin – Muita coisa será diferente. Mas a vida segue. Eu tenho sonhos, tenho planos e quero dar muito orgulho para a minha família. Temos que encontrar forças e seguir em frente. Não estamos sozinhos e não adianta acharmos que a vida não tem sentido, porque não é isso que o pai quer para nós.

LEIA MAIS NA EDIÇÃO DIGITAL DA GAZETA DO SUL
DESTE FIM DE SEMANA

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