Quando se completaram 35 horas sem luz lá em casa, o pânico começou a se instalar. A pressão arterial se alterou, as mãos passaram a tremer. Como não se obtinha, via 0800, alguma previsão de retorno do serviço, peguei o carro e rodei a esmo pela cidade em busca de alguma equipe da RGE que pudesse, ao menos, ouvir meu desabafo. Sintomas clássicos da síndrome de abstinência de energia elétrica.
A eletricidade caiu logo no início do temporal de terça-feira passada e, na manhã de quinta, nossa rua continuava sem luz. Nem deveria me lamuriar, afinal, nossa casa escapou incólume à tormenta, enquanto centenas de moradores da região sofreram prejuízos imensos. Porém, para uma família contemporânea de seis pessoas, dentre as quais um cronista viciado em escrever, ficar sem energia elétrica é uma tortura. Os celulares e tablets, recarregados na casa de parentes, logo ficavam sem carga, não havia como ligar a smart TV e as crianças, sem as habituais distrações, passaram a ter atitudes estranhas, a cobrar atenção.
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– Pai, mãe. Não lembro do tempo em que eu era um macaquinho… Eu tinha rabinho? Subia em árvores? Quando foi que virei criança humana? Ou a gente só é macaco na barriga da mamãe?
Para mim o pior foi ficar sem computador para escrever, para produzir. Cada minuto que passava sem produzir, sem preparar aulas, escrever crônicas ou artigos para o doutorado, parecia uma vida inteira desperdiçada. Mas a solução, enfim, foi me render a essa parada forçada, sentar, conversar mais com o pessoal de casa, ensinar as crianças e aprender com elas. E refletir. Refletir, inclusive, sobre o quanto nossa ansiedade em produzir, atributo dos dias de hoje, nos impede de fazer pausas eventuais para… refletir.
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