Tabaco

Entrevista: “A tendência é de aumento da área plantada”, diz presidente da Afubra sobre o tabaco

O catarinense Marcilio Laurindo Drescher, de 73 anos, comanda uma das mais importantes e longevas representações do agronegócio brasileiro, a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), que em 21 de março de 2025 completou 70 anos de atuação. Voltada à defesa dos interesses dos produtores de tabaco, em sua maioria agricultores que administram pequenas propriedades de perfil familiar, a entidade, com sede em Santa Cruz do Sul, tem filiais espalhadas pelos três estados do Sul do Brasil. Ali se faz presente por meio de 31 lojas físicas de sua Agro-Comercial, e também com o seu Sistema Mutualista.

Drescher foi eleito em julho de 2023 para gestão de quatro anos, que se estende até 2027, tendo como vice Romeu Schneider. Ele integrava como suplente o Conselho Fiscal da Afubra desde 1995. Em 2003 passou a compor a diretoria como vice-presidente. E já assumira o cargo maior da Afubra em março de 2006, por ocasião do falecimento do então presidente Hainsi Gralow, ficando nessa condição até 2007, quando virou tesoureiro. 

Natural de Cunha Porã, no oeste catarinense, é oriundo do movimento sindical da agricultura familiar. Ao longo de décadas de envolvimento com as questões ligadas à produção de tabaco e à diversificação das propriedades que se dedicam a essa atividade, Drescher pôde dimensionar a importância dessas folhas para a agricultura familiar. 

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No ciclo 2024/25, o cultivo de tabaco envolveu 138.020 famílias no Sul do Brasil. Elas colheram 719.891 toneladas. No Sul, 509 municípios  produzem tabaco, 201 deles só no Rio Grande do Sul. O principal cultivo é o da variedade Virgínia, do qual se colhe as folhas, conforme amadureçam, e que são secadas em estufas, mas há ainda plantio de Burley, do qual se colhe a planta inteira, depois secada ao ar livre. Ainda que o tabaco ocupe pequena parcela da área, é ele que assegura a principal renda das propriedades.

A aptidão dos agricultores para a produção de folhas de qualidade é atestada pela aceitação destas no mercado internacional. Desde 1993, o Brasil é o maior exportador mundial de tabaco, posição mantida e fortalecida a cada nova safra, com clientelas em mais de uma centena de nações. E é também em defesa desse mercado que a Afubra atua, bem como por conquistas que ampliem cada vez mais a qualidade de vida dos produtores.

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Inquietação constante para a diretoria da Afubra, e para as demais entidades representativas do setor, tem vindo das campanhas antitabagistas e de ameaças como as que se elevam em cada edição da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco. A próxima edição, a 11a, desse evento da Organização Mundial da Saúde (OMS) está programada para os dias 17 a 22 de novembro, em Genebra, na Suíça.

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Na segunda reportagem da série “O tabaco na mesa”, iniciada com o presidente da Associação Internacional dos Produtores de Tabaco (ITGA), José Javier Aranda, Drescher salienta que uma vez mais a entidade acompanhará de perto os debates entre as delegações dos países signatários da Convenção-Quadro, na Suíça, como em edições anteriores. Mas reconhece que os produtores ou os demais representantes do setor tendem a novamente ser alijados de qualquer participação efetiva, o que lastima.

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Se de parte dos governos ou das organizações não governamentais (ONGs) o segmento só colhe receio, no campo ao menos as perspectivas são boas. A área plantada deve ter incremento no Brasil na safra 2025/26, o que até gera alguma apreensão na entidade, pois um excesso de oferta pode pressionar para baixo o preço médio, como Drescher aponta na entrevista.

ENTREVISTA

Gazeta do Sul – Como está a expectativa da Afubra em relação à COP-11? Com que sentimento a entidade avalia essa nova edição?

Marcilio Drescher – Já temos a certeza de que pouco mudará na forma do sistema da participação da representação dos produtores ou da cadeia produtiva, como já aconteceu em todas as edições anteriores. O nosso sentimento é de que nessa edição mais uma vez vão apresentar projetos ou ideias que virão restringir ainda mais na questão do consumo do cigarro, tentando, dessa forma, inibir o tabagismo. Mas estaremos atentos. A Afubra estará participando de perto esta edição, mesmo que acompanhando à distância.

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A Afubra então irá a Genebra, isso? Quem deve representar a entidade na ocasião?

Sim, a entidade se fará presente, como esteve presente em todas as edições anteriores, acompanhando, de certa forma, de perto o evento, o cotidiano, embora não tenhamos participação direta. Quem estará representando a nossa entidade serão o secretário Marco Antônio Dornelles e o vice-presidente Romeu Schneider.

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O senhor (ou representação da Afubra) já participou até o momento de atividades alusivas a esse encontro em Genebra? De que atividades se trataram e como está o sentimento dos produtores nessas tratativas?

Sim, tanto eu, pessoalmente, como os nossos representantes na COP estiveram participando de vários eventos de mobilização com relação à COP. Por exemplo, a audiência pública aqui no Rio Grande do Sul, mobilizada pela Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa, onde participei de vários eventos. 

Também a nossa representação que estará em Genebra participou de audiências em Brasília, com diversos ministérios que acataram a nossa agenda para propor um diálogo sobre encaminhamentos da COP-11.

Quais implementações resultantes da Convenção-Quadro, na avaliação do senhor, até o momento tiveram maior impacto ou interferência nesse setor?

Várias foram as medidas que resultaram em implementações que vieram a afetar nosso setor de uma forma indireta. Entre elas, a proibição de financiamento com dinheiro público para produtores de tabaco, com juros subsidiados, como os agricultores familiares deveriam ter; e também os impactos no consumo do tabaco, em recintos fechados, uma legislação que coíbe o consumo do cigarro, entre outros.

O senhor entende que está havendo abertura junto a organismos do governo federal, mais sensíveis acerca das demandas dos produtores de tabaco? Em que ambiente essa abertura está sendo maior e melhor? E onde ela não existe?

Entendo que há um diálogo melhor entre certos setores do governo, que ouvem a representação dos produtores ou da cadeia produtiva, mas, de maneira geral, a gente percebe que não há muito entusiasmo ou muita proposição em acatar nossas sugestões, mesmo a de participação dessa representação na COP. E outras sugestões estão sendo recebidas de maneira muito fria, sem mostrar perspectivas de um resultado efetivo que pretendemos. Não há essa abertura no Ministério da Saúde e na própria Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro (Conicq), onde nossa voz é restringida e não temos participação efetiva nos debates, nas discussões ou em qualquer encaminhamento que nos faça participar democraticamente.

No que o senhor entende que a cadeia produtiva acerta e no que ainda peca em termos de sua própria defesa e na luta por seus interesses?

Entende-se que a cadeia produtiva conseguiu, de certa forma, mas timidamente, alguma evolução no apoio por parte de políticos e de alguns setores dos governos estaduais para a defesa da cultura do tabaco. Mesmo também em relação à COP, houve uma união maior, uma participação maior, até o presente momento, nesta edição. Mas, de certa forma, tudo ainda é muito tímido para conseguir força suficiente e mudar a situação em que nos encontramos.

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A partir de seu envolvimento com a cultura, como o senhor conceituaria ou como hoje vê o tabaco enquanto atividade econômica no Brasil? Até mesmo em relação a outras alternativas de cultivo…

O tabaco hoje está muito em evidência, pela sua boa rentabilidade e pela importância para a sustentação dos pequenos produtores familiares, principalmente quando outras culturas não têm uma valorização ou uma estabilidade de preço certo. Portanto, é preponderante a continuidade do plantio do tabaco em muitas propriedades. Se assim não for, as mesmas certamente irão sucumbir na sua atividade.

Quais o senhor entende que sejam os grandes méritos do tabaco na atualidade em realidade de pequena propriedade no Sul do Brasil?

Os méritos da atividade do tabaco nos últimos anos foram uma remuneração acima das médias históricas, pelo bom preço que o produtor vinha recebendo. E, dessa forma, fez com que os produtores se consolidassem nessas garantias do negócio. É realmente de grande mérito a presença do tabaco nas pequenas propriedades.

Como o Brasil se encontra em termos de clareza da importância interna do tabaco (e de sua defesa) em relação a outras nações produtoras? Como isso se evidencia em âmbito de ITGA?

No Brasil é clara a importância, mas ela não é reconhecida oficialmente. Não é feito nada por parte do governo, que inclusive ganha muitos impostos em cima desse setor, mas, em contrapartida, não faz nada para a defesa da produção do tabaco. Ao contrário de países africanos, que têm apoio, incentivo, e todas as garantias dadas pelos seus governos ao setor e aos produtores.

O senhor ainda teme muito as campanhas antitabagistas, ou entende que elas talvez tenham chegado a um ápice do que poderiam provocar no setor?

Entendo que no Brasil as campanhas antitabagistas são muito fortes. Principalmente quem as conduz, quem efetivamente as faz, são as ONGs, e nem tanto o governo. Mas também temos a participação do Ministério da Saúde, que, em certos momentos, faz campanhas perversas, inclusive com alegações infundadas sobre a própria produção. Como o caso de plantar comida, alimentos, ao invés de tabaco, o que não procede, porque nós, produtores, produzimos muito alimento paralelamente ao tabaco. 

Ou seja, já estamos com quase a metade do rendimento, da nossa renda de produtores de tabaco, provinda de outras produções que não sejam o tabaco. Isso é muito importante; acreditamos que essas campanhas estão, sim, chegando a momento limite, e talvez não devam continuar tão fortes como foram até aqui.

No Brasil, discute-se também a regulamentação dos dispositivos eletrônicos para fumar, comumente chamados de cigarros eletrônicos. Qual a posição da Afubra em relação a esse tema?

Embora tenhamos muita cautela sobre essa questão, nós, da Afubra, temos a visão de que deve essa regulamentação deve acontecer. Que seja uma regulamentação que venha em defesa do nosso mercado de produção; ou seja, que contenha tabaco ou mesmo contenha nicotina que sejam procedentes do mercado brasileiro. 

Essa é a nossa posição. Caso contrário, nós não estaremos aprovando do jeito que ela deixa o mercado livre, ou que não tenha na composição desses DEFs produtos oriundos da nossa produção brasileira.

Como a Afubra avalia a temporada 2025/26 de tabaco no Sul do Brasil? Quais tendem a ser os principais fatos a ela relacionados, em termos de área, produção, produtividade, qualidade? Quais os indicadores prévios até o momento?

O tabaco no sul do Brasil, na safra 2025/26, tem tendência de aumentar a área de plantio, o que, de certa forma, é sempre muito preocupante para os produtores. Porque, tendo oferta em excesso, o preço médio pode vir a ser menor. Isso todo produtor já sabe historicamente, como o mercado age. 

Essa tendência de plantar mais e ter renda menor é nossa preocupação. Mas o que se apresenta no momento são dados ainda não concretos, porque há regiões ainda em fase de plantio. 

Estaremos avaliando logo mais a possibilidade de uma previsão de produtividade e qualidade, o que geralmente acontece em meados de novembro.

Como se explica que, apesar das campanhas antitabagistas, e de seus discursos e de suas ações, a produção de tabaco permaneça estável e inclusive em incremento na atualidade?

No momento, não têm tido um efeito tão impactante para a frente porque temos um mercado internacional que consome 90% de nossa produção, e nesses países o consumo tem permanecido muito estável nos últimos anos. Então, é uma questão que ainda se apresenta favorável para nós: as campanhas antitabagistas estão muito fortes no Brasil, mas nem tanto em outros países que consomem o nosso tabaco.

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Marcio Souza

Jornalista, formado pela Unisinos, com MBA em Marketing, Estratégia e Inovação, pela Uninter. Completo, em 31 de dezembro de 2023, 27 anos de comunicação em rádio, jornal, revista, internet, TV e assessoria de comunicação.

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