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GAZ – Notícias de Santa Cruz do Sul e Região

“Feliz” 20 de novembro

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Jonatan Pach é músico e produtor audiovisual

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*Escrito por Jonatan Pach a convite do Portal Gaz.

Este não é um artigo explicativo. Não vou falar dados. Não vou citar nomes. Não vou relatar fatos. E se tu veio aqui com a intenção de saber mais sobre mais um caso isolado, veio ao lugar errado. Aliás, quantos casos precisam acontecer para deixarem de ser isolados?

No dia 20 de novembro de 2020, eu dormi e acordei chorando. Quem sente a dor do pensamento constante de “poderia ser da minha família” está bem ciente do que a gente passa. Enquanto o 20 de novembro e casos de genocídio refrescam a memória dos brancos de que, de vez em quando e quando convém, nossas vidas importam, nós, negros, só queríamos conviver socialmente de uma forma digna, ter mais oportunidade de emprego, da mesma forma que pessoas brancas têm, poder colocar comida na mesa.

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Nunca me senti confortável em supermercados. Já ouvi de amigos brancos que já roubaram, mas não conta, porque foi em mercado e foram coisas pequenas como, por exemplo, uma barra de chocolate. A gente morre por muito menos. Inúmeras vezes paguei minhas compras no caixa e estava saindo sem as compras de tanta pressa e angústia que sinto nesse ambiente.

Como eu disse no início, esse não é um caso isolado. Vai continuar acontecendo. E as pessoas pretas vão sentir o baque sempre da mesma forma. Entretanto, eu gostaria de chamar a atenção para uma outra situação pessoal, e recorrente com pessoas negras de voz ativa: a gente não tem tempo de descansar, muito menos em novembro. Não estou falando de desgaste físico, nós, apesar de muitos brancos reforçarem o discurso de que negros são preguiçosos, não temos medo de trabalhar. Mas agora, falando especificamente com negros, para quantas atividades vocês foram chamados em novembro em que não te deram nenhum retorno além do desgaste emocional? Trabalhar sendo pago com desgaste? Isso soa familiar? E agora, falando especificamente com brancos, com quantos profissionais negros vocês entraram em contato nesse mês de novembro com a intenção de remunerá-los?

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No exato momento em que publicava em uma rede social que passaria o resto do dia afastado das timelines, recebi o convite para vir escrever aqui. E, como eu disse, para quem foi dormir e acordou chorando pelo mesmo motivo, fiquei com a sensação de não poder respirar, consequentemente o choro aumentou. Eu nem iria me pronunciar em redes sociais pois todo mundo sabe do meu posicionamento, e decidi respeitar esse momento, respeitar o meu momento de luto. Não foi possível.

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É importante nós, negros, vivermos bem, não é luxo. Até porque mesmo que a gente conquiste um ótimo cargo, vai ter branco dizendo que a gente não merece estar ali. Mesmo que a gente compre um bom carro, corre o risco de levar 80 tiros. Mesmo que a gente quite uma boa casa, ainda não estaríamos seguros. Mesmo que a gente alcance a independência financeira, com zero possibilidade de passar fome, podemos ser assassinados dentro do supermercado.

Eu estou cansado. Estamos cansados. Nos poupem. Então suplico: só pensem em nos chamar para gastar nossa energia quando a consciência sobre negros começar a fazer parte, de verdade, dos brancos.

*Jonatan Pach é músico e produtor audiovisual.

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