Por longos anos fui jurado da Comarca de Santa Cruz do Sul. Lembro de cada sessão de que participei, das mais simples às mais complexas. E em todas elas eu sentia calafrios: – quem sou eu para julgar essa pessoa? – me questionava quando me via frente a frente com juiz ou juíza, promotor, advogados e uma ou mais pessoas sentadas no banco dos réus.

Não devo particularizar, mas posso garantir: por mais difícil que seja julgar alguém, de sessão alguma saí desconfortável, muito menos arrependido. As decisões nos júris são técnicas, respondem a quesitos objetivos. Não se trata de dizer “eu acho isso ou aquilo”, “concordo, mas tem que considerar que…” nem “porque, afinal”, qualquer coisa que torne subjetivo o julgamento.

Aprendi muito. Vi promotor ora declinando da acusação por entender que faltavam provas para pedir a condenação, ora inclemente usando o seu tempo à exaustão para argumentar pela culpa do réu para, nos últimos cinco minutos, se dirigir ao corpo de jurados e propor as atenuantes.

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Vi advogados brilhantes, eloquentes, ardilosos que, embora não conseguissem reverter uma condenação previsível, para não dizer inevitável, abreviaram a pena do réu. E também vi – como não dizer? – defensor que caiu de para-quedas na sala do júri e teve que ser acudido pelo acusador para formular sua tese de defesa.

A cena foi emblemática: à nossa frente, no meio do recinto, estava sentado um senhorzinho de cabelos brancos, se bem lembro acusado de tentativa de homicídio. Estava de costas para nós, os jurados.

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Não recordo dos pormenores, mas nunca esqueci o olhar daquele pequeno e velho homem quando girou a cadeira e olhou para nós como a implorar misericórdia. Havia lágrimas escorrendo sobre uma ruga e outra do seu rosto. E uma expressão de dor, desolação, como se quisesse dizer: “Eu não sou um monstro. Façam alguma coisa por mim”.

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Respondidos os quesitos que foram propostos aos jurados, o juiz, providencialmente, lhe aplicou pena mínima. Saímos resignados, convencidos de que tomamos a decisão certa.

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Por que conto isso? Porque imaginei concluir este raciocínio sob outra perspectiva. Eu falaria que o zelo em se fazer justiça que testemunhei nas sessões do Tribunal do Júri nem sempre parece presente nos julgamentos em instâncias superiores como os holofotes midiáticos têm nos mostrado.

Mas, enquanto construía este texto, fiquei sabendo da barbárie que quatro marginais praticaram contra um casal no interior de Candelária, resultando na morte de uma senhora de 66 anos.

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Mérito de trabalho e competência, Brigada Militar e Polícia Civil prenderam os “anjinhos” de 22, 23, 31 e 33 anos que, conforme divulgado, foram atacar um casal em sua morada, agrediram e amarraram o proprietário e deixaram sua esposa morta no quarto ao lado.

Quanta maldade em mentes e trajetórias tão jovens! Não foram em busca de ajuda, nem de alimento ou coisa que justificasse sua invasão em uma propriedade particular. Eles foram decididos a roubar, agrediram o casal sem piedade até causar a morte de uma das vítimas em circunstâncias que ainda não são conhecidas. Por certo, algum dia sentarão à frente de um tribunal para serem julgados.

Diferente daquele senhorzinho de cabelos brancos que pedia clemência, talvez se apresentem encobertos por um capuz de vergonha. De arrependimento, quem sabe! A Justiça haverá de fazer a sua parte.

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Guilherme Andriolo

Nascido em 2005 em Santa Cruz do Sul, ingressou como estagiário no Portal Gaz logo no primeiro semestre de faculdade e desde então auxilia na produção de conteúdos multimídia.

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