O presidente do Conselho da Renner afirmou, no Estadão, que somos o país do futuro que não chega. Tenho demonstrado isso em palestras. Jogamos fora as oportunidades postas à nossa porta. Parecemos masoquistas, sofrer é o nosso prazer. Ganhamos, de graça, o que para os outros países é um sonho inalcançável: ausência de catástrofes naturais, de guerras com vizinhos; clima ideal: chuva e sol nas doses certas; água abundante, por cima e por baixo; minerais de toda sorte no subsolo; amplidão territorial, grandeza em rios e florestas; solo onde tudo dá. Talvez querendo nos punir por não termos conquistado o direito de ter tudo isso, tratamos de provocar para que dê errado, para que a natureza não cometa a injustiça de privilegiar-nos sem mérito. Nossas escolhas nas urnas contribuem para isso. Nossa passividade infla os fracassos.

LEIA TAMBÉM: Como vai acabar?

Meu colega Luiz Edgar de Andrade enganou-se, quando reportou que De Gaulle dissera que o Brasil não é um país sério. Mas se não tivesse sido um engano de informação, seria bene trovato. Para compensar – e anular – tudo o que ganhamos no Gênese, provocamos um apocalipse no território nacional. Nem Noé conseguiria salvar-nos nesse dilúvio de passividade – ou sem-vergonhice? Agora vivemos um regime de exceção e nossa indiferença é como se estivéssemos em pleno estado de direito. A comunicação digital deu voz a todos – e os totalitários reagiram porque a democracia que propagam é a deles; só eles podem ter voz, o povo não. Povo, para eles, só é uma anônima audiência.

Publicidade

LEIA TAMBÉM: Paraguai vencedor

Os tutores tradicionais do pensamento, incomodados, procuram calar a voz do povo. Afinal, está na Constituição que todo poder emana do povo. Os tutores esperam que o povo se acomode com o que está escrito. Assim, o poder popular se esgota no papel e não é exercido. Mas, mesmo quando tenta exercer, o povo tem sido enrolado. Por exemplo, os brasileiros elegeram seus representantes no Congresso. Mas quem manda é quem não tem voto. Os representantes no Congresso têm o poder nominal de fazer leis, mas nas verdadeiras liberdades democráticas, esse poder é apenas literal. Quem baixa regras, mesmo, é o topo do Judiciário. Derroga até aquilo que, cheios de esperança, considerávamos direitos e garantias fundamentais e pétreas, inquebrantáveis.

LEIA TAMBÉM: Calando o povo

Publicidade

E lá vamos nós, jogando nosso potencial no lixo, nosso futuro no passado, nossos filhos e netos num beco sem saída. Posso falar nisso, pois desde 1940 acompanho esse espetáculo de país alegre e sem rumo, na penitência de pecador por ter recebido um paraíso e não ter conseguido convertê-lo em terra prometida, ao contrário do que fizeram os israelenses com um deserto. Talvez um Sinai esteja dentro de nós, e habitamos o deserto submissos a ele e a falsos Moisés. Talvez apenas não tenhamos ânimo e coragem para separar as águas e atravessar o mar vermelho.

LEIA MAIS TEXTOS DE ALEXANDRE GARCIA

Publicidade

Guilherme Andriolo

Nascido em 2005 em Santa Cruz do Sul, ingressou como estagiário no Portal Gaz logo no primeiro semestre de faculdade e desde então auxilia na produção de conteúdos multimídia.

Share
Published by
Guilherme Andriolo

This website uses cookies.