Uma nova tecnologia desenvolvida por cientistas brasileiros promete revolucionar a forma como identificamos alimentos impróprios para consumo: uma embalagem que muda de cor conforme o alimento se deteriora. O sistema, que utiliza pigmentos naturais extraídos do repolho roxo, foi criado por pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP), em parceria com a Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e a Universidade de Illinois, em Chicago, nos Estados Unidos (UIC).
A inovação da ciência brasileira foi empregar atécnica de fiação por sopro em solução para produzir mantas de nanofibras inteligentes usando pigmentos vegetais naturais. As mantas, utilizadas como embalagens, são capazes de monitorar a qualidade de alimentos em tempo real pela alteração da cor. A alteração da embalagem édesencadeada pela interação química entre os compostos liberados durante a deterioração e o material da embalagem.Em testes em laboratórios, a mantaapresentou ótimos resultados, mudou de roxo para azuldurante omonitoramento do frescor do filé de merluza.
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A cor roxa indicou que o alimento estava apropriado ao consumo. Mas, depois de 24 horas, a cor tornou-se menos intensa e, após 48 horas, surgiram tons azul-acinzentados. Passadas 72 horas, a coloração azul sinalizou a deterioração do filé de peixe armazenado, sem a necessidade de abrir a embalagem.
Para os pesquisadores da Embrapa, os resultados mostram que mantas compostas de nanofibras se comportam como materiais inteligentes, exibindo mudanças visíveis na cor durante o processo de deterioração de filés de peixe. Porém, embora essa característica aponte uso potencial das mantas no monitoramento do frescor de peixes e frutos do mar, os cientistas dizem que há necessidade de ampliar os estudos para validar sua aplicação em diferentes espécies.
A técnica de fiação por sopro em solução (SBS, do inglês Solution Blow Spinning), desenvolvida em 2009 por pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Embrapa Instrumentação, em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), é capaz de produzir micro e nanoestruturas poliméricas, e apresenta diversas vantagens. Entre elas, a rapidez no desenvolvimento das nanofibras, que leva apenas duas horas.
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A técnica ainda apresenta escalabilidade, versatilidade, fácil manejo, além de ser de baixo custo e utilizar forças aerodinâmicas para a produção das nanofibras, o que reduz muito o consumo de energia. A técnica foi descrita pelos autores em artigo no Journal of Applied Polymer Science.
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As nanofibrassão estruturas em escala nanométrica que podem formar não tecidos. Um nanômetro é equivalente a um bilionésimo de um metro. “Os estudos anteriores sobre nanofibras inteligentes contendo antocianinas extraídas de alimentos haviam sido conduzidos exclusivamente usando a técnica de eletrofiação”, conta Josemar Gonçalves de Oliveira Filho, que desenvolveu o processo em seu pós-doutorado. A eletrofiação, tradicionalmente utilizada com nanofibras, apresenta várias limitações, como baixa escalabilidade, altos custos, baixo rendimento, necessidade de 24 horas para produção e uso de altas voltagens.
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O estudo de Oliveira Filho foi supervisionado pelo pesquisador da Embrapa Luiz Henrique Capparelli Mattoso, no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA). Parte da pesquisa foi realizada no Departamento de Engenharia Mecânica e Industrial da Universidade de Illinois, em Chicago (EUA).
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No estudo, os pesquisadores utilizaram antocianinas e o polímero biocompatível e biodegradável, conhecido como policaprolactona. As antocianinas são pigmentos naturais encontrados em algumas plantas, frutas, flores e vegetais, que exibem uma ampla gama de cores como vermelho, rosa, azul, roxo, cinza, verde e amarelo.
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Elas mudam de cor conforme o pH (grau de acidez ou alcalinidade) do meio em que se encontram. Na pesquisa, as antocianinas foram extraídas de resíduos de repolho roxo. Como o repolho roxo é rico em antocianinas, pode ser utilizado como indicador de pH. O estudo testou mais de dez pigmentos, a maioria de vegetais. “As nanofibras demonstraram capacidade de monitorar a deterioração de filés de peixe em tempo real, revelando potencial como materiais de embalagem inteligentes para alimentos”, avalia Oliveira Filho.
O pós-doutorando esclarece que, embora, as pesquisas sobre o uso de antocianinas de resíduos alimentares na produção de outros materiais inteligentes estejam documentadas na literatura, as informações são escassas sobre a aplicação desses extratos na produção de nanofibras inteligentes.
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Já Mattoso explica que a policaprolactona, polímero biodegradável usado na embalagem, possui boa flexibilidade e resistência mecânica, o que é vantajoso para a proteção de alimentos. Além disso, tem potencial para uso em uma ampla gama de solventes e baixa temperatura de fusão, o que facilita o processamento com menor consumo de energia.
“Por isso, é considerada uma alternativa para o desenvolvimento de nanofibras para diversas aplicações. Quando combinadas com antocianinas, as nanofibras apresentam uma capacidade notável de monitorar mudanças de pH, detectar a produção de amônia e aminas voláteis, além de identificar o crescimento de bactérias. Esses indicadores são essenciais para sinalizar a deterioração em produtos como peixe e frutos do mar”, detalha o especialista em nanotecnologia.
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