Agronegócio

“Falta transparência no processo que antecede a COP”, diz diretor-executivo da Abifumo

Pautas associadas à 11ª Conferência das Partes (COP-11) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco, iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), que ocorrerá entre os dias 17 e 22 deste mês, em Genebra, na Suíça, são acompanhadas atentamente pela Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo), sediada em Brasília. E a missão de representar o setor nesta e em outras demandas é de um goiano, Edimilson Alves, na condição de diretor-executivo da entidade.

Nascido em Alexânia, a 120 quilômetros de Goiânia, Alves, que é advogado, tinha conhecimento não tão profundo da cadeia produtiva do tabaco no momento em que aceitou o desafio de se integrar à equipe da Abifumo, em meados de 2024. Então aos 51 anos (está com 52), ele atuava como diretor-geral do Instituto Pensar Agro (IPA), também sediado em Brasília, ligado à Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Ali, a partir do trânsito nos ambientes legislativos federais, tinha noção dos inúmeros desafios que o setor do tabaco enfrentava, em virtude das constantes e variadas pressões de movimentos antitabagistas, dentro e fora do governo. Virou um entusiasta absoluto desse segmento. Na quarta reportagem da série O tabaco na mesa, Alves aponta os principais aspectos que inquietam as indústrias do tabaco no Brasil, e que tendem a ter repercussão na COP-11. É um setor que há muitos anos lida com a concorrência de produto ilegal, oriundo de contrabando ou de fabricação clandestina em território nacional.

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Por outro lado, além das inúmeras restrições para o comércio de cigarros, o segmento tem buscado sensibilizar o governo e a sociedade para a pertinência de regulamentar o mercado dos dispositivos eletrônicos para fumar, os DEFs, também conhecidos como cigarros eletrônicos. O processo se arrasta há anos junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em paralelo, o mercado nacional é inundado por produto contrabandeado.

Esses e outros temas de interesse das indústrias e, por extensão, de toda a cadeia produtiva, acabam tendo na Abifumo um interlocutor. Ela atua ao lado dos produtores rurais, representados pela Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) e por federações e sindicatos de trabalhadores rurais e da agricultura, e ainda das empresas produtoras, processadoras e exportadoras de tabaco, estas agrupadas no Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco).

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Uma vez que tem sua sede em Brasília, a Abifumo ocupa-se justamente do acompanhamento direto dos trâmites e decisões em ambiente legislativo e executivo federal. Fundada em 6 de agosto de 1979, inicialmente no Rio de Janeiro, a Abifumo alçou-se à condição de relevante entidade do agro nacional, tendo tido em seu grupo gestor, por muitos anos, o ex-ministro da Agricultura e ex-presidente do Banco do Brasil Nestor Jost, candelariense, que faleceu em 2010.

Na entrevista à série O tabaco na mesa, Alves reitera que falta transparência no processo de preparação que antecede a COP, em especial no âmbito da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro (Conicq), instância interministerial responsável por debater os temas relacionados a decisões advindas de cada conferência. Ele também salienta, uma vez mais, o quanto o insucesso na repressão à problemática do contrabando e do produto ilegal aflige o setor e, obviamente, a sociedade. Além da concorrência desleal, a evasão de divisas e o financiamento do crime organizado são um drama que não tem sido estancado pelas autoridades competentes.

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Confira a entrevista com Edimilson Alves

  • Gazeta do Sul – Como o senhor avalia as atividades preparatórias à COP-11, realizadas até o momento em âmbito federal, e de quais o senhor conseguiu participar, em nome da Abifumo? Foram proveitosas ou suficientes?
    Edimilson Alves – Fizemos a tarefa de casa, juntamente com as demais instituições em prol do setor. Visitamos os ministérios com o objetivo de conscientizar os ministros a cumprirem o que o governo assinou lá atrás, com o texto interpretativo, ou Declaração Interpretativa, documento interministerial elaborado por vários ministérios, onde consta, principalmente, que não haveria nenhum risco para a produção, sobretudo aos produtores de tabaco.
  • O senhor entende que a forma como o governo conduz o ambiente preparatório é o mais adequado, ou correto? Ou poderia haver um maior debate envolvendo o setor diretamente interessado?
    A falta de transparência no processo preparatório à COP sempre é utilizada pela Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro (Conicq), alijando os representantes do setor produtivo dos debates importantes para a manutenção e o sustento de milhares de famílias.
  • Como o senhor avalia a atuação da própria Comissão Nacional de Implementação da Convenção-Quadro (Conicq) no processo? Ela realmente cumpre o papel dela esperado, de ser abrangente?
    Volto a frisar: a falta de transparência no processo que antecede a COP sempre é utilizada pela Conicq em desfavor dos representantes do setor produtivo nos debates importantes para a manutenção e sustento de milhares de famílias. Não é o governo o coordenador da Conicq, e sim a própria secretaria-executiva da entidade. Poderia ser bem diferente.
  • O senhor pretende estar em Genebra a fim de acompanhar a COP de perto? Que atividades ou ações serão possíveis, em defesa dos interesses do setor?
    Sim, estamos unidos em prol da manutenção da cadeia produtiva de tabaco, junto a parlamentares e membros dos governos estaduais e federal.
  • O senhor teme alguma medida específica que possa advir da COP-11?
    Sim. Por exemplo, num possível banimento dos filtros. Se houvesse o banimento, quem hoje fuma um cigarro com filtro não vai fumar um sem filtro. O que aconteceria é que aumentaria o consumo do cigarro do crime organizado, que hoje corresponde a 32% do mercado nacional.
    Se viesse o banimento do filtro, quem é fumante hoje, ao invés de migrar para o sem filtro, fumaria o do crime organizado. Se hoje é 32%, podemos voltar ao período de 2019, quando o crime organizado tinha cerca de 60% do mercado nacional. Porque, se vier a determinação de retirar o filtro, a indústria legal vai retirar, mas o crime organizado tenho minhas dúvidas se vai obedecer a uma determinação do governo brasileiro…

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Perdas bilionárias

A cadeia produtiva do tabaco e o governo brasileiro hoje têm bastante clareza sobre a catástrofe que representa o comércio de produto ilegal (advindo de contrabando ou de fábricas clandestinas) em realidade nacional. Esse produto ilícito ocupa nada menos do que 32% do mercado, e isso que houve significativo recuo em relação a 2019, quando já se situava na faixa de 60% de participação. Houve inibição mais forte durante a pandemia, com as restrições à mobilidade social em diferentes ambientes.
Atualmente, por cálculos do setor, o volume do mercado ilegal no Brasil corresponde a R$ 34 bilhões. As perdas decorrentes de contrabando são estimadas em R$ 9 bilhões

A 1ª Pesquisa Nacional sobre a Demanda por Bens e Serviços Ilícitos no Brasil, realizada pela Escola de Segurança Multidimensional (Esem), da Universidade de São Paulo (USP), descortina um cenário de franca calamidade, não apenas sobre as finanças, mas também sobre a saúde e o ambiente produtivo e industrial. O estudo, cujo resultado foi divulgado em meados de 2025, buscou levantar as percepções acerca da aceitabilidade de produtos não oficiais, além do reconhecimento desse tipo de produto e da frequência de compra. Foram ouvidas 3 mil pessoas, das quais 1.880 de forma online e outras 1.120 em entrevistas presenciais.

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A conclusão é de que “o mercado de bens ilícitos é um fenômeno global que compromete a economia formal, financia organizações criminosas e terroristas e atinge diretamente os grupos sociais mais vulneráveis”. O relatório final ainda reitera que o comércio de ilícitos requer atenção porque sua demanda tem origem direta nos consumidores. “Produtos com alta procura atraem organizações criminosas, que estruturam cadeias globais de atividades ilícitas, envolvendo falsificação, adulteração, contrabando, descaminho, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e controle de redes de distribuição e comercialização”.

No caso específico dos produtos de tabaco e nicotina, levantou-se que 15% da população brasileira é fumante (o que conforma um público de quase 32 milhões de pessoas). Nesse cenário, três marcas paraguaias ilegais (Eight, Gift e Camel) representam 11% do total de menções de marcas favoritas dos brasileiros. Em outro nicho, embora os dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) sejam proibidos no País, 55% dos usuários existentes, e que consomem produto ilegal, afirmam usar tais produtos várias vezes durante a semana.

Em termos de percepção das causas da ilegalidade no setor, a pesquisa identificou que para 22% dos brasileiros o comércio ilegal de tabaco existe em razão da demanda por produtos mais baratos; 20% acreditam que os impostos elevados são a principal causa; 59% acreditam que o comércio ilegal de tabaco prejudica a economia nacional; 74% acreditam que o comércio ilegal de tabaco fortalece o crime organizado e 43% das menções indicam que os brasileiros defendem maior fiscalização nas fronteiras para combater o comércio ilegal.

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carolina.appel

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