Agronegócio

“Nós vamos seguir cobrando coerência”, diz Gilson Becker

Os produtores de tabaco distribuídos por toda a região Sul do Brasil têm plenas condições de avaliar a importância econômica dessa atividade para a sustentação de suas famílias. Se no meio rural isso ocorre, não é muito diferente com os gestores dos mais de 500 municípios em que essa cultura está presente. E, no caso do prefeito reeleito de Vera Cruz, Gilson Becker (PSB), ele pode dimensionar o papel dessas folhas duplamente: porque como agricultor, estabelecido na localidade de Vila Progresso, a cerca de oito quilômetros da cidade, há muitos anos tem no tabaco uma fonte de renda; e, enquanto chefe do Executivo, conduz o sexto município que mais produz tabaco no Rio Grande do Sul.

Também pela experiência que traz do campo, Becker foi eleito em março deste ano para a presidência da Associação dos Municípios Produtores de Tabaco (Amprotabaco), entidade que, no país, congrega os gestores públicos municipais que sabem da importância da produção e do comércio das folhas para as finanças de suas localidades. Nascido em 11 de agosto de 1979, Gilson tem 46 anos, e em paralelo é o presidente do Consórcio Intermunicipal de Serviços do Vale do Rio Pardo (Cisvale).

LEIA TAMBÉM: “Há ranço ideológico no País”, diz Airton Artus

Publicidade

À frente da Amprotabaco, ele atua na defesa da diversificação econômica, da valorização do pequeno produtor e do fortalecimento de políticas públicas que garantam o desenvolvimento sustentável das regiões do tabaco. Seu trabalho alia experiência administrativa, conhecimento técnico e ainda compromisso com o diálogo. Tais características o consolidam como uma liderança expressiva na articulação entre o campo, o meio ambiente e a gestão pública.

Na condição de presidente da Amprotabaco, Gilson Becker estará em deslocamento neste final de semana como integrante da comitiva de representantes da cadeia produtiva e das autoridades do Sul do Brasil que vão acompanhar de perto a 11a Conferência das Partes (COP-11) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco. Esse encontro mundial, promovido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), ocorre a partir de segunda-feira em Genebra, na Suíça, reunindo delegações das nações signatárias e que ali discutem alternativas para diminuir o malefício do tabagismo em sociedade. A preocupação dos produtores e de todos os que atuam em defesa do segmento é que cada vez mais os debates na COP têm saído do âmbito da saúde e chegado ao terreno do cultivo e do comércio.

LEIA TAMBÉM: “O atual governo federal tem adotado uma postura distante do setor”, diz Kelly Moraes

Publicidade

Na quinta e última entrevista de final de semana da série “O tabaco na mesa”, publicada pela Gazeta do Sul, com a opinião de líderes das principais entidades representativas do setor, Becker enfatiza que, graças à articulação de líderes e políticos, houve avanços no diálogo com representações diplomáticas, buscando estabilidade regulatória e previsibilidade de mercado. 

No entanto, manifesta a sua apreensão com eventuais decisões que possam advir de Genebra e ampliem os obstáculos para o mercado do tabaco brasileiro. Na safra 2024/25, o País colheu 719.891 toneladas, conforme dados levantados pela Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra). O destaque fica para a variedade Virgínia, amplamente cultivada no Vale do Rio Pardo. 

O protagonismo do tabaco na região fica evidente diante de sua presença nos municípios. Dos 30 primeiros colocados em produção, na última temporada, oito estão no Vale do Rio Pardo. Vera Cruz produziu 8.123 toneladas e movimenta-se a fim de ampliar o volume no novo ciclo, cuja colheita já se iniciou. Sobre essa relevância, Gilson Becker discorreu na entrevista concedida à Gazeta.

Publicidade

LEIA TAMBÉM: EXCLUSIVO: Brasil tende a ser contra filtros de cigarro e DEFs na COP 11

Entrevista – Gilson Becker, prefeito de Vera Cruz

  • Gazeta do Sul – Como o senhor avalia os eventos preparatórios à COP-11 realizados no Brasil e que envolveram as entidades do setor do tabaco? De quais o senhor conseguiu participar?

Gilson Becker – Foram espaços importantes de escuta e posicionamento responsável da cadeia. A pauta avançou quando conseguimos apresentar números e impactos reais nos municípios e famílias produtoras. Em nome de nossa entidade, realizamos grande mobilização em Brasília, com prefeitos, vereadores e líderes do setor, participando de audiência pública realizada pela Câmara dos Deputados. Esse foi um dos principais movimentos de nossa entidade neste ano. 

Estivemos em Genebra, com o embaixador do Brasil, em maio, e marcamos presença em agendas realizadas em Brasília e nos três estados do Sul. A ideia era preparar o terreno para levar a Genebra uma mensagem única: o Brasil é líder mundial em exportação de folha, com a atividade ancorando emprego e divisas, e precisa ser ouvido com seriedade nas decisões da COP-11.

Publicidade

  • Houve abertura junto ao governo federal no sentido de ouvir as demandas da cadeia produtiva do tabaco? O setor se sente respaldado junto ao governo?

Houve diálogo em ministérios, por meio das audiências para tratar de posicionamento na COP-11 e de temas como exportações e competitividade. Nossa avaliação é de abertura técnica: quando mostramos dados de empregos, balança comercial e arrecadação nos territórios, a escuta melhora. Seguiremos cobrando coerência entre compromissos internacionais e a proteção de quem produz de forma regular e sustentável no País. 

  • Cerca de 10% dos municípios brasileiros têm cultivo de tabaco, número concentrado em especial no Sul do País. O que essa cultura hoje representa para essas localidades?

Representa renda estável na pequena propriedade, movimentação do comércio local, geração de vagas industriais e saldo de exportações para estados como o Rio Grande do Sul, onde o tabaco liderou o agronegócio nas vendas externas no primeiro trimestre deste ano. É uma cadeia que ancora políticas públicas municipais e mantém jovens no campo com assistência técnica, contrato, preço e seguro. 

A diversificação e a sustentabilidade são temas desenvolvidos pelas empresas junto às comunidades, elevando o patamar da responsabilidade social – que tanto é válida para o produtor quanto para a indústria – a outro patamar. Essa característica é, quiçá, uma das mais relevantes da atividade com o tabaco em nossos municípios. 

Publicidade

  • Como foi, ao longo de sua vida, o envolvimento do senhor com o tabaco? Como o senhor descreve essa cultura, tendo em vista sua importância econômica e social?

Minha trajetória é de quem viu de perto um sistema integrado que organiza a produção familiar, garante compra e assistência e entrega resultado fiscal aos municípios. Até hoje sou produtor de tabaco e tenho muito orgulho dessa atividade. É uma cultura exigente, com alto padrão de conformidade e rastreabilidade, que se tornou referência em organização produtiva no Brasil.

  • O que o senhor destacaria como méritos do tabaco na pequena propriedade?

Planejamento de safra com contrato, assistência técnica contínua, sistema centenário de produção integrada, que é modelo para diferentes culturas, diversificação possível com outras culturas e pecuária, e renda que gira a economia local. Além disso, é uma das poucas cadeias que combinam logística, crédito e seguro de forma estruturada para a agricultura familiar. Os números mostram seu peso: mais de 130 mil famílias na produção e forte participação nas exportações brasileiras.

  • Como a Amprotabaco tem se mobilizado no sentido de salientar e defender essa atividade econômica? Quais são as principais estratégias adotadas, nesse sentido?

Atuamos em três frentes: técnica, institucional e de comunicação. Na técnica, produzimos e difundimos dados municipais e regionais. Na institucional, articulamos com parlamento, ministérios e embaixadas para qualificar a posição brasileira. Na comunicação, mostramos a realidade das famílias, a legalidade e o papel do setor no desenvolvimento. A associação reúne centenas de municípios do Sul exatamente para dar escala e unidade a essa defesa.

  • O senhor vai a Genebra na comitiva de representantes da cadeia produtiva, que acompanhará a COP-11? Como a Amprotabaco se fará presente e qual a expectativa do senhor em relação à defesa dos interesses do setor produtivo?

Sim. Vamos com agenda objetiva: levar evidências socioeconômicas, defender segurança jurídica para quem produz dentro da lei e pedir que qualquer nova regulação considere impactos territoriais e o tempo de transição. Evidenciar que onde tem tabaco tem desenvolvimento, oportunidade e geração de emprego e renda. O Brasil é o maior exportador de folha há décadas; nossa cobrança é por coerência e respeito às comunidades que mantêm esse resultado.

  • O que o tabaco representa para Vera Cruz?

Geração de emprego na lavoura e no processamento, arrecadação municipal e dinamismo do comércio. Em momentos recentes, o tabaco foi protagonista nas exportações gaúchas e na criação de vagas formais no agronegócio. Isso se traduz em orçamento público e serviços para a população.

  • Junto aos governos dos três estados do Sul, o senhor entende que a importância do tabaco e das pautas a ele associadas tem a plena relevância que merecem?

Os governos estaduais reconhecem o peso econômico e têm sido parceiros em agendas de competitividade, infraestrutura e comércio exterior. Sempre há espaço para aperfeiçoar políticas de diversificação, logística e qualificação profissional, mas o diálogo no Sul é maduro e baseado em evidências.

  • Em quais instâncias ou organismos a Amprotabaco tem tido abertura e melhor acolhida a suas pautas e demandas?

No parlamento, em comissões temáticas e em secretarias ligadas a desenvolvimento econômico, agricultura e comércio exterior. Também avançamos em diálogos com representações diplomáticas, com foco em estabilidade regulatória e previsibilidade de mercado. 

Nossa base parlamentar que defende a cadeia do tabaco é articulada e participa de forma ativa das discussões, por isso entendemos que são grandes aliados, principalmente nos três estados do Sul do Brasil. 

  • A questão do mercado ilegal para produtos de tabaco e a própria questão da regulamentação dos dispositivos eletrônicos para fumar no Brasil também ocupam a Amprotabaco? Como a entidade vê tais temas?

 Sim. Mercado ilegal corrói arrecadação, coloca produtos sem controle sanitário nas ruas e prejudica o produtor e a indústria legal. Defendemos repressão qualificada ao contrabando e políticas que não ampliem o diferencial de preço com o ilegal. Sobre dispositivos eletrônicos, o debate deve sair da proibição abstrata e entrar na regulação baseada em evidências, com padrões de qualidade, idade mínima, comunicação responsável e fiscalização, para evitar que um mercado já existente siga na informalidade. 

Também pedimos que qualquer decisão considere os efeitos sobre a cadeia agrícola e os municípios produtores. O tabaco é parte da solução do desenvolvimento regional. O Brasil precisa compatibilizar compromissos de saúde com a proteção de uma cadeia legal, exportadora e socialmente relevante, com transições responsáveis, combate ao ilegal e respeito às famílias que sustentam essa produção, e não o contrário a isso.

O currículo de Becker

Gilson Becker é graduado em Gestão Ambiental, com especializações em Administração Pública, Gestão Urbana, Gestão Hospitalar e MBA em Administração e Gestão em Saúde Pública. Sua trajetória une técnica e compromisso com o desenvolvimento sustentável, marcas que o consagraram como uma das lideranças regionais mais atuantes no Rio Grande do Sul. Servidor de carreira do Município de Vera Cruz, foi coordenador da Estação de Tratamento de Água de Vera Cruz.

Filho de produtores rurais, o casal Egon e Lourdes Elaine Becker, cresceu em Vila Progresso, onde aprendeu desde cedo o valor do trabalho no campo e a importância do cuidado com o meio ambiente. A propriedade da família mantém há mais de 25 anos a produção de tabaco, atividade que o aproximou ainda mais da realidade dos pequenos produtores. 

Com formação técnica em agroindústria e meio ambiente, busca integrar conhecimento e prática, levando a experiência do campo para o centro das decisões públicas. É ativo em diversas entidades, tendo passagem por vários projetos e organismos. Antes de assumir a Prefeitura, hoje em segunda gestão, foi secretário municipal de Obras, Saneamento e Trânsito e também de Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente.

LEIA MAIS DE AGRONEGÓCIO

QUER RECEBER NOTÍCIAS DE SANTA CRUZ DO SUL E REGIÃO NO SEU CELULAR? ENTRE NO NOSSO NOVO CANAL DO WHATSAPP CLICANDO AQUI 📲. AINDA NÃO É ASSINANTE GAZETA? CLIQUE AQUI E FAÇA AGORA!

Karoline Rosa

Share
Published by
Karoline Rosa

This website uses cookies.