Cultura e Lazer

O dia em que Grace Kelly salvou Mônaco

Mônaco é um pequeno principado de pouco mais de dois quilômetros quadrados – o segundo menor país do mundo – encravado entre o azul intenso do Mediterrâneo e os rochedos da Riviera Francesa. Conhecido pelos cassinos de Monte Carlo, pelos iates milionários e o brilho dos seus eventos internacionais, o principado abriga uma das maiores concentrações de riqueza do planeta: cerca de 30% de seus moradores são milionários, e é possível contar quantos carros de luxo cruzam as ruas por minuto. Ferraris, Maseratis e Lamborghinis se misturam às curvas do Grande Prêmio de Fórmula 1 de Mônaco, o circuito urbano mais famoso do mundo.

Mas o que Mônaco tem a ver com esta coluna, dedicada à cultura italiana?

Muito mais do que se imagina. Por trás do glamour e da sofisticação, há uma história profundamente ligada à Itália. O principado é governado há mais de sete séculos pela família Grimaldi, de origem genovesa – um sobrenome que atravessou a Idade Média, guerras e transformações políticas até chegar ao trono monegasco. Foi Francisco Grimaldi, um nobre de Gênova, quem em 1297 conquistou o rochedo de Mônaco disfarçado de monge franciscano, fundando uma das dinastias mais antigas da Europa. Desde então, o sangue italiano continua a pulsar no coração desse pequeno Estado soberano, que carrega, em suas origens, a alma dos seus antepassados ligúrios.

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À primeira vista, é difícil imaginar que esse símbolo de luxo e estabilidade já esteve à beira da falência. Nos anos 1950, Mônaco atravessou um período de incertezas e quase ruína. O principado enfrentava grave crise econômica: a França havia encerrado antigos acordos fiscais, o turismo de elite estava em declínio e o Cassino de Monte Carlo, enfraquecido no pós-guerra, já não sustentava as finanças do Estado. Foi nesse cenário, entre contas apertadas e o risco de perder relevância, que o improvável aconteceu – o amor, ou talvez um casamento repleto de interesses, acabou salvando uma dinastia.

Grace Patricia Kelly nasceu em Filadélfia, em 1929, iniciou a carreira como modelo antes de se tornar atriz, e a sua beleza e elegância já escondiam um destino: a vida de princesa. Em apenas cinco anos, rodou 11 filmes e conquistou o mundo com seu talento. Ganhou o Oscar de Melhor Atriz em 1954 por The Country Girl e, no ano seguinte, foi convidada para o Festival de Cannes.

Durante essa viagem, um jornalista da revista Paris Match teve uma ideia que mudaria para sempre a história de Mônaco: apresentar a estrela americana ao príncipe Rainier. 

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Não foi amor à primeira vista. Uma mulher deseja ser cortejada e conquistada. Assim, Rainier passou a escrever cartas de amor para Grace, as quais começaram a chamar a atenção do seu coração. Poucos meses depois, viajou até a Filadélfia para encontrá-la novamente. Entre longas caminhadas e conversas sobre a vida, o sentimento amadureceu. Grace, que estava noiva de um estilista americano, rompeu o compromisso e aceitou o pedido de casamento do príncipe.

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O anúncio oficial aconteceu em janeiro de 1956. O mundo ficou fascinado com a ideia de uma estrela de cinema tornar-se princesa de verdade – um filme de contos de fada da vida real. O sonho de muitas meninas se tornava realidade, mostrava que sim, era possível. Porém, esse sonho se tornou realidade em troca de um grande preço. Grace nunca mais teve autorização de voltar às telas, o que a abalou profundamente. A sua nova vida exigia seguir rígidas regras.

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O casamento foi celebrado em duas cerimônias: a civil, em 18 de abril, e a religiosa, no dia seguinte, na Catedral de São Nicolau, em Mônaco. Se as novas gerações cresceram assistindo aos casamentos de príncipes como William e Kate ou Harry e Meghan, é importante lembrar que tudo começou ali: Grace Kelly e o príncipe Rainier III protagonizaram o primeiro casamento real transmitido pela televisão, em preto e branco. 

Nos Estados Unidos, as filmagens precisaram ser enviadas por avião, já que ainda não existiam satélites — um feito inédito para a época. Mais de 30 milhões de pessoas assistiram, fascinadas, à união que transformaria não apenas duas vidas, mas o destino de um país. O evento se tornou manchete nos jornais, atração nos cinemas e tema nas rádios do mundo. Mônaco, um pequeno principado discreto, estava sob os holofotes do planeta. E o vestido de renda de Grace, criado pela figurinista da MGM Helen Rose, entrou para a história como um dos trajes de noiva mais icônicos de todos os tempos.

Talvez essa tenha sido uma das sacadas de marketing mais geniais da história. O impacto foi imediato. O casamento atraiu investimentos, turistas e o olhar da alta sociedade internacional. O príncipe Rainier soube aproveitar a oportunidade: desenvolveu o setor imobiliário, atraiu bancos e criou leis fiscais vantajosas. Em poucos anos, Mônaco se transformou em sinônimo de luxo, exclusividade e segurança, como a conhecemos hoje. A união de Grace e Rainier tornou-se o motor simbólico dessa transformação. Até 1961, apenas cinco anos depois do casamento, a receita anual do principado havia quadruplicado. 

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Apesar do glamour, Grace sentia falta da liberdade de atriz. O rígido protocolo muitas vezes a entediava. Mas ela encontrou novos caminhos para expressar sua sensibilidade: mergulhou em ações humanitárias, liderou a Cruz Vermelha de Mônaco e criou a Fundação Amade, voltada à proteção de crianças em situação de vulnerabilidade – uma organização que existe até hoje. Em 1964, fundou a Princess Grace Foundation, que apoia jovens talentos nas artes cênicas, dança e música. Uma mulher não apenas linda por fora, mas também por dentro. Ela buscava um propósito maior.

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Grace e Rainier ficaram casados por 26 anos e tiveram três filhos: Caroline, Albert (hoje Príncipe soberano) e Stéphanie. Infelizmente, no dia 14 de setembro de 1982, Grace sofreu acidente de carro nas estradas de Monte Carlo e faleceu aos 52 anos. Sua morte abalou o mundo.

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Mas até hoje Grace Kelly se mantém viva através da memória. A atriz que se tornou princesa e salvou um país. Em Mônaco, é possível notar sua beleza e presença por todos os ângulos: um jardim, uma fundação, uma foto antiga… Inclusive, visitamos a exposição “Grace #1” no Palácio de Mônaco, que tem o objetivo de oferecer um olhar íntimo sobre a sua complexa personalidade. 

É possível admirar as sua joias, acessórios, ensaios fotográficos… cada item escolhido com muito cuidado para representar a sua alma solar. Amava flores, a família e seus animais. Por trás de sua sofisticação e fama, existia uma mulher humilde, humana e que também, como todos nós, apenas buscava a felicidade e encontrar o seu propósito no mundo. 

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Marcio Souza

Jornalista, formado pela Unisinos, com MBA em Marketing, Estratégia e Inovação, pela Uninter. Completo, em 31 de dezembro de 2023, 27 anos de comunicação em rádio, jornal, revista, internet, TV e assessoria de comunicação.

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