É claro, jamais saberemos que diabos Glauber Rocha andaria aprontando nesses tempos frenéticos da vida brasileira; entretanto, nessa quarta-feira, 1º, na segunda noite da Mostra Competitiva Nacional do Festival Santa Cruz de Cinema, deu pra ter uma ideia: Copacabana Madureira, dirigido por Leonardo Martinelii, faz um apanhado mordaz e grandiloquente, à maneira do cinema-novista baiano, de um Rio de Janeiro que faz jus ao epíteto de “purgatório da beleza e do caos”.
Ninguém escapa: nem as fake news com mamadeiras e kits de doutrinação, nem os “tiozões do zap” que consumiam tais notícias como maná no deserto, nem a esquerda cirandeira que queria barrar o avanço ultraconservador à base de hashtags e karaokê, nem a religião que se deixa usar como força motriz do avanço neofascista, nem a autoindulgência e o ufanismo cariocas, muito menos a ponta de lança do autoritarismo à brasileira: a polícia, cuja brutalidade reiterada contra a população preta e pobre é mostrada, numa curva que faz o filme passar do sarcasmo para a denúncia brutal e contundente. Um filme a se ver e rever, com uma voz única e potente sobre o turbilhão nacional.
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A seguir, um díptico documental, mostrando universos distintos em Brasis muito distantes: o curitibano Seremos Ouvidas, dirigido por Larissa Nepomuceno, e o baiano Dois Riachões: Cacau e Liberdade. Um é urbano, o outro rural; um mostra um problema (a impossibilidade das mulheres surdas de denunciar e obter respaldo aos casos de violência doméstica), outro, uma solução (o trabalho comunitário num assentamento em antigos latifúndios de cacau, ocupado por descendentes de trabalhadores rurais dos mesmos campos).
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O segundo curta gaúcho da noite, Eu não sou um Robô, dirigido por Gabriela Lamas, já veio como uma grata surpresa no último Festival de Gramado; a realizadora de Sesmaria, um denso e áspero drama rural, muda radicalmente sua linguagem: traz um filme urbano, claustrofóbico, de humor ácido e forte referência de Cronenberg e Roy Andersson. A cumplicidade e – veja bem – o flerte entre a protagonista (a própria Gabriela, ótima no papel) e um homem-mosca são entabulados em diálogos que vão do banal ao non-sense, acentuando o tom absurdo da comédia proposta. Por trás do humor, há uma sutil abordagem da desumanização inerente ao indivíduo em uma sociedade individualista – ecoando, num registro muito distinto, os temas de Desencanto.
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