Ao leitor, segue desde já um importante alerta: muito cuidado neste domingo. Será o dia em que, segundo uma antiga tradição de origem celta, se abrirão as fronteiras entre o nosso mundo e o sobrenatural, permitindo a passagem de fadas, duendes, espíritos travessos e toda sorte de monstros arrepiantes. Sim, neste domingo é Dia das Bruxas.
Talvez os mais céticos duvidem disso. É porque desconhecem os planos que nossa caçula, Ágatha, vem cuidadosamente tramando para a data. Se depender dela, esse será um Halloween capaz de deixar o mais valente guerreiro celta de cabelo em pé.
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– Se não for assim – alega ela – a fantasia fica batida, as pessoas podem acabar me reconhecendo e não se assustarão.
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Ano passado, Ágatha vestiu-se de freira fantasma. Para tanto, lançou mão de tecido TNT para confeccionar um longo hábito negro, que a cobriu da cabeça aos pés; e carregou na maquiagem, adotando um rosto pálido, espectral, com olhos cercados por sombras escuras. Foi horripilante.
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Por falar em comida, Ágatha também planeja guloseimas especiais para o Halloween. O ponto alto será o bolo, recoberto com uma calda verde, de aspecto repugnante, que ela batizou de “baba de monstro”. Será adornado com baratas e aranhas de plástico, além de “vermes”, estes, feitos de massinha comestível. Por conta disso, a traquinas já lançou um alerta:
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A escola das nossas gurias mais novas autorizou que as crianças fossem à aula, nessa sexta-feira, com suas fantasias de Halloween, o que oportunizou a Ágatha e à irmã um ano mais velha, Yasmin, testar os efeitos de suas indumentárias. Yasmin optou por ir de It, a Coisa. Ao longo da semana, confeccionou três pom-pons de lã vermelha, que foram costurados a uma camisa branca, convertendo-a em uma roupa de palhaço. No rosto, delineou com tinta vermelha os contornos da criatura diabólica imaginada por Stephen King, nos moldes recriados pelo cinema. Essa foi relativamente fácil.
O mais difícil seria transformar o rosto da caçula em uma caveira mexicana. Prevendo complicações, minha esposa ensaiou a pintura ao longo da semana, sempre cronometrando o tempo necessário para tanto. Concluiu que seria necessário despertar a traquinas mais de uma hora antes do início da aula, nessa sexta-feira, para garantir que fosse à escola devidamente a caráter, sem falhas que comprometessem o aspecto artístico da caveira.
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No fim das contas, o mais difícil foi acordar a marota tão cedo. Ainda sonolenta, sem querer abandonar o colchão, autorizou a mãe a fazer a pintura com ela dormindo mesmo. Que desaforo…
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Com o arrefecimento da pandemia, Ágatha também planeja seguir o costume norte-americano de bater à porta dos vizinhos, devidamente trajada, para fazer a tradicional ameaça: “Doces ou travessuras?!”
A ideia, contudo, tem deixado minha esposa apreensiva. Não lhe agrada deixar a traquinas à solta, circulando pela vizinhança com uma caveira mexicana pintada no rosto.
– O que ela vai me aprontar…
Em uma tentativa de desestimular tal projeto, perguntei à caçula o que fará caso algum vizinho mais corajoso escolha a opção 2 – travessuras. Mas isso ela não conta.
– Funcionará melhor se eu guardar segredo – justificou, em tom conspiratório. – As pessoas têm mais medo quando não sabem o que pode acontecer…
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