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Direto da redação

Ágatha e a teoria da evolução do Homo sapiens: das vantagens de ficar sem luz

Quando se completaram 35 horas sem luz lá em casa, o pânico começou a se instalar. A pressão arterial se alterou, as mãos passaram a tremer. Como não se obtinha, via 0800, alguma previsão de retorno do serviço, peguei o carro e rodei a esmo pela cidade em busca de alguma equipe da RGE que pudesse, ao menos, ouvir meu desabafo. Sintomas clássicos da síndrome de abstinência de energia elétrica.

A eletricidade caiu logo no início do temporal de terça-feira passada e, na manhã de quinta, nossa rua continuava sem luz. Nem deveria me lamuriar, afinal, nossa casa escapou incólume à tormenta, enquanto centenas de moradores da região sofreram prejuízos imensos. Porém, para uma família contemporânea de seis pessoas, dentre as quais um cronista viciado em escrever, ficar sem energia elétrica é uma tortura. Os celulares e tablets, recarregados na casa de  parentes, logo ficavam sem carga, não havia como ligar a smart TV e as crianças, sem as habituais distrações, passaram a ter atitudes estranhas, a cobrar atenção.  

Foi o caso da Ágatha, nossa caçula de 5 anos, que a pedido de leitores se tornou presença obrigatória quando ocupo esse espaço. Desprovida de suas tecnologias de descontração, Ágatha teve mais tempo para revelar as angústias que a perseguem, dentre as quais, a sua interpretação da teoria da evolução do Homo sapiens. Vale dizer que, diferente do que muitos pensam, a ciência não diz que o homem veio do macaco – na verdade, ambos têm ancestrais em comum, desenvolveram-se a partir de um mesmo ascendente mais primitivo, que ainda não era um macaco. Mas Ágatha já havia entendido de um outro jeito.  

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– Pai, mãe. Não lembro do tempo em que eu era um macaquinho… Eu tinha rabinho? Subia em árvores? Quando foi que virei criança humana? Ou a gente só é macaco na barriga da mamãe?

Para mim o pior foi ficar sem computador para escrever, para produzir. Cada minuto que passava sem produzir, sem preparar aulas, escrever crônicas ou artigos para o doutorado, parecia uma vida inteira desperdiçada. Mas a solução, enfim, foi me render a essa parada forçada, sentar, conversar mais com o pessoal de casa, ensinar as crianças e aprender com elas. E refletir. Refletir, inclusive, sobre o quanto nossa ansiedade em produzir, atributo dos dias de hoje, nos impede de fazer pausas eventuais para… refletir.

Foi preciso ficar sem luz para perceber que paradas esporádicas são necessárias para prestamos mais atenção à nossa volta, para falar e escutar, para reavaliar o significado do que produzimos com toda essa intensidade frenética e, inclusive, para qualificar essas produções. E, ainda, para buscar um sentido mais pleno para a vida.

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