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BELVEDERE

As medidas para conter a movimentação da terra

Foto: Inor Assmann/Banco de Imagens

Residências situadas na Rua João Werling, no Belvedere, foram as mais afetadas após as fortes chuvas que atingiram Santa Cruz entre o final de abril e início de maio de 2024

Os alagamentos não foram os únicos problemas enfrentados em Santa Cruz do Sul durante a catástrofe climática registrada entre o final de abril e o início de maio de 2024. As chuvas torrenciais registradas naquele período também provocaram desabamentos e deslizamentos no município, sobretudo no Bairro Belvedere e em partes do Margarida.

Situadas em regiões de encosta íngreme, essas áreas se encontram em uma zona de fratura e de falhas geológicas. E, com as chuvas intensas, a água resultou no aumento de peso das encostas, levando aos movimentos de massa que provocaram estragos nunca antes vistos nas vias e nas residências. 

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Diante dos danos e dos riscos de colapso, a Defesa Civil Municipal ordenou, na época, a desocupação de 466 imóveis no Bairro Margarida e 153 no Belvedere. Apesar da orientação do órgão público, muitos acabaram retornando antes do previsto. E, para aqueles moradores que tiveram os lares interditados, a saída era para ser temporária, mas não foi.

Passados 365 dias desde aquele momento, as marcas dos deslizamentos permanecem nas rachaduras de muros e paredes de residências. Na Rua João Werlang, no Bairro Belvedere, uma placa faz um alerta a moradores e transeuntes: “Atenção! Área de deslizamento”. Enquanto parte dos habitantes seguiram com suas vidas, o tempo parece ter parado para aqueles que foram mais afetados. Sobretudo os que ainda não retornaram para os seus lares.

Município busca recursos para ampliar medidas de prevenção contra deslizamentos

Nos primeiros dias após a nova gestão municipal, o prefeito Sérgio Moraes iniciou uma força-tarefa para realizar obras emergenciais no Bairro Belvedere a fim de prevenir novos deslizamentos. Conduzida pelo gabinete do vice-prefeito Alex Knak, a iniciativa envolveu equipes da Defesa Civil e das secretarias de Meio Ambiente, Saneamento e Sustentabilidade, de Obras e Infraestrutura e de Serviços Públicos.

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Os trabalhos incluíram a desobstrução e ampliação de bueiros e a substituição de 50 metros de canalização. Envolveram ainda a limpeza de vegetação e podas de árvores situadas em encostas que podem exercer pressão adicional sobre o solo e contribuir para o movimento de massa que causa deslizamentos. Fissuras nas estradas foram preenchidas e são monitoradas para verificar a evolução após as chuvas.

Engenheiro Márcio Nicknig e secretário Vanir Azevedo apresentaram as ações

Agora, o município busca recursos federais para duas iniciativas importantes para o Belvedere. Uma delas é a instalação de barreiras no bairro para evitar novas ocorrências. Inicialmente, o projeto de contenção de blocos e encostas foi elaborado para atender às necessidades da área no entorno da BR-471, na altura do antigo Santuário de Schoenstatt. Entretanto, foi ampliado para o Bairro Belvedere. Conforme o engenheiro ambiental Márcio Alexandre Nicknig, elas serão fixadas em diversos pontos, podendo variar de tamanho conforme a necessidade.

A proposta foi elaborada a partir de uma série de estudos e levantamentos que se iniciaram antes das ocorrências do ano passado e que seguiram nos meses seguintes. O projeto e o orçamento estão sendo finalizandos para a inscrição no Novo PAC, com recursos destinados a prevenção de desastres. Em 2024, o governo federal investiu R$ 1,7 bilhão para 135 obras em 91 cidades do país.

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Na avaliação do secretário municipal de Planejamento e Mobilidade Urbana, Vanir Ramos de Azevedo, a expectativa é que o projeto seja aprovado. Outra medida que avançou é a ampliação da rede de drenagem pluvial do bairro. Segundo o engenheiro ambiental, ela prevê a retirada da água no topo do morro, e que seja encaminhada para um arroio. “A primeira coisa a ser feita em uma área de risco é gerenciar a água”, destaca Nicknig. 

O valor estimado é de aproximadamente R$ 27 milhões. O projeto foi inscrito no programa federal destinado a obras de melhoria da infraestrutura de drenagem urbana. O secretário de Planejamento destacou que tais ações foram baseadas na ciência e na apuração de profissionais. “Daqui a pouco começam a sair do papel. Não adianta apenas colocar as máquinas para tudo que é lado. Tem que haver planejamento.”

Residências permanecem interditadas um ano depois

Um ano após as ocorrências no Belvedere, oito residências continuam desocupadas diante do risco de novos desabamentos. A maioria está situada na Rua João Werlang. Em frente a elas, foram colocadas placas com a frase “Interditada. Proibida a ocupação.”

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Segundo o engenheiro da Defesa Civil Municipal, Leandro Kroth, tais medidas foram necessárias após a vistoria dos técnicos nas propriedades. “Em situações como essa, a segurança das pessoas e a preservação de vidas vêm em primeiro lugar. O patrimônio vem depois.”

Para retornar aos imóveis, os proprietários devem contratar um responsável técnico (um engenheiro civil, por exemplo) para elaborar um projeto de recuperação da estrutura apontando quais medidas devem ser adotadas. Feito isso, um laudo irá constatar se é segura ou não a ocupação da casa. 

Engenheiro Leandro Kroth explica as medidas que devem ser tomadas para a liberação das casas

O documento deverá ser encaminhado para a Defesa Civil emitir a desinterdição. Kroth ressalta que o proprietário do imóvel assume qualquer responsabilidade civil e criminal. Para o engenheiro, há possibilidade de que algumas estruturas, com rachaduras imensas, não possam ser recuperadas. “Isso tem que ser analisado por cada proprietário, e verificar se economicamente vale a pena”, acrescenta.
Conforme a Secretaria Municipal de Habitação, 11 moradores foram realocados. Destes, nove foram beneficiados pelo programa Aluguel Social e dois pelo Estadia Solidária Municipal.

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Nos meses que se sucederam ao fato, novas ações puderam ser avaliadas para proporcionar mais segurança aos moradores do Belvedere. Ainda em 2024, profissionais de Santa Cruz do Sul participaram de um curso promovido pelo governo federal em Brasília, com a participação do Serviço Geológico do Brasil (SGB). 

Além da capacitação, o município recebeu, ainda no ano passado, profissionais da SGB para fazer o mapeamento dessas áreas de risco de deslizamento e inundações. Eles retornaram a Santa Cruz em 2025 para dar continuidade ao trabalho. Com o uso de drone, elencaram os níveis de risco no Belvedere. Segundo Kroth, a região onde ocorreu o movimento de massa mais acentuado recebeu a classificação mais grave. 

Juntamente com os geólogos da SGB, o município contará com o suporte técnico de especialistas do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), de São Paulo, que há décadas atuam em situações de deslizamentos e inundações. Com a conclusão do mapeamento do SGB, será possível indicar quais ações devem ser adotadas para amenizar os riscos, além de contribuir com a captação de recursos federais.
Poderão ser elencadas, por exemplo, obras estruturantes, incluindo a instalação de gabiões (uma cesta metálica, preenchida com pedras ou seixos) ou de muros de contenção.

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Ainda podem sugerir ações mais simples, mas significativas, tais como o plantio de árvores ou de grama, além da ampliação da cobertura vegetal ou canalização de córregos onde há infiltração de água. “São  obras  de  menor  valor,  de  fácil  execução,  e  que  trazem  um  efeito  positivo no sentido de ajudar para que não ocorra movimento de encostas”, avalia Kroth.

No entanto, o engenheiro da Defesa Civil municipal salienta que tais ações servem para amenizar e não para eliminar os riscos. “Contra a natureza, o homem não tem poder”, ressalta.

“Tudo o que queremos é retornar”

O empresário Farlei Asterio Ertel, de 52 anos, está há um ano fora de casa. Após as fortes chuvas na virada do dia 1o para 2 de maio de 2024, foi informado pela Defesa Civil que deveria abandonar o lar, onde sua família vive há quase cinco décadas. 

No terreno estão duas casas, a floricultura da esposa e sua recicladora de eletrônicos. Toda a área precisou ser interditada. No início, achavam que seria apenas temporário. Mas, com o passar do tempo, compreendeu que não havia previsão de quando retornaria.

Fonte de angústia: propriedade de Farlei Ertel encontra-se interditada desde maio do ano passado

Desde então, a família de Ertel vive no apartamento de um amigo, no Bairro Arroio Grande, e que também cedeu uma sala comercial para a floricultura. Para dar continuidade aos seus negócios de reciclagem, alugou um pavilhão.

A casa, porém, não está abandonada. Ertel mantém a energia e a água, além de visitá-la duas vezes por dia. “Tudo o que queremos é retornar.” No entanto, um ano depois, a família não sabe exatamente quando voltará ao lar. Segundo Ertel, as conversas avançaram desde que o coronel César Eduardo Bonfanti assumiu a Defesa Civil Municipal.

Para retornar, ele deverá apresentar ao órgão público um laudo, assinado por um engenheiro, atestando que é seguro voltar. A expectativa é entregar o documento até novembro. A espera, porém, abala o empresário e a família. “Não é nada agradável. Tu alimenta uma perspectiva em cima dela e de uma hora para outra tudo muda.”

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“Não parece que passou um ano”

Desde os deslizamentos no início de maio do ano passado, o atendimento no Açougue e Mercado Gassen nunca mais foi o mesmo. Com a saída de muitos clientes que moravam nas proximidades do estabelecimento, após terem suas casas interditadas, o movimento diminuiu significativamente.

Para o proprietário, Edo Miguel Gassen, a sensação de é que a Rua João Werlang está parada no tempo há um ano. Desde lá, convivem com o cenário provocado pelas fortes chuvas, que causaram danos nas vias e residências. 

Edo Gassen viu o movimento do mercado decair desde os deslizamentos e a saída de moradores

A situação preocupa Gassen, que não sabe por quanto tempo a rua permanecerá assim. “Parece que caiu no esquecimento. E as pessoas se acostumaram com isso, cada um se vira como pode. Não parece que passou um ano, está tudo igual”, afirma.

Questionado sobre as consequências de uma eventual catástrofe similar à do ano passado, Gassen prefere nem pensar na hipótese. O estabelecimento, instalado no Belvedere há meia década, precisou ser evacuado e ficou quase uma semana fechado. “Não queremos passar por esse pavor novamente.”

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