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O TABACO NA MESA

Entrevista: “O tabaco merece todo o respeito”, frisa presidente de associação internacional

Aranda é produtor de tabaco em Cerillos, nas imediações de Salta, capital da província de mesmo nome

Primeiro presidente reeleito na história da Associação Internacional dos Produtores de Tabaco (ITGA), na assembleia da entidade realizada em outubro de 2024 em Raleigh, na Carolina do Norte, Estados Unidos, o argentino José Javier Aranda, 56 anos, firma-se como grande interlocutor e defensor desse setor em todo o mundo.

Estabelecido na Província de Salta, ao norte do País, Aranda se prepara a fim de, em nome da associação, conferir de perto a 11ª Conferência das Partes (COP-11) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco. A Gazeta acompanhará esse evento, que ocorrerá de 17 a 22 de novembro, em Genebra, na Suíça. A exato um mês do início da COP-11, a Gazeta do Sul inicia a série “O tabaco na mesa”, ouvindo a cada final de semana um representante do setor.

Aranda também esteve na Cidade do Panamá, em fevereiro de 2024, durante a COP-10. Em nenhuma edição, até o momento, a representação dos produtores foi admitida nos debates, nem qualquer outra liderança pública ou privada identificada com as regiões produtoras ou que possua relação com a indústria do tabaco. No Panamá, em entrevista à Gazeta, o presidente da ITGA se dissera incrédulo diante do fato de o Brasil, segundo maior produtor e desde 1993 o maior exportador mundial de folhas, ter tamanho protagonismo no movimento antitabagista, ou na implementação de políticas que miram restringir o cultivo.

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Nessa semana, em nova entrevista concedida à Gazeta do Sul, por telefone, Aranda avaliou as perspectivas na iminência de mais uma COP. Ele possui propriedade no município de Cerillos, a 25 quilômetros de Salta, capital da província de mesmo nome. Integra família que historicamente aposta no tabaco. “Meu bisavô plantou, meu avô plantou, meu pai também, eu e minha esposa Cecilia da mesma forma, e agora uma nova geração produz”, diz, citando os filhos José, Sol, Malena e Lucas.

Salta deve colher cerca de 35 mil toneladas na nova safra, em vias de ser transplantada. Já a Argentina pode alcançar 90 a 95 mil toneladas, com 1.650 produtores dedicados à atividade. Além de Salta, a cultura é forte nas províncias de Jujuy, Misiones, Chaco, Corrientes, Catamarca e Tucumán. Aranda lembra que a Argentina não ratificou a Convenção-Quadro e, portanto, não se pauta ou orienta por nada que é debatido em ambiente de COP.

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Por sinal, reafirma não entender como o Brasil, com o tamanho de sua produção, e na condição de maior exportador, adota discurso contra a atividade. “Como as autoridades permitem isso? Como não reconhecem a importância desse setor na geração de empregos e de renda? Os que no Brasil falam contra o tabaco deviam ser declarados pessoas não gratas por toda a sociedade. O tabaco merece todo o respeito!”, frisa.

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Comenta ainda que as ações da Convenção-Quadro e da COP na verdade têm afetado o produto legal, porque o comércio ilegal só tem crescido. Refere que o ilegal já correspondeu a cerca de 60% do mercado brasileiro, e aponta o que isso representa em evasão de impostos. “Cerca de 85% dos países que ratificaram a Convenção-Quadro e participam da COP não plantam tabaco. Como podem querer tomar decisões sobre o plantio em outras nações? Que adotem suas leis internas. Mas não venham se meter na produção.”

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E enfatiza que a demanda não tem diminuído, nem a produção. A cooperativa de Salta comercializa cerca de 23 mil toneladas por ano, volume que se mantém estável. “Ou seja, o que tem diminuído é o mercado legal, mas o ilegal ocupou esse espaço. Isso parece que o pessoal da COP prefere fazer de conta que não vê.” Na entrevista com José Aranda, as respostas foram enviadas em espanhol, e a tradução é minha.

José Aranda foi reeleito na presidência da ITGA

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Entrevista

José Javier Aranda
Presidente da Associação Internacional de Produtores de Tabaco (ITGA)

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  • Gazeta do Sul – Com que expectativa o senhor espera a COP-11? Com alento, ou com desalento? Com esperança, ou desesperança?
    José Javier Aranda – Temos muitas expectativas, já que desde quando ocorreu a COP-10 temos insistido de forma permanente para que nos recebessem, e no entanto nunca sequer recebemos uma resposta.
  • Desde a edição realizada no Panamá, o que avançou ou o que evoluiu, na avaliação do senhor, nas tratativas e nas conversas mais amplas envolvendo os produtores?
    A partir da ITGA, estamos permanentemente em conversação com todas as associações do mundo do tabaco, como, por exemplo, de toda a América, e da África e da Ásia.
  • A ITGA e suas associadas têm encontrado alguma receptividade junto à Convenção-Quadro ou à OMS para conversar sobre os temas em pauta, fora do ambiente das COPs?
    Como membros da ITGA, estamos sempre debatendo temas da Convenção-Quadro e da OMS, mas sempre fora da COP, porque nunca nos convidaram a tomar parte da mesa de debate, de modo que não vemos muita receptividade de parte desta.
  • Como o tema do tabaco e os debates da Convenção-Quadro repercutem na Argentina?
    A Argentina é um país que não firmou a Convenção-Quadro. Fizemos nossa própria Lei da Saúde, que atende a todos os postulados da convenção para o cuidado de nossa população.
  • Pela sua experiência na ITGA, como o senhor avalia a participação ou a presença do Brasil nesse contexto?
    Para nós, sendo que o país é um fundador da nossa entidade e o primeiro exportador de tabaco no mundo, é uma honra que o Brasil seja participante da ITGA. Mas o que realmente envergonha é que uma das secretárias-executivas da Convenção-Quadro, e que mais luta contra o tabaco, seja de nacionalidade brasileira [refere-se a Vera Luiza da Costa e Silva, que já chefiou o secretariado da Convenção-Quadro).
  • As decisões da COP efetivamente têm interferido no setor? De que maneira? O que mudou depois de duas décadas?
    Só muito relativamente no impacto, uma vez que o consumo segue muito alto. O que ocorre, sim, é que o fumante se sente muito discriminado de ver todas as recomendações contrárias especificadas na carteira de cigarros. Isso não acontece com outros produtos, como, por exemplo, as bebidas alcoólicas.
  • Como se encontra a produção de tabaco nesse momento no mundo? Tem havido efetivamente um recuo em volumes?
    Na temporada 2024/25 houve um incremento na área plantada, e por extensão também aumentaram os volumes tanto no Brasil quanto na Argentina e na África.
  • E os mercados para essas folhas, como o senhor os avalia? Num olhar retroativo para a última década, por exemplo, que alterações houve?
    Apesar de que ocorrem mudanças em variedades, em razão de sua adaptação a uma determinada área ou região, o tabaco se mantém bastante estável, segundo as demandas manifestadas pelos clientes mundiais.
  • Como a ITGA avalia os novos produtos para consumir tabaco? Que efeitos ou impactos eles já estão tendo ou virão a ter nesse setor?
    Ainda que tenham sido lançadas muitas alternativas de produtos para o consumidor, estamos tranquilos já que os estoques de tabaco, ao longo dos últimos anos, continuam se mantendo normais, entre produção e consumo.
  • O senhor segue atuando diretamente na produção de tabaco? O que essa cultura representa para o senhor, sua família e sua comunidade?
    É a minha principal atividade, sou a quinta geração que se dedica ao tabaco em minha família. E o tabaco é a principal atividade em uma grande comunidade, onde localidades inteiras trabalham e vivem do tabaco, e por isso sente-se o orgulho deles por serem produtores de tabaco.
  • Como qualifica os movimentos antitabagistas?
    Como qualquer lobby de outros grandes interesses, que não dimensionam a geração de empregos e de renda e a importância de nossa atividade.
  • Dos temas atualmente em debate relacionados ao tabaco, quais geram mais inquietação no senhor e por quê?
    O que mais preocupa é a perseguição da OMS à produção de tabaco, pois há outros temas muito mais sérios a tratar no que diz respeito também à saúde, como, por exemplo, o açúcar e o álcool.
  • O senhor entende que em algum momento o tabaco poderá estar mesmo ameaçado enquanto atividade?
    Não, já que somos uma indústria muito bem organizada em todo o mundo.
  • O que o senhor espera da organização da COP e dos países envolvidos, em relação ao encontro de Genebra?
    Vão fazer a próxima COP em Genebra, onde é mais difícil a presença dos agricultores, mas ainda assim vamos contar com a presença de muitos produtores de tabaco por lá.
  • A ITGA planeja ações em paralelo à COP? E por que a mobilização em simultâneo é importante, mesmo quando não há acesso aos locais do evento?
    É de nosso interesse ser parte sempre do debate que implique em nossa atividade, por isso vamos estar presentes nessa oportunidade, para fazer escutar nossa realidade na defesa dessa produção mundial.
  • Como o senhor avalia a proibição de participação dos produtores e lideranças ou autoridades que tenham contato com essa cadeia produtiva?
    Como sempre, digo que a OMS e a COP tomam decisões sobre o tema do tabaco ainda que falte o principal: nós, os produtores. Tomam decisões a portas fechadas, desconhecendo tudo o que diz respeito ao tema.

Produção está em crescimento

A produção global de tabaco está em crescimento. Essa foi a constatação da ITGA firmada na assembleia geral anual que a entidade realizou nos dias 18 a 20 de setembro, em Dortmund, na Alemanha, com representações de quatro continentes. Dados preliminares da temporada de comercialização 2024/25 indicam um aumento na maioria dos principais países que se dedicam à atividade, incluindo Brasil e África (Zimbábue, Maláui, Tanzânia e Zâmbia). Na avaliação da ITGA, os produtores foram incentivados a expandir o cultivo após vários anos de escassez global no fornecimento das folhas, em muitos casos em decorrência de interferências climáticas.

Os números levantados pela associação não incluem a China, ainda que nesse país a produção siga em forte incremento, pelas informações fornecidas. Nesse caso, as folhas destinam-se principalmente para abastecer o vasto mercado interno, que representa cerca de metade do consumo global de cigarros.

Em termos de volumes na temporada global (exceto China), a ITGA estima que devem ser colhidos cerca de 2,2 bilhões de quilos de Virgínia, com salto de 20% em relação ao ano anterior. No caso do Burley, devem ser produzidos 625 milhões de quilos, nesse caso com aumento de 34% em relação à safra anterior.

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A leitura que a associação internacional faz do momento atual é de equilíbrio no mercado. Em função desse aumento na produção, a acentuada escassez de folhas nas duas a três temporadas mais recentes estaria diminuindo. Os preços em 2025 estão estáveis ou ligeiramente mais baixos nos principais mercados produtores. Na perspectiva da ITGA, o equilíbrio total entre oferta e procura em todo o planeta só deve ser atingido em 2026.

A entidade também fez uma avaliação do ambiente regulatório. Entende que novas regulamentações de diligência e supervisão mais rigorosa da cadeia de abastecimento estão introduzindo requisitos adicionais de conformidade, o que tende a elevar os cursos de produção para os agricultores.

Entre os grandes produtores, o olhar sobre o Brasil merece sempre atenção especial, uma vez que se trata do maior exportador mundial de tabacos em folha há mais de três décadas (assumiu a liderança no ranking em 1993).

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A leitura da ITGA é de que a colheita brasileira deverá atingir níveis recordes em 2025: a produção é estimada em 648 mil toneladas de Virgínia, e outras 60 mil toneladas de Burley, configurando uma colheita total de quase 710 mil toneladas.

A constatação também foi de que os preços seguem muito competitivos para os produtores em realidade brasileira. Isso, combinado com investimentos substanciais que têm sido feitos pelas empresas do Sistema Integrado, reforça o papel do País como fonte estratégica global de tabaco em folha.

Um fator relevante nesse contexto é o papel da China enquanto compradora. Os chineses devem colher, sozinhos, cerca de 1,98 milhão de toneladas; mas buscaram no mercado externo quase 200 mil toneladas em 2024, mais do que dobrando suas aquisições em relação às 88 milhões de toneladas por eles compradas em 2020.

A ITGA avaliou que os compradores chineses costumam exigir graus específicos de folhas, mas estão entre os clientes que pagam mais caro globalmente, situando-se também entre os maiores parceiros do tabaco brasileiro.

Da lavoura para a mesa: durante atividade da ITGA

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As inquietações do setor

A assembleia anual da Associação Internacional dos Produtores de Tabaco (ITGA), nos dias 18 a 20 de setembro passado, em Dortmund, na Alemanha, ocorreu em paralelo a dois grandes eventos organizados naquela cidade, a InterTabac e a InterSupply. Lá estiveram dirigentes da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), no caso o presidente Marcilio Laurindo Drescher e o segundo tesoureiro Benício Albano Werner.

Como não poderia deixar de ser, a COP-11, a ser realizada em Genebra, esteve na pauta. Já na sessão de abertura, questões-chave para os produtores foram levantadas, a exemplo das tendências do mercado mundial, das regulamentações de produtos e necessidade de defesa baseada nas experiências vivenciadas pelos produtores. No que tange à COP, a ITGA reiterou sua preocupação diante da falta de transparência e conhecimento sobre a realidade da produção entre os delegados das nações na tomada de decisões sobre o setor, que acabam por afetar diretamente os produtores.

Quanto à regulação, segundo a ITGA, a defesa deve se iniciar pelos mais afetados, justamente os produtores. “Suas perspectivas da vida real resultam em credibilidade e provas concretas, o que proporciona aos responsáveis políticos uma imagem muito mais clara do que as estatísticas por si só”, diz Aranda. “Basear os argumentos no que ocorre no campo ajuda a garantir uma regulamentação mais equilibrada e assegura que todos os envolvidos na cadeia de produção contribuam.”

Saiba mais

Na segunda entrevista da série, no próximo final de semana, a Gazeta do Sul conversará com o presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), Marcilio Laurindo Drescher

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