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Histórias na pandemia

A rotina dos profissionais que não têm a opção de ficar em isolamento

Foto: Alencar da Rosa

Álvaro Alberto Assmann revela jamais ter visto tão pouco movimento como ao longo deste último ano de pandemia

Por:
Iuri Fardin[email protected]
Cristiano Silva[email protected]
Romar Beling[email protected]

A chegada da pandemia do coronavírus alterou drasticamente a rotina da população, tanto no âmbito social, com a proibição dos eventos e aglomerações, como no âmbito profissional, com a necessidade de grandes adequações em todos os setores da economia para respeitar os protocolos de distanciamento e higiene exigidos para prevenir a Covid-19.

Entre eles estão a redução nos horários de funcionamento de estabelecimentos ou até mesmo o fechamento por um tempo prolongado, como ocorreu em dois momentos em Santa Cruz do Sul. No entanto, alguns profissionais, por serem considerados essenciais, nunca interromperam suas atividades, e agora contam suas impressões do período e como perceberam as mudanças em suas vidas.

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O pão quentinho (quase) nunca deixou de sair do forno

Proprietário de uma padaria há 25 anos, Guido Sehnem conta que o estabelecimento passou por inúmeras mudanças ao longo dos anos, mas o desafio imposto pela pandemia é grande, tanto nas adequações necessárias para o funcionamento como na questão econômica. Mesmo na categoria de serviço essencial, o empresário foi convencido pela família a interromper as atividades no início da pandemia.

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Os dez dias em que a padaria ficou fechada foram os únicos em que o pão quentinho deixou de sair do forno. Guido conta que, além dos protocolos, uma das principais diferenças percebidas é a mudança nos hábitos dos clientes. Nos períodos em que bares e restaurantes ficaram fechados no turno da noite, muitas pessoas optaram por comprar lanches na padaria para garantir o jantar. Além disso, as vendas por telentrega e pelos canais digitais aumentaram.

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Ainda assim, a situação é complicada. “Este ano está mais difícil que o ano passado, nós notamos que o poder de compra do povo está diminuindo. As vendas antes eram 70% dinheiro e 30% cartão, e agora isso se inverteu, com muitas delas para prazo no crédito”, explica. Entre os motivos apontados pelo empresário estão a alta taxa de desemprego e o auxílio emergencial reduzido em relação a 2020.

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Outra mudança citada pelo empresário é o uso da máscara. “Se no passado alguém entrasse aqui no nosso estabelecimento de máscara, seria no mínimo estranho. Hoje se tornou uma realidade e uma necessidade. Com a idade que eu tenho já passei por muita coisa, mas isso eu nunca pensei que ia passar”, afirma.

Ele conta que no início da pandemia também percebeu que as pessoas evitavam a aproximação, por medo de contrair o vírus de alguém que trabalha com atendimento ao público, o que acabou se normalizando com o tempo. Para o futuro, Guido Sehnem espera que o avanço da vacinação auxilie a recuperação da economia brasileira e, consequentemente, seu empreendimento.

Guido e a filha Daniela são os responsáveis pela padaria e relatam as grandes mudanças percebidas conforme a pandemia avançou | Foto: Rafaelly Machado

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Necessidade fez a população valorizar os motoboys

Ainda que o tempo atuando na profissão não seja longo, cerca de dois anos, Ezequiel Loreto se descreve como um “motoboy-raiz” e afirma que, apesar das dificuldades impostas pela pandemia, tem sido um período de grande aprendizado e crescimento profissional. “Em questão de finanças, deu uma grande diferença. Eu tinha projetos para daqui mais um ano ou dois e já consegui adiantar eles.”

Esse impulso, contudo, tem um preço: a carga de trabalho ultrapassa as 12 horas diárias, todos os dias da semana, realizando entregas para diversos estabelecimentos. Ao comentar sobre as principais mudanças que percebeu em seu cotidiano, Loreto diz que a principal delas é o aumento na demanda. Quando começou, trabalhava sozinho e somente nos fins de semana; agora, trabalha diariamente e ainda conta com um ajudante. “Nós estamos entre dois, e mesmo assim tem certos dias da semana que não conseguimos vencer todas as entregas, dá muita correria”, observa.

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Ainda assim, ele garante que a rotina é gratificante. “Às vezes vem uma gorjetinha, um elogio ou outro, então isso ajuda bastante.” Segundo ele, a necessidade fez as pessoas valorizarem mais os profissionais. No entanto, nem tudo são flores na vida dos motoboys. A velocidade das entregas e a imprudência de alguns motoristas fazem com que os riscos apareçam a todo momento.

“Não sei se é por causa da pandemia, mas o pessoal anda muito desligado no trânsito. O celular virou um vício, as pessoas usam no carro e nem se preocupam se vão levar multa ou com o risco que oferecem ao próximo”, salienta. Mesmo rodando com a atenção redobrada, o perigo é constante. “Trabalhando todos os dias, de três a quatro vezes por semana eu me escapo de um acidente.”

Crise trouxe mais trabalho e também mais riscos para os profissionais de entrega | Foto: Alencar da Rosa

O calor humano que faz falta

Acostumado a receber abraços e apertos de mão nas mais diferentes ações de salvamento, o bombeiro Luis Fernando Silveira dos Santos, de 46 anos, precisou se adaptar a uma nova rotina em sua função. Profissional de educação física e pós-graduado em gestão estratégica de pessoas, trabalha no Corpo de Bombeiros Misto de Vera Cruz.

“A pandemia trouxe algumas mudanças nas nossas rotinas diárias. No quartel, realizamos trabalhos comunitários e tivemos que nos adaptar, sobretudo com o uso da máscara. Isso parece que nos afastou um pouco das pessoas, pois era costumeiro um aperto de mão, muitas vezes até um abraço, além de uma boa conversa”, relatou Luis.

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O bombeiro, que precisou fechar uma academia da qual era proprietário no Bairro Arroio Grande em julho de 2020, por causa das restrições impostas pela pandemia, também atua há alguns anos como guarda-vidas na Operação Verão. Com a Covid-19, o lema de servir e proteger precisou se adequar. “Somos treinados e orientados a sermos educados e prestativos, mas respeitando as restrições. Nossa atuação na praia não foi muito diferente. Sentimos muita falta da proximidade das pessoas, orientando quanto aos perigos que as águas das praias oferecem.”

Luis atua nos balneários da região, que são banhados por rios. O perigo faz com que a prevenção se torne necessária. “Esperamos que nossa rotina volte ao normal o mais rápido possível para que possamos estar mais próximos da comunidade.”

Luís Fernando sente falta da proximidade | Foto: Arquivo Pessoal

Afinal, a informação precisa chegar ao público o dia todo

Para que a edição deste fim de semana da Gazeta do Sul (bem como a edição de cada dia) estivesse nas mãos do leitor, duas jornadas diárias se misturaram no ambiente da Gazeta. Quando o comunicador Zenon Rosa chega ao trabalho, às 4h30, como faz questão de frisar, meia hora antes de entrar no ar com o programa matinal Show da Manhã, entre as 5 e as 7 horas, na Rádio Gazeta FM 107,9, é recebido com um “bom dia!” pelo colega Odirlei da Rosa, da Expedição da Gazeta do Sul.

Se Zenon está chegando para mais um dia na interação com os ouvintes, Odirlei está em vias de concluir mais uma jornada ao lado dos colegas da Expedição. Na verdade, naquela hora, alta madrugada, dezenas de entregadores da Gazeta seguem a mil pelas ruas do Centro e dos bairros e pelas estradas do interior e dos municípios da região.

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Para que a edição deste fim de semana da Gazeta do Sul (bem como a edição de cada dia) estivesse nas mãos do leitor, duas jornadas diárias se misturaram no ambiente da Gazeta. Quando o comunicador Zenon Rosa chega ao trabalho, às 4h30, como faz questão de frisar, meia hora antes de entrar no ar com o programa matinal Show da Manhã, entre as 5 e as 7 horas, na Rádio Gazeta FM 107,9, é recebido com um “bom dia!” pelo colega Odirlei da Rosa, da Expedição da Gazeta do Sul.

Se Zenon está chegando para mais um dia na interação com os ouvintes, Odirlei está em vias de concluir mais uma jornada ao lado dos colegas da Expedição. Na verdade, naquela hora, alta madrugada, dezenas de entregadores da Gazeta seguem a mil pelas ruas do Centro e dos bairros e pelas estradas do interior e dos municípios da região.

Odirlei e a equipe à noite acompanharam a impressão de mais uma Gazeta, o que pode ocorrer a partir das 23 horas, mas por vezes além da meia-noite (por exemplo, em dias de jogos a serem acompanhados pela equipe de Esportes em horário tardio). Tão logo o jornal sai impresso da rotativa, começa o trabalho de encarte e expedição, e lá vai o grupo dos entregadores para sua missão. Zenon e Odirlei vivenciam essa mesma rotina a cada novo dia. E foi assim igualmente ao longo do tão incomum e conturbado ano de 2020, desde que a pandemia entrou em cena.

Protocolos de segurança tiveram de ser adotados, em consonância com as regras maiores da área da Saúde. Mas Zenon precisava abrir os trabalhos no rádio, obviamente, a cada manhã, chegando com seu “Bom dia!” para os ouvintes pontualmente às 5 horas; e Odirlei precisava assegurar, com os colegas da equipe, que o assinante receberia a sua leitura diária, talvez até já sendo ansiosamente aguardada por algum madrugador de primeira.

E, assim, com a Gazeta do Sul de mais um dia em mãos, e com o rádio sintonizado na Gazeta FM 107,9, talvez tendo em mãos a cuia do chimarrão ou a xícara fumegante do café, o leitor e ouvinte fecham o círculo virtuoso da informação, da comunicação e do conhecimento. Círculo que também permite que Zenon, chegando para mais um dia, e Odirlei, que em instantes poderá ir para casa descansar, cumpram, com profissionalismo e orgulho, a sua missão. A missão da Gazeta.

Odirlei (esq.) e Zenon: um cumprimento diário às 4h30 | Foto: Zenon Rosa

Diante das dificuldades, Bel deu um golpe na pandemia

Acostumada a uma vida agitada, Maribel Mariani Moraes, ou simplesmente Bel para os conhecidos, precisou reduzir sua atuação ao longo da pandemia. Ela trabalha como decoradora de festas há nove anos, segurança de eventos há cinco e há dois administrava uma casa de festas. Nos finais de semana, chegava a decorar 15 festas, além de atuar como segurança em eventos fechados.

Com o início da pandemia, porém, assim como todos os profissionais envolvidos no setor de entretenimento, ela teve de fechar a sua casa de festas e as oportunidades como segurança cessaram. No entanto, o momento serviu para dar protagonismo a um projeto que já havia iniciado antes da pandemia, mas estava em segundo plano: ser instrutora de muay thai.

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“Aquele valor que recebia não tenho mais. Tinha também minha casa de festas, na qual faturava, e precisei fechar pelo longo período da pandemia. Então, decidi montar meu centro de treinamento feminino”, explicou a mulher, de 30 anos. “Sou graduada no muay thai e levei em conta que a cidade não tem um espaço do tipo somente para elas, aí decidi investir nessa área”, disse a instrutora do CT das Gurias.

A força de vontade em não se acomodar a fez agilizar o CT, ainda que com regramentos que interrompam as aulas em alguns momentos, além de alunas com vontade de aprender, mas com receio. “Isso era algo que eu nunca tinha visto e não imaginava que veria. Muitas pessoas têm vontade de entrar para a academia, mas não vêm por estarem com medo. As que estão treinando vieram em busca de saúde, perda de peso, aprender um pouco da defesa pessoal, por isso mantemos o trabalho, mas com todos os cuidados necessários e exigidos.”

Se o projeto foi a inovação na vida de Bel, a bandeira preta que paralisou as atividades no mês passado deixou-a um mês sem qualquer salário. “Mesmo assim, nunca pensei em desistir. Não iria deixar a peteca cair. Se tem algo que a pandemia me ensinou, que talvez eu não visse se não tivesse acontecido, é que é preciso continuar remando meu barco contra a correnteza, esperando por dias melhores. Só quero que tudo volte ao normal logo”, finalizou.

Maribel criou um centro de muay thai feminino | Foto: Arquivo Pessoal

Centro deserto em uma tarde de domingo

Em quase 50 anos atuando no ponto de táxi na esquina das ruas Marechal Floriano e Ramiro Barcelos, no coração do Centro de Santa Cruz do Sul, Álvaro Alberto Assmann, de 67 anos, revela jamais ter visto tão pouco movimento como ao longo deste último ano de pandemia. Antes, com serviço dia e noite e plantão 24 horas, precisou adaptar a rotina de trabalho e fechar o expediente por volta das 19 horas.

A falta da proximidade com os clientes também incomoda. Álvaro relembra da época em que cabines blindadas faziam parte da maioria dos táxis em Santa Cruz do Sul, em meados dos anos 1990, para evitar os assaltos aos motoristas que eram comuns na época. A estrutura dificultava a comunicação entre o taxista e os clientes. Anos mais tarde, a cobertura entrou em desuso e esse fato gerou uma proximidade maior entre os ocupantes do veículo.

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Contudo, a pandemia tratou de criar essa barreira invisível. “Muitas pessoas só sentam na parte de trás do carro. Os clientes ficaram receosos. Percebi algo que era muito difícil de imaginar: os homens passaram a sentar no banco traseiro. Ninguém mais dá a mão e nem muita conversa. Isso tudo terminou”, diz o veterano taxista. Desde os 18 anos, Assmann trabalhava com o seu pai no táxi, em momentos alternados. Desde 2007, no entanto, exerce ininterruptamente a função no local.

Ele conta um episódio do período de pandemia que não havia visto até então: uma tarde de domingo, no centro de Santa Cruz, a qual descreve como pavorosa. “Lembro que foi um domingo que trabalhei. Lá pelas 15 horas, eu olhei pra rua principal e não enxergava sequer uma pessoa. Aquele horário sempre tem gente, mas naquele dia não havia nada, não passava um carro, nem gente caminhando de um lado ou de outro da calçada”, conta.

“Parecia uma cena de filme. Dá até uma coisa ruim, pois a gente se pergunta onde está o pessoal”, diz o homem de 67 anos. No ano que vem, o ponto completa 50 anos sob o comando de sua família. Confiante, o veterano taxista espera que a pandemia dê uma trégua, e que a normalidade vivida por ele nessas quase cinco décadas à frente do volante possa logo ser percebida novamente.

Efeitos da pandemia espantam o veterano taxista | Foto: Alencar da Rosa

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