No dia em que o diretor Diego Müller ligou para falar sobre o roteiro de Porongos, seu novo filme, a cantora gaúcha Loma Berenice Gomes Pereira disse ter sentido sua respiração ficar entrecortada. Com uma carreira consolidada no Rio Grande do Sul há 50 anos, viu a oportunidade de materializar um sonho antigo: tornar-se atriz. O convite fez seu coração pulsar forte, fazendo “o peito vibrar como se fosse um tambor”.
O desejo de aparecer na telona não é recente. Faltava, no entanto, um papel interessante que despertasse a vontade da artista. Na década de 1980, durante sua passagem pelo Rio de Janeiro, Loma foi convidada por um renomado diretor a assumir o papel de uma camareira.
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Sua participação, no entanto, era rasa: transar com um turista. O papel foi recusado, com plena consciência. “Àquela época as atrizes pretas eram parte do elenco das serviçais domésticas, ou isso, salvo raras exceções, claro!”, afirma.
Em Porongos, a artista finalmente encontrou uma oportunidade de interpretar uma personagem complexa em um projeto que considerava importante. Loma dá vida a Preta Roza, uma mulher negra escravizada que se transformou em guerreira no quilombo de Manoel Padeiro, situado no Rio Grande do Sul, em 1830. Combatente armada e estrategista, foi morta em confronto em 16 de junho de 1835, vindo a se tornar um símbolo da resistência negra e feminina.
Loma descreve-a como uma mulher forte e líder parceira do dirigente do quilombo. Também a considera uma mulher determinada e muito amorosa, especialmente ao lidar com pessoas em situação de sofrimento, as quais considerava filhos.
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Na sua visão, trata-se de papel relevante, visto que as mulheres, especialmente negras, foram apagadas e esquecidas desde os primórdios da civilização. “Nós fomos muito importantes, tínhamos poder de decisão. Mas quando se iniciou o apagamento da negritude, as mulheres começaram a ser invisibilizadas”, avalia.
Apesar do entusiasmo pelo papel, a cantora questionou-se sobre como seria o trabalho. Mas a direção de Diego Müller, aliada às vestimentas da figurinista Carol Scortegagna, trouxe o apoio necessário para encarar a insegurança.
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Contribui ainda estar rodeada de um elenco e de uma equipe que diz ser incrível, todos dispostos a contribuir com a proposta do projeto. Em especial, a atriz Samira Carvalho, que a deixou encantada por sua força diante e atrás das câmeras.
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Ainda nos primeiros testes, vestiu-se e entrou de coração e alma no papel. E, assim, a sua primeira experiência no cinema tornou-se um momento marcante. “Jamais vou esquecer o que eu vivenciei”, comenta.
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Para Loma, não há dúvida de que esse filme representa um marco e entrará para a história do cinema gaúcho e brasileiro. Segundo a atriz, aqueles que contribuírem para dar sequência às filmagens e finalizar a obra serão reverenciados nacionalmente. “Trata-se de um filme muito importante. Feliz do patrocinador que se engajar no projeto, porque irá brilhar junto com a proposta do longa-metragem.”
Entrevista

Loma Berenice Gomes Pereira – atriz de Porongos
Gazeta: Qual o sentimento de atuar em um filme pela primeira vez?
Loma: Nossa, chega a dar uma tonturinha (risos) e um nó na garganta. Tenho 72 anos de idade e 52 de carreira. E ser convidada, a essa altura, para fazer algo tão importante, referente à nossa história e à história dos negros no Rio Grande do Sul, com certeza é um presente muito grande.
Fiquei muito feliz em fazer parte do projeto. E o Diego [Müller, o diretor] tem a ousadia de trazer essa história. Entendo que o filme traz a história verdadeira, embora digam que é uma ficção; é muito importante para ser apresentada ao público.
Trata-se de uma jornada bastante delicada que retrata a vida dos negros no Estado naquele momento histórico. Como foi lidar com essas emoções durante as gravações?
Fiquei muito sensibilizada. Me lembrei de várias situações. Foi algo impressionante. Era como se tivéssemos atravessado um portal e estivéssemos revivendo aquilo tudo. A criação do quilombo foi algo muito forte. Por mais sensível que fosse, achamos importante demais estar naquele lugar e mostrar para o público a realidade. A experiência de ver as filmagens em andamento, com cenas densas, foi emocionante. Preparem os seus corações, porque é um filme muito profundo. E eu tinha que cuidar muito para não me perder na Preta Roza, porque foi muito real e denso. Eu sou cantora, mas tive a oportunidade de me orgulhar e de ter orgulho de todos os atores que participaram.
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Te escutando, a expectativa só aumenta. Não vejo a hora mesmo de poder assistir ao filme. Espero que consigam terminar as filmagens o quanto antes.
Com certeza. Eu acho que é importante, neste momento em que o Brasil evidencia e dá visibilidade a grandes nomes da cultura negra e a sua história no Rio Grande do Sul e no Brasil. Percebo que os grandes talentos têm ganhado destaque na televisão, no teatro e na música, valorizando aqueles que fazem parte da nossa construção histórica enquanto seres humanos. E os irmãos Müller têm propriedade para abordar um tema tão importante como esse. O Diego é um dramaturgo responsável e muito importante para a cultura do Rio Grande do Sul. Vindo das mãos deles e pela criatividade dele, é um presente que merece ser valorizado.
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