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ROSE ROMERO

Em busca de Janete

Entre as amigas, tenho fama de grande habilidade com a internet. É uma mentira. Mas eu deixo que pensem assim e alimento a minha autoestima. De real, há o fato de que pesquiso tudo que tenha a mais remota semelhança com pergunta. Existem lençóis de malha com elástico para colchões de 45 centímetros? Tacla Duran é um nome? Consigo voar de Porto Alegre a Vitória sem fazer escala? O Grêmio pode mesmo ficar sem estádio?

Os mais íntimos, familiarizados com minha veia investigativa, não me poupam: “Rose, minha mãe quer localizar a prima Doralice. Ela foi embora em 1980 e nunca mais deu notícias”. De um modo geral, com um pouco de paciência e uma boa dose de sorte, acho tudo que procuro. Inclusive a Doralice. Até que, dias atrás, alguém me pediu para encontrar a Janete. E justificou: “Não quero morrer sem saber o que aconteceu com ela”.

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Meu interlocutor é um homem velho e doente. Tinha 18 anos quando conheceu a bela Júlia e terminou sem maiores explicações e com certa insensibilidade o namoro com Janete. Casou, foi morar fora do país, teve filhos, netos. Agora, no fim da vida, é tomado pela sensação de que fez más escolhas.

Relembra os 50 anos de infelicidade conjugal que não ousou romper, e acredita que sua história poderia ter sido diferente. “Eu só preciso saber se ela está bem, se foi feliz.” Começo a explicar que não sou detetive, sou apenas uma curiosa com um celular na mão. E que sem o sobrenome ou qualquer outra referência, não há Google que ajude. Mas aquilo me soa tão triste que desisto.

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Volto ansiosa do almoço de domingo. Na segunda-feira, vou ao local onde, segundo ele, Janete morava. A rua calma é agora movimentada. Novos prédios, revendas de automóveis, um restaurante, nada que lembre a casa descrita. Em um bar, pergunto se alguém reside nas imediações há mais de 50 anos. O rapaz que me atende tem dificuldade para decodificar minha mensagem. Chama o dono, que também não faz ideia. Vou ficando cansada.

Enquanto caminho, percebo que daqui a alguns anos posso estar no lugar daquele homem idoso. Consciente da proximidade da morte e arrependida por coisas que fiz e por outras que não fiz. Talvez sentir isso enquanto há tempo para reparações evite um final tão melancólico. Para mim, para você. Para o meu amigo, parece que sobrou apenas a resignação. Penso que, no fundo, nem é bom achar a Janete.
Entro no carro e vou embora.

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