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PELO MUNDO

Em busca de um futuro: 150 anos de imigração italiana

O lugar e as pessoas davam a impressão de serem outros. Naquele momento, todas as vaidades, todos os fingimentos, caíam por terra, e vinha à tona o animal aterrorizado em toda sua nudez, dominado pelo furioso amor à vida… revelando faces inéditas da sua própria alma.”

O trecho acima é parte do relato de um jornalista italiano, Edmondo de Amicis, sobre a situação a bordo de um navio de imigrantes durante uma feroz tempestade sobre o Atlântico, no final do século 19. A viagem transcontinental não era apenas física, mas especialmente mental e subjetiva. Durante o trajeto, os passageiros passavam a entender a dimensão do passo que deram. Vários momentos eram emblemáticos naquela jornada de 3 a 4 semanas. Cruzar a linha do Equador representava o ponto de não retorno, a passagem definitiva para outro mundo. Ainda que a vontade de chegar fosse enorme, ela trazia consigo uma ansiedade atroz. O abandono da terra natal é sempre marcado pela dor e pela saudade, equilibrados pela vontade de ser protagonista da própria história.

A partir do porto de Gênova, o grupo em isolamento marítimo se transformava em um microcosmo. Relacionamentos nasciam, amadureciam e se perdiam rapidamente. A certeza da eterna separação dos demais viajantes no final da travessia provocava confidências e fazia florescer muita sinceridade para muitos, assim como arrogância e esperteza para alguns. Edmondo relatou as condições da viagem: “O odor que vinha dos dormitórios masculinos era de dar pena, considerando que provinha de seres humanos.” Seu livro Em alto-mar (Sull’Oceano, 1892), proporciona uma descrição clara e crua do ambiente nos vapores que cruzavam o Atlântico.

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A Europa sofria uma grave crise econômica. O povo passava fome e buscava desesperadamente uma alternativa de vida com menos sofrimento. O sonho da América passou a povoar as mentes dos europeus em busca de dignidade para suas famílias. A Itália sofreu o que se poderia chamar de hemorragia humana no final do século 19, com centenas de milhares tomando os vapores para a América. Em 1888, já havia 1,5 milhão de italianos no Novo Mundo.

A chegada e a adaptação à nova realidade não foram menos dramáticas. Os imigrantes que não permaneciam no centro do país eram direcionados para o sul do Brasil imperial, em uma decisão que mudou o destino da região. A intenção de Dom Pedro II era amenizar a falta de mão de obra causada pelo crepúsculo tardio da escravidão africana no país. Infelizmente, o governo não dava a mesma oportunidade aos africanos recém-libertados.

No interior do Rio Grande do Sul, os europeus encontravam uma região desprovida de infraestrutura, compravam um pedaço de terra a preço razoável e recebiam algumas ferramentas. Criatividade, persistência e trabalho árduo passaram a ser as regras de sobrevivência. Como motivação adicional, havia também um certo rancor em relação ao país de origem, que acabara de ser unificado e que os havia, de certa forma, negligenciado. Ainda assim, as remessas dos imigrantes para as famílias que ficaram na Europa tiveram papel crucial na construção da incipiente Itália. As reservas de ouro italianas, por exemplo, triplicaram entre 1896 e 1912.

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Conhecemos pouco sobre nossos antepassados. Eram pais e mães se submetendo a sacrifícios presentes por uma vida melhor aos descendentes no futuro. Não podemos definir exatamente suas características físicas ou descrever suas personalidades. O que sabemos é que eram pessoas especiais. Eles atravessaram o oceano em uma viagem sem volta, e trouxeram com eles cada um de nós, seus descendentes, ao novo mundo.

Nós não nos criamos somente no sul da América do Sul. Os netos e bisnetos desses italianos não moram somente no então longínquo Rio Grande do Sul. O barro que nos formou é de uma família de imigrantes. É o barro de lugarejos às margens do Rio Pó. O ar que respiramos é o ar gelado da Lombardia, com cheiro de vinho fresco e de queijos maturados.

Nossos bravos antepassados trouxeram consigo o velho mundo e o depositaram na serra, no planalto e na região central do Rio Grande do Sul. As difíceis milhas náuticas que percorreram são traçadas também por nós. Todos os dias, vivemos aquela travessia de amor incondicional e esperança.

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