Rádios ao vivo

Leia a Gazeta Digital

Publicidade

EM ANDAMENTO

Estudo de vacina contra a aids é o mais promissor em 40 anos

Foto: Agência Brasil

O desenvolvimento em tempo recorde de várias vacinas contra a Covid-19 parece ter dado o impulso que faltava para a criação de um imunizante contra o HIV. Quarenta anos depois do início da pandemia de aids, o mundo parece estar perto de ter um produto eficaz na prevenção da infecção. Um estudo com mais de seis mil pessoas está sendo conduzido em vários países da África, Europa, América do Norte e América Latina, inclusive no Brasil. Para especialistas, é o mais promissor em quatro décadas.

O estudo está dividido em duas frentes. A primeira delas, na África Subsaariana, testa 2.637 mulheres heterossexuais. Uma segunda, chamada de Mosaico, conduzida na Europa, na América do Norte e na América Latina, está testando 3.600 voluntários, entre homens homossexuais e pessoas trans. No Brasil, o estudo ocorre em oito centros de pesquisa em São Paulo, no Rio, em Minas e no Paraná.

A pesquisa está na fase 3, que testa a eficácia em larga escala. As fases 1 e 2, com menos voluntários, determinam a segurança do produto e a dose apropriada. Numa fase anterior, em macacos, o imunizante apresentou uma proteção de 67% contra a infecção. É por conta deste número que os cientistas estão otimistas. Até hoje, o candidato a vacina contra a aids mais eficaz já testado no mundo apresentava proteção de 30% – e sua pesquisa foi deixada de lado.

Publicidade

“Nas fases 1 e 2, a vacina se mostrou muito segura. Os efeitos colaterais são parecidos aos da AstraZeneca contra a Covid: dor local, febre por um dia, dor de cabeça”, afirma o infectologista Ricardo Vasconcelos, coordenador da fase 3 no Hospital das Clínicas, em São Paulo. “A imunogenicidade do produto, ou seja, o quanto ele conseguiu induzir uma resposta imune, foi considerada muito satisfatória. Resta saber se essa resposta é capaz de reduzir a incidência da infecção.”

A vacina está sendo aplicada em pessoas soronegativas que tenham o risco aumentado de exposição à infecção. Os voluntários serão acompanhados por 30 meses. Metade receberá placebo e a outra metade, o imunizante. Cada um tomará quatro doses, com intervalos de três meses entre cada uma.

LEIA MAIS: Vacina contra HIV será testada no Brasil

Publicidade

Mutações

A grande capacidade de mutação do vírus HIV – muito superior à do Sars-CoV-2 – sempre foi o maior obstáculo para a criação de uma vacina eficaz. A tecnologia usada no novo imunizante é similar à da AstraZeneca desenvolvida contra a Covid-19. Um adenovírus inativado é usado como um “cavalo de Troia” para levar fragmentos genéticos do HIV para dentro da pessoa a ser imunizada, “treinando” o seu sistema imunológico a combater o vírus real. A diferença é que, neste novo produto, estão sendo usados milhares de fragmentos genéticos. “São muitos tipos diferentes de vírus circulando pelo mundo, a ideia é conseguir cobrir o maior número possível de variantes”, explica Vasconcelos. “(Essa pesquisa) se chama Mosaico porque reúne milhares de fragmentos de HIV.”

Mas, afinal, por que várias vacinas contra a Covid foram desenvolvidas em menos de um ano e ainda não se chegou a um imunizante contra o HIV? “A principal resposta é que são vírus diferentes. Não é porque chegamos rápido a uma vacina contra o coronavírus que poderemos chegar na mesma velocidade a um imunizante contra outro vírus”, pondera Vasconcelos. “Muitas pessoas pegaram Covid e se curaram. Ninguém se curou da infecção pelo HIV. Ou seja, de partida, sabemos que é possível curar a Covid. A resposta imune contra o HIV é muito menos eficaz.”

Por outro lado, a vacina da AstraZeneca contra a Covid-19 pode ser desenvolvida em menos de um ano porque a plataforma do adenovírus já tinha sido desenvolvida na Universidade de Harvard, em 2015. Sem falar, é claro, do interesse político e do alto investimento financeiro. Agora, as plataformas de RNA mensageiro inéditas, criadas para a Covid, podem facilitar, num futuro próximo, o surgimento de mais candidatos a imunizante contra a Aids.

Publicidade

“Foram 40 anos de evolução nas pesquisas, houve várias tentativas, pelo menos seis estudos muito grandes”, diz o infectologista Bernardo Porto Maia, coordenador da pesquisa Mosaico no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo. “Mas o HIV é um vírus com uma capacidade de mutação muito grande A diversidade genética inviabilizava a criação de uma vacina, sobretudo com as tecnologias antigas que tínhamos.”

Atualmente, 38 milhões de pessoas vivem com HIV no planeta, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Até hoje, pelo menos 33 milhões de pessoas morreram vítimas da infecção. Com a evolução nas técnicas de prevenção e nos tratamentos, a mortalidade caiu de 1,7 milhão em 2004, no pico da epidemia, para 690 mil em 2019 – uma redução de 60%. A taxa de infecção também caiu. De 2,8 milhões de novas infecções ao ano em 1998 para 1,7 milhão em 2019, queda de 40%.

“Os avanços mais recentes, como a profilaxia pós-exposição, estão mudando o rumo da epidemia. A situação melhorou, mas é inaceitável termos quase 700 mil mortes ao ano por uma doença que sabemos como prevenir e como tratar”, afirma Maia. “Nada melhor que a imunização em massa para combater uma pandemia.”

Publicidade

LEIA TAMBÉM: Números da aids na região são preocupantes, diz coordenadora do Cemas

Confiança

Ativista do coletivo Colid, em prol da diversidade, o pesquisador de Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio de Janeiro Thauan Carvalho, de 26 anos, é um dos voluntários brasileiros do estudo Mosaico, que testa o mais novo e promissor imunizante contra o HIV já desenvolvido em 40 anos de pandemia. A fase 3 da pesquisa tem a participação de 3.600 voluntários em oito países da Europa, da América do Norte e da América Latina, incluindo o Brasil.

Carvalho tomou no dia 2 de junho a primeira dose do imunizante – no total, são indicadas quatro para a vacina. A próxima está prevista para agosto. O cientista já teve um relacionamento sorodiscordante (em que uma pessoa é soropositiva e outra é soronegativa) e sabe o quanto a aids é cercada de estigma e preconceito. Ele acredita que seu gesto pode ajudar a reduzir esses danos. “Para combater o preconceito, precisamos de conhecimento”, diz o pesquisador, que está concluindo um doutorado. “Vivemos em meio a um negacionismo muito forte, um obscurantismo muito grande. Me senti muito feliz de poder ajudar.”

Publicidade

Em macacos, o novo imunizante conseguiu reduzir a infecção em 67% dos casos, um marco na pesquisa da vacina contra a aids. “Estou muito confiante de que teremos boas notícias vindas da ciência”, diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

LEIA TAMBÉM: Pessoas com HIV são incluídas nos grupos prioritários para vacinação

Aviso de cookies

Nós utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdos de seu interesse. Para saber mais, consulte a nossa Política de Privacidade.