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LUIS FERNANDO FERREIRA

Kundera e a imortalidade

Não era minha intenção escrever sobre Milan Kundera. Muito menos na semana em que ele faleceu, aos 94 anos, como se apenas a morte definisse o valor real de artistas e obras. Não basta estar vivo? Mas as fotos de Kundera agora estão nas mídias e redes sociais, vistas por muitas pessoas que nem sabem quem foi o escritor tcheco. Falemos dele, então.

A insustentável leveza do ser foi um dos livros de ficção mais vendidos da década de 1980, com direito a adaptação para o cinema. Trouxe fama internacional para Milan Kundera, mas sua carreira havia começado muito antes. Foi em 1967 que publicou o romance de estreia, A brincadeira. A obra retrata a Tchecoslováquia na qual o autor cresceu, sob domínio do regime comunista ligado à União Soviética. Um ambiente totalitário, de cerceamento das liberdades e repressão política.

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Ludvik, o protagonista de A brincadeira, é um estudante expulso do Partido Comunista por ter feito uma piada. Para uma amiga, ele envia um cartão em que debocha dos heróis da Revolução. É um chiste, pura irreverência juvenil, mas lhe rende uma condenação a anos de trabalhos forçados. O Partido não tem senso de humor.

O enredo é ficcional, mas também Kundera teria divergências sérias com as autoridades. Considerado inimigo pelo governo, adotou nacionalidade francesa em 1981 e só recuperou a cidadania tcheca em 2019. Tinha uma índole libertária que não cabia nos limites da União Soviética, com suas obsessões de planejamento e controle social. De modo geral, sua literatura retrata a luta do indivíduo contra sistemas que tentam esmagá-lo.

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Mas esse combate, para ele, não é solitário; os companheiros de jornada são fundamentais. No livro A imortalidade, Milan Kundera enaltece a amizade, “indispensável ao homem para o bom desenvolvimento de sua memória”. “Para que o eu não se encolha, para que guarde seu volume, é preciso regar as lembranças como flores num vaso, e essa rega exige um contato regular com as testemunhas do passado, ou seja, com os amigos. Eles são nosso espelho; nossa memória; não exigimos nada deles, a não ser que de vez em quando lustrem esse espelho para que possamos nos ver nele.”

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