A cadeia produtiva do tabaco não costuma encontrar muitos defensores entre os eleitos para a Assembleia Legislativa e para a Câmara dos Deputados. Há os que atuam fortemente na ideia de que essa atividade deve ser substituída por outras alternativas, como alimentos, sem dizer como as pequenas propriedades, que caracterizam o Rio Grande do Sul, iriam garantir a sobrevivência das famílias.
A Gazeta do Sul, em continuidade à série O tabaco na mesa, ouvirá deputados que conhecem o desempenho econômico e social desse setor, avaliando seus posicionamentos e as expectativas em relação à 11ª Conferência das Partes (COP-11) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco. O evento ocorrerá entre os dias 17 e 22 de novembro, em Genebra,
na Suíça.
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O primeiro entrevistado é o santa-cruzense Heitor Schuch (PSB). Integrante do Parlamento do Mercosul (Parlasul), ele tenta acompanhar os encontros, mas vive a dificuldade enfrentada por todos que falam em nome dos produtores: são impedidos de acessar o ambiente dos debates. O legislador reforça a necessidade de que o governo brasileiro tenha posicionamento definido, que encontre um meio-termo entre os interesses dos ministérios da Saúde, da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário e até o da Fazenda.

A abertura do diálogo dentro do próprio governo é considerada fundamental por Schuch, que não vê com bons olhos o fato de que o Congresso Nacional não tenha indicado oficialmente uma representação para acompanhar o evento. Assim, fez o encaminhamento para acompanhar a COP-11 via Parlasul, mesmo esse não sendo um assunto que paute os debates do parlamento multinacional.
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Diferentemente do Brasil, que é um dos maiores produtores e maior exportador de tabaco há mais de 30 anos, Argentina e Uruguai têm produções menores, o Paraguai vive com o incômodo da informalidade e a Bolívia não cultiva tabaco. Cabe, portanto, aos brasileiros defenderem os interesses do setor, que é base econômica em várias regiões.
“O governo está dividido”
- Gazeta do Sul – O senhor tem ido à Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco, mas nem sempre com boa receptividade. Já teve algum retorno se será possível acessar o evento?
Heitor Schuch – Ainda não tive nenhum retorno sobre a possibilidade de acessar o evento. A verdade é que a Câmara dos Deputados nem sequer indicou oficialmente um representante, o que já demonstra certa exclusão. Solicitei a participação pelo Parlamento do Mercosul (Parlasul), mas a Organização Mundial da Saúde é muito fechada e quer fazer um evento apenas com quem é da área da saúde, esquecendo que há setores inteiros — como produtores, transportadores e trabalhadores da indústria — que dependem diretamente dessa cadeia e nunca tiveram espaço para falar ou sequer ouvir o que está sendo decidido. Historicamente, a COP tem negado a participação de quem representa os agricultores produtores de tabaco, que são os maiores interessados no que se constrói nesses encontros, numa total falta de consideração e respeito com o setor. Neste ano, participarei indicado pelo Parlamento do Mercosul (Parlasul), e mais uma vez vou lutar para garantir presença no evento. - O governo federal tem se mostrado mais sensível em relação aos interesses dos produtores?
Na verdade, o governo está dividido sobre esse tema. O Ministério da Saúde tem uma posição muito restritiva, enquanto outros ministérios — como o da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário, da Indústria e Comércio e até o da Fazenda — têm uma visão diferente, mais voltada à regulação e à geração de renda. Esses últimos defendem inclusive discutir a regulamentação dos dispositivos eletrônicos de fumar (DEFs) e dos vapes, o que a Saúde simplesmente rejeita. É mais fácil ser contra do que construir soluções equilibradas. Existem posições divergentes dentro do governo. Os ministérios ligados aos setores econômico e agrícola têm uma posição em favor dos produtores e do setor produtivo como um todo, entendendo inclusive que determinados dispositivos amplamente utilizados possam ser debatidos visando à sua regulamentação. Já o Ministério da Saúde, por meio da Conicq, tem uma postura radicalmente contrária. Ele defende a erradicação do consumo de cigarros e derivados no Brasil, o que afeta diretamente os produtores de tabaco, que representamos. - De que forma o Brasil deve se posicionar neste ano?
Se depender da Saúde, já sabemos qual será a postura: mais restrições. Mas o Brasil precisa ter equilíbrio e defender toda a cadeia produtiva — produtores, indústria, comércio e trabalhadores —, além de cuidar da arrecadação, da exportação e da qualidade do produto. Também é essencial combater o contrabando, que cresce a cada ano e coloca no mercado produtos sem origem, sem geração de emprego e sem controle sanitário, prejudicando o País como um todo. Estamos em diálogo permanente com os Ministérios da Agricultura, da Indústria e Comércio e do Desenvolvimento Agrário para que o Brasil tenha equilíbrio no debate e não se deixe dominar pela pauta do Ministério da Saúde. É fundamental que o País endureça o combate ao contrabando e defenda a cadeia produtiva do tabaco com responsabilidade e bom senso. - Qual o poder das decisões tomadas na COP?
A COP tem o poder de aprovar resoluções e sugerir que os países façam sua implementação, especialmente no combate ao consumo do cigarro. No caso do Brasil, houve avanços significativos – como o fim da propaganda, a proibição do consumo em lugares fechados, mudanças nas embalagens e alta tributação – que reduziram drasticamente o consumo. Entretanto, para o setor produtivo, especialmente os plantadores de tabaco, nunca foram apresentadas alternativas concretas de produção, como se prometia nas primeiras COPs. Cabe ressaltar que cada país é responsável por sua legislação, e nós, no Parlamento, temos o dever de fazer a defesa intransigente dos produtores e de toda a cadeia produtiva. - O atual governo restabeleceu a Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Conicq). Qual a sua opinião sobre isso?
O governo brasileiro precisa agir com muita responsabilidade. Somos um dos maiores produtores e exportadores de tabaco do mundo, e isso gera emprego, renda, tributos e desenvolvimento regional. Restabelecer a Conicq só faz sentido se ela incluir todos os elos da cadeia produtiva no debate — e não apenas um lado. O País precisa defender sua produção legal e combater com firmeza o contrabando, que rouba mercado e empregos e coloca em risco a saúde do consumidor. - Há quem diga que a posição de outros países na COP é mais econômica do que de saúde. O que o senhor pensa sobre isso?
Cada país tem sua própria realidade. Os que produzem e exportam tabaco olham o tema por um viés mais econômico, enquanto os que apenas consomem focam mais na saúde. No caso do Brasil, a preocupação deve ser com toda a cadeia produtiva. O governo controla a produção e a indústria, sabe o quanto se fabrica e se arrecada. Já o contrabando foge de qualquer controle e é o verdadeiro problema. Portanto, não adianta olhar o que fazem Argentina ou México — precisamos resolver o nosso. - O senhor faz parte do Parlasul. Como, nesse espaço democrático, os outros países manifestam-se em relação à produção de tabaco?
Esse não é um tema tratado no Parlasul. O Uruguai praticamente não tem produção; a Argentina tem um pouco, na região de Misiones; o Paraguai tem uma indústria informal muito grande; e a Bolívia, que eu saiba, nem produz tabaco. Dentro das comissões e no plenário do Parlasul, nunca houve manifestação relevante sobre a produção ou o consumo de tabaco.
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