Em 1994, eu trabalhava em uma empresa de engenharia ambiental na Alemanha e um de meus primeiros projetos foi o da planta de tratamento de efluentes do aeroporto de Sofia, a capital da Bulgária. Logo após a queda da cortina de ferro, aquele período ficou marcado por iniciativas de modernização em todo o leste europeu e eu me admirava com o entusiasmo dos clientes búlgaros.
Paralelamente, nos Estados Unidos, estava em andamento a Copa do Mundo de futebol e a Alemanha encontrou a Bulgária nas quartas de final. Faltando 15 minutos para encerrar a partida, os alemães venciam por 1 x 0 e a classificação para a semifinal contra a Itália parecia garantida. Meus colegas teutônicos davam a partida como ganha, e havia até um certo desprezo pelos adversários, um pequeno país com pouco mais de 6 milhões de habitantes.
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A região dos Bálcãs que compreende a atual Bulgária era habitada pelos povos trácios já na Idade do Bronze. Durante a invasão romana, um dos trácios capturados pelas tropas de César, o gladiador Espártaco (109-71 a.C.), se tornaria o líder e estrategista da mais famosa revolta de escravizados contra Roma. Os mais de 40 mil revoltosos obtiveram vitórias significativas, até serem massacrados pelas legiões do general romano Marcus Crassus (115-62 a.C.), que mandou crucificar os cerca de seis mil escravos sobreviventes ao longo da Via Apia.
Após a queda do Império Romano do Ocidente (476 d.C.), toda a região da Bulgária se tornou vassala do Império Romano Oriental. Enquanto isso, nos séculos 5 e 6, eslavos foram gradualmente migrando para o território. O nome do país, contudo, vem de uma tribo turca, os Bulgars, que com o tempo adotaram a língua eslava. Apesar das constantes batalhas com os bizantinos, o cristianismo foi finalmente adotado no século 9 por Boris I, imperador do Primeiro Império Búlgaro.

No mesmo período, a nação floresceu econômica e culturalmente. Os búlgaros foram os inventores do alfabeto cirílico, derivado do antigo alfabeto grego, que foi adotado posteriormente do leste europeu até a Mongólia. O nome do alfabeto foi homenagem dos criadores, seguidores de São Cirilo de Alexandria. É o padrão na escrita de mais de 250 milhões de pessoas em 12 países.
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Após a queda de Constantinopla, cinco séculos de ocupação otomana não foram suficientes para abalar a cultura eslava dos búlgaros. A religião ortodoxa e as raízes culturais aproximaram a Bulgária da Rússia, união que se mostrou essencial no combate aos turcos.
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O país se associou à Alemanha nas duas grandes guerras do século 20 e, na divisão do espólio entre os aliados vencedores, integrou-se ao bloco soviético, sob a batuta de Todor Zhivkov (1911-1998), ditador que comandou o país de 1954 a 1989. Finalmente, em 1991, a Bulgária se tornou um estado democrático e independente. A admissão na União Europeia se deu em 2007.
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Ao pisar na Bulgária, logo percebi característica marcante e curiosa dos nativos. Os búlgaros movimentam a cabeça de cima para baixo para dizer não, e lateralmente para dizer sim. Leva-se algum tempo para se acostumar com a prática, oposta à qual estamos habituados.
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A capital Sofia é uma das cidades mais antigas da Europa, com arquitetura que mistura o antigo e o novo de forma harmônica. O interior do país é rico em montanhas, ruínas trácias, romanas e otomanas, mais de 4 mil cavernas naturais, o belíssimo vale do Rio Danúbio e a ensolarada costa do Mar Negro. Ou seja, há opções para todos os gostos, com a vantagem do baixo custo de hotéis e restaurantes. A culinária, aliás, é muito saborosa, com temperos bizantinos, otomanos e eslavos.
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De volta ao jogo de 1994, meus colegas alemães não contavam com o poder de reação da eficiente esquadra búlgara, e em especial de seus dois maiores craques. Em três minutos, o centroavante Hristo Stoichkov marcou gol de falta e o calvo Yordan Letchkov carimbou a vitória com cabeçada certeira, mandando a Alemanha para casa e colocando a Bulgária nas semifinais da copa pela primeira vez na história.
Aquela é considerada uma das partidas mais marcantes da história dos mundiais e a incrível demonstração de resistência búlgara foi talvez minha primeira motivação para explorar mais sobre o povo e sobre a história desse país relativamente desconhecido dos Bálcãs.
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