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Romancista e tradutora, Julia Dantas participa de bate-papo na Feira do Livro

Um dos principais nomes da literatura gaúcha contemporânea, com obra que se projeta no País e no exterior, a romancista e tradutora Julia Dantas é atração do primeiro final de semana da 35ª Feira do Livro e da 1ª Festa Literária Internacional de Santa Cruz do Sul. Neste sábado, 2, a partir das 16 horas, ela participa de bate-papo centrado em sua trajetória e em sua obra, no palco principal, na Praça Getúlio Vargas.

Porto-alegrense, aos 40 anos, Julia é formada em Jornalismo pela Ufrgs, e ainda estudou crítica de arte em Buenos Aires e doutorou-se em Escrita Criativa na PUCRS. Depois de um périplo por países da América Latina (Argentina, Peru, Equador, Colômbia), estreou como romancista com o livro Ruína y leveza, em 2015, que teve boa acolhida de leitores e crítica. A história é ambientada justamente em alguns desses espaços da América do Sul que ela conhecera.

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Seu romance seguinte, Ela se chama Rodolfo, de 2022, recebeu os prêmios da Associação Gaúcha de Escritores (Ages) e da Academia Rio-grandense de Letras. Por fim, lançou uma terceira narrativa longa em 2024, A mulher de dois esqueletos. Em comum, nas três obras, enredos que se passam também em sua cidade natal. Na iminência de sua vinda a Santa Cruz, cidade que diz ainda não ter visitado até o momento, Julia concedeu entrevista à Gazeta do Sul para falar de temas relacionados a sua literatura.

ENTREVISTA – Julia Dantas/Escritora e tradutora

  • Gazeta Em Ruína y leveza, teu romance de estreia, Sara, a protagonista, viaja pela América do Sul, até o Peru e à Bolívia. Como foi o processo de elaboração desse livro e que viagens tu própria fizestes em imersão na realidade latino-americana? A personagem Sara vem de uma junção de traços e personalidades que me pareciam característicos de uma certa geração em uma certa época, enquanto os cenários que ela percorre são todos lugares com que eu criei intimidade. Eu morei um ano em Buenos Aires (onde surgiu o personagem Lucho) e morei um ano em Cusco (onde se passa importante parte da história), então tem muito da minha visão pessoal na construção do espaço e na percepção da cultura originária andina. Eu imaginei que estava escrevendo sobre o choque cultural entre a personagem única Sara e os peruanos, mas, para minha surpresa e para sorte do livro, tanto gerações mais velhas quanto mais novas encontram pontos de identificação com a Sara. O livro ganhou mais camadas de interpretação e muito mais leitores do que eu podia imaginar.
  • A literatura da América Latina ocupa lugar de destaque em tuas atenções? De que mais gostas nessa região ou quem em especial lês e admiras? Sim, desde o começo da minha vida adulta li muitos autores dos nossos países vizinhos, como Julio Cortázar, Jorge Luis Borges, Gabriel García-Marquez, Isabel Allende. Admiro-os profundamente até hoje, pois são vozes narrativas muito inventivas e autênticas em seus modos de lidar com a linguagem e as vivências de países colonizados. Ultimamente tenho lido autoras contemporâneas, como Giovanna Rivero, Mariana Enriquez, Mónica Ojeda, Samanta Schweblin: elas também alcançam um elevado grau de originalidade e conseguem repensar a identidade latino-americana em tantas de suas nuances.
  • A paisagem urbana de Porto Alegre está muito presente em teus romances. É uma espécie de cartografia afetiva que fazes? Como estabeleces tua relação de artista com tua cidade natal? Acredito que minha literatura conta muito com o uso do espaço, e o espaço urbano que eu mais conheço é a cidade onde nasci e cresci. Me interessam os modos de interação com a cidade e com os outros dentro dela: como nossa vida é afetada e transformada pelas pessoas que estão ao nosso redor, que encontramos ao acaso na rua, pelas pessoas com quem somos obrigados a conviver mesmo quando não queremos? Em resumo, me interessa pensar na cidade como esse aglomerado de pessoas que precisam fazer um considerável esforço para todos os dias lidar com atritos, com os incômodos de dividir um espaço, mas também encontram nisso a oportunidade de se conectar com o desconhecido e ampliar seus mundos. Também me interessam muito os deslocamentos geográficos, sobretudo como metáfora para os deslocamentos subjetivos que experimentamos quando nos permitimos correr o risco de mudar de lugar.
  • A tartaruga em Ela se chama Rodolfo alça-se a condição de quase protagonista. Como é tua relação com a natureza? E tens pets? Me parece que, exceto por Rodolfo, meus livros nunca foram especialmente conectados à natureza, exceto quando ela emerge assim, em lugares inusitados. Claro que hoje em dia estamos todos devidamente preocupados com o colapso climático e o esgotamento da natureza pela ganância humana. No entanto, para mim o contato com a natureza sempre se deu em momentos de pausa: é o momento de descanso e de afastamento da vida comum rotineira. Hoje, frequento muito um grande parque perto de casa para passear com a minha cachorrinha, então esse se tornou um movimento diário que me permite observar os ritmos naturais com mais cuidado. Já sei acompanhar as florações das árvores a cada época do ano, a chegada e a reprodução dos pássaros, a mudança na paisagem com o frio, uma atenção que nem sempre pude ou consegui dedicar à natureza antes.
  • Teu romance A mulher de dois esqueletos lida com dilema do universo feminino, a questão da maternidade e da dedicação a uma carreira. De que maneira isso condiciona o que se compreende como livre-arbítrio para a mulher? Felizmente, hoje em dia as mulheres (ou pelo menos parte delas) têm muito mais liberdade para pensar na maternidade como uma questão de escolha, o que já é revolucionário. Poucos anos atrás, a maternidade era o caminho óbvio para qualquer mulher, uma obrigação que se vendia como “natural”. O fato de que hoje podemos viver a maternidade como um dilema é uma conquista das feministas, que historicamente colocam em xeque qualquer noção de obrigatoriedade na vida das mulheres. Quanto ao livre-arbítrio, das mulheres e dos homens, ele é sempre limitado pelas circunstâncias: hoje uma mulher pode escolher não ter filhos, mas, caso ela engravide contra sua vontade, é obrigada pelo estado a ter um filho indesejado. Uma mulher também pode escolher ter filhos, mas talvez ela não tenha a possibilidade de criá-los por passar horas demais no trabalho. Ou seja, nós nunca gozamos de liberdade plena, mas pelo menos temos mais liberdade para pensar sobre isso.
  • És também tradutora. O que te levou a essa área e, nela, de que autores e obras mais tens te ocupado? A tradução entrou na minha vida como um trabalho possível de ser realizado de qualquer lugar do mundo, e comecei traduzindo legendas de filmes e textos técnicos. Aos poucos pude me aproximar da tradução literária, um ofício que enriquece muito o trabalho de qualquer escritora, pois nos deparamos com a necessidade de lidar com muita profundidade e intimidade com o texto de outra pessoas. Cada desafio de tradução traz uma pergunta sobre o processo criativo do autor do texto, e explorar o processo criativo alheio é um método de investigar o seu próprio.

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