É fato que Santa Cruz do Sul é uma referência no setor audiovisual no interior do Rio Grande do Sul. Em 2024, foi eleita a melhor cidade para filmagens do Estado durante o 52o Festival de Cinema de Gramado. Além disso, as produções locais se destacam em competições cinematográficas pelo País, levando o nome do município para todos os lugares.
Contudo, antes de ser relevante na sétima arte, Santa Cruz ganhou os holofotes por preservar o legado dos imigrantes alemães. Não só pela Festa da Alegria, que atrai visitantes de todo o Brasil para curtir a Oktoberfest, mas pelas entidades que mantêm viva a tradição dos antepassados.
Agora, prepara-se para receber uma nova produção cinematográfica voltada à cultura germânica. Desta vez, será internacional. Nos dias 6 a 9 de outubro, uma equipe da Alemanha estará na cidade para as gravações de Dehäm – Pälzer in de Pama, documentário com toques fictícios que abordará, com bom humor, a história dos descendentes de imigrantes no Rio Grande do Sul.
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Produzida pelo cineasta alemão Benjamin Wagener, a obra irá percorrer diversos municípios gaúchos, especialmente nos vales do Caí, Taquari , Rio Pardo e Sinos. A primeira cidade visitada pela produção foi Porto Alegre. De lá seguiram para Dois Irmãos, onde ocorreram as primeiras etapas. A presença da produção em Santa Cruz não é por acaso. Antes de as câmeras começarem a rodar, uma mobilização foi feita para a equipe conhecer o município.
Cineasta alemão esteve em santa cruz para conhecer os descendentes de imigrantes
O cineasta Benjamin Wagener e o colega Theo Pfleger estiveram em Santa Cruz no dia 25 de setembro. Acompanhados do advogado e professor Rafael Gessinger, coordenador estadual do Bicentenário da Imigração Alemã no Rio Grande do Sul, foram recepcionados por Paulo Trinks, Nasário Bohnen e outros integrantes da comissão dos festejos locais.
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Para conhecer e entender a história dos imigrantes alemães no município, apresentaram aos visitantes o interior de Rio Pardinho e Monte Alverne. Conversaram e trocaram experiências com famílias que preservam as tradições dos seus antepassados. “Eles queriam ver como era a situação dos descendentes dos imigrantes e saber se ainda falavam alemão e mantinham a história da imigração”, explica Trinks.
Os santa-cruzenses evidenciaram o quanto a cultura alemã continua viva. No Colégio Monte Alverne, o cineasta descobriu que há alunos que falam o dialeto germânico. Isso lhe permitiu bater um papo com os jovens e contar um pouco da sua trajetória no cinema. Foram recepcionados ainda pela banda marcial, com músicas germânicas.
Para uma imersão completa, visitaram o Monumento ao Imigrante e o Museu do Colégio Mauá. Os alemães ainda degustaram a gastronomia local em diferentes estabelecimentos (com direito a um café colonial), demonstrando o quanto as receitas e os costumes germânicos fazem parte da comunidade santa-cruzense.
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Para o secretário municipal de Cultura e Economia Criativa, Douglas Albers, a presença dos cineastas da Alemanha evidencia o patamar que o cinema de Santa Cruz atingiu, mérito de um um trabalho já consolidado na cidade. “Hoje, o município e a região oferecem a esse segmento todos os cenários possíveis para gravação. Muitas vezes, algo que teria que ser gravado na Serra, por exemplo, pode ser gravado por aqui mesmo. A logística e nossas paisagens nos permitem isso”, afirma.
Parceria estreita laços entre o município e a Alemanha
O contato entre Rafael Gessinger e o produtor Benjamin Wagener começou no ano passado, resultado do seu trabalho de estreitar os vínculos e relações institucionais entre os gaúchos e a Alemanha. O advogado contribuiu para a viabilização das filmagens em diferentes municípios do Estado, incluindo os localizados no vales do Caí, Taquari e Rio Pardo.
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Para Gessinger, a iniciativa é fundamental, sobretudo pelo fato de que a história da imigração no Rio Grande do Sul será do ponto de vista dos alemães. “Não ficamos nós apenas de maneira nostálgica conversando sobre isso, mas dialogando hoje com o fenômeno migratório mundial”, frisa.
Ressalta ainda o fato de que o longa-metragem, apesar de documental, terá elementos de humor. “Considero isso fundamental, especial no momento em que vivemos, em um mundo em crise, cheio de violência, de radicalismo e posições duvidosas. Precisamos de bom humor para aguentar isso”, pondera.
Na avaliação de Paulo Trinks, a produção é uma excelente vitrine para Santa Cruz promover-se na Alemanha. E possibilitará que a população alemã conheça as tradições locais e tenha interesse em visitar o município. “Muitos alemães realmente não conhecem o Brasil. Imaginam aquele clichê, do Carnaval e do futebol. E nós agora podemos trabalhar para que essa relação melhore.”
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Para Nasário Bohnen, a depender da reação do cineasta, Santa Cruz estará bem representada na telona. Segundo ele, o produtor alemão deslumbrou-se com a valorização e a preservação das tradições germânicas no município. Bohnen ressalta que a presença do filme vai ao encontro de um dos objetivos da comissão do bicentenário alemão, mostrando Santa Cruz para a Alemanha e favorecendo o intercâmbio entre as nações.
A missão de documentar histórias no cinema
A jornada dos imigrantes alemães pelo mundo é um tema que perpassa a carreira do cineasta Benjamin Wagener. Sua estreia como produtor foi com o longa-metragem Hiwwe wie driwwe (Aqui como lá, em português).
O documentário, realizado em duas etapas, acompanha os descendentes de alemães que vivem na Pensilvânia, nos Estados Unidos. Além de preservar as tradições, eles falam o dialeto do Palatinado (região da Alemanha), o Pfälzisch.
De acordo com o produtor, a preferência pelo formato documental permite dar voz às pessoas, para que elas sejam protagonistas e contem suas histórias, evidenciando o que é mais importante e significativo nas suas vidas. “É isso que me entusiasma, pois não é fictício, mas algo bem real que buscamos registrar”, destaca.
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Wagener olha para a imigração alemã – que se iniciou há 200 anos no Brasil e há cerca de 300 anos nos Estados Unidos – como uma espécie de cápsula do tempo. Isso porque, segundo ele, as pessoas mantêm viva a cultura de um tempo passado, de como era a Alemanha na época.
Durante o processo, chamou a atenção do cineasta algumas coincidências entre tradições preservadas nos Estados Unidos e no Brasil, mas que não existem mais na Alemanha. Exemplifica mencionando o uso de expressões que não são mais faladas pelos alemães. “Para um alemão, é super empolgante perceber o que talvez tenha sido preservado fora da Alemanha e que talvez tenha mudado dentro dela”, conta o produtor.

E esse foi um dos motivos que levaram Wagener e sua equipe a filmar no Rio Grande do Sul. Durante a produção de Hiwwe wie driwwe, esteve em contato com duas figuras que contribuíram com o projeto. Um deles foi Theo Pfleger, que já conhecia o Sul do Brasil, e o ator Betinho Klein, que evidenciou a presença da cultura alemã no Estado. E um dos destinos foi Santa Cruz. Conforme o produtor Benjamin Wagener, a visita ao município foi excelente. “Gostei muito de ouvir as histórias sobre a imigração, de como foi com os antepassados e a tradição que ficou disso”, afirma.
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Semelhanças
Na visão do cineasta Benjamin Wagener, eternizar nas telas o legado dos imigrantes é também uma questão de identidade, permitindo entender de onde eles vieram e para qual lugar vão. Segundo ele, a imigração é um assunto muito relevante na Alemanha atual, o que torna esse tema extremamente interessante para a perspectiva de um alemão.
Durante a visita ao Estado, o produtor percebeu o quanto os imigrantes tiveram influência no Rio Grande do Sul, seja na sociedade, na agricultura ou na relação com a natureza. Wagener notou muitos paralelos com o país europeu, sobretudo a ligação com a agricultura, que ainda é muito forte também na região em que vive na Alemanha, de onde muitos vieram. “É muito interessante ver o que foi acrescentado com o tempo, por exemplo, o desenvolvimento da indústria calçadista. E o mais legal é que esse intercâmbio me parece vivo e ativo.”

Entrevista com Benjamin Wagener, produtor cinematográfico
Gazeta do Sul – Como iniciou a sua trajetória na indústria cinematográfica?
Benjamin Wagener – Eu comecei fazendo vídeos comerciais e várias produções diferentes. Lá atrás eu estudei Pedagogia de mídias, que é um curso superior na Alemanha, e nessa experiência eu trabalhava muito com oficinas com jovens e crianças. Em 2015, comecei a produção do filme Hiwwe wie driwwe e essa foi a minha estreia como produtor.
Quais trabalhos já desenvolveu como produtor de cinema?
Os trabalhos mais importantes foram as duas etapas de Hiwwe wie driwwe, documentários sobre os descendentes de alemães que vivem hoje na Pensilvânia, nos Estados Unidos, e que ainda falam o Pfälzisch (dialeto do Palatinado) e que preservam tradições. O primeiro filme foi lançado em 2019 e o segundo em 2024.
De que maneira foi feita a seleção dos municípios que receberão as filmagens?
Isso decorre do contato que vamos fazendo com as pessoas, neste processo de construção, passo a passo, do filme. Visitamos aqui uma família que fala o dialeto e que faz tal produto, ali outra família que já fala diferente e faz outra coisa, e assim por diante.
E como tem sido a experiência de filmar no Brasil? Quais as vantagens?
A recepção tem sido grandiosa, as pessoas estão alegres e se entusiasmam com a nossa presença. Elas se mostram prestativas e nos ajudam como podem. Isso é muito bom. Do ponto de vista técnico e logístico, no que diz respeito às filmagens, devo confessar que é bem mais econômico, se compararmos com os custos na Europa. O lado bom é que os custos diminuem, mas não deixa de ser um enorme desafio logístico.
Como funcionou o processo de captação de recursos para a produção do filme?
Recebemos apoio da Associação de Incentivo ao Cinema de Rheinland-Pfalz (Estado da Renânia-Palatinado), que financiou o transporte aéreo e algumas outras despesas. Ao lado disso, temos uma mobilização para doações voluntárias no site https://pfalzfilme.de/. Além disso, toda a equipe tem um engajamento pessoal a ponto de arcar com algumas despesas em nome do sucesso do projeto. Mas os desafios são grandes.
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