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Simum

Acriança e Líris amanhecem combinando regar a mudinha que logo se tornará uma vistosa árvore. O dia anterior, o do sepultamento do “irmão” junto ao plantio de um plátano, não seria esquecido. Além do que, fora inaugurada uma nova possibilidade: ao invés de lápides, as árvores identificariam a quem zelam.

Um pouco mais contidas em sua vivacidade usual, Líris e a criança aspergem gota a gota no entorno do plátano. “Que ideia legal teve a Tanice”, comenta Líris. “De fato. Quem sabe, daqui para a frente os cemitérios se transformem em florestas vivas para sempre. Acho que o ‘tio’ está bem, talvez bem melhor do que ele mesmo esperaria”, acrescenta a criança.

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“Podemos parar de regar. Vem chuva e muito vento. Olhe para as nuvens grandonas e pesadas que estão vindo para cá”, alerta a criança. Líris olha para sua bonequinha e comenta: “Você não precisa se molhar já tão cedo. Vamos!” Retornam correndo para o prédio do Sanatório, onde haviam se abrigado depois de voltarem da cratera.

Chegam a tempo de ver o pombo no passadiço entre os dois prédios principais do antigo Sanatório. O pombo está inquieto. Pressente o que está por vir. As nuvens se adensam ainda mais. O vento rapidamente se transforma em ventania uivante. Nisso, Tanice aparece. Ela chama a todos: “Foram dias muito importantes, estes em que pude conviver com vocês. Mas algo me diz que devo partir”. “Para onde vais e por que partes?”, pergunta a criança. “Quando o tempo se forma do jeito que está acontecendo, alguma coisa muito transformadora está por vir”, assinala Tanice.

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Líris questiona: “Como sabes disso?” Tanice tenta manter a serenidade: “Na minha terra, existe um vento chamado Simum. Ele vem quente e sopra com uma força incrível. Leva tudo o que vem pela frente. Esse vento é muito temido, especialmente pelas caravanas que atravessam os desertos, como o Saara. Ele transporta montanhas de areia. Altera os lugares. Faz com que tudo possa ser recomeçado. Esse vento mudou incrivelmente de rota e veio me buscar.”

Nisso, a ventania vira furacão. Tanice é erguida do meio dos demais e revoluteia no ar. Com ela, o pombo também alça alturas. Ambos seguem para Nordeste. Alguns pingos refrescam o ar. “São as lágrimas de despedida da Tanice e do pombo”, considera Eva.

Cristian, sempre tão compenetrado, não se contém. Seu rosto não esconde a tristeza reverente. Soluça. Admirava demais aquela senhora. E como ela fora importante na trajetória até a cratera e no retorno ao sanatório… Nunca esqueceria de Tanice. Eva se ampara em Irene: “Ela foi embora. Foi como chegou. Veio com o vento, que a levou do Saara até o Cabo Verde. Agora, volta para sua terra de origem, nossa querida mãe África”. Irene cantarola uma canção ancestral. Muito de cada um seguiu com Tanice.

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Antônio, que pouco convivera com Tanice, comenta com os demais: “Não a conheci como vocês. Mas quanta sabedoria, que sensibilidade. Ela sabe juntar ciência com afeto, razão com intuição”. Cristian, já mais recomposto, propõe: “Ela nos ensinou sobre a terra e suas criaturas. Recordam dos trilobitas? Com ela, aprendemos que libélulas, aparentemente tão frágeis, seguem vivendo vigorosas. Ela cumpriu seu tempo e sua missão por aqui. Deve ter atendido ao chamado daqueles que estejam precisando dela agora. Lembram que foi com ela que compreendemos que nunca mais seríamos os mesmos?” Antônio, alinhado com Cristian, pede licença para propor: “Quando vocês aqui chegaram, depois de terem passado pela experiência da cratera, falei que precisava mostrar as faces da pedra encantada para vocês. Aceitam seguirmos até a pedra?”

Não foi preciso insistir. Todos se movem. Num passe de imprevisibilidade, as nuvens se desfazem imitando um estranho ponto de interrogação. O furacão vira brisa. Durante a caminhada rumo à pedra encantada, nossos aventureiros, vez ou outra, erguem seus olhos para o alto, como a procurar pela querida Tanice e pelo estimado pombo. Chegam. Verão o que não imaginam ver.

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