Passados quase 23 anos desde que Fernando Collor de Melo desceu a rampa do Palácio do Planalto pela última vez após ser deposto do cargo de presidente da República, o fantasma do impeachment volta a rondar o Brasil. Para este domingo, em dezenas de cidades do País, estão previstas manifestações, de proporções ainda incertas, pedindo o afastamento de Dilma Rousseff, apenas seis meses depois de a petista ser reeleita com 54,5 milhões de votos e em meio a uma crise onde o escândalo de corrupção da Petrobras, a economia vacilante e a controversa proposta de ajuste fiscal derrubam a popularidade do governo. A possibilidade de deposição, porém, ainda divide fortemente a classe política, os juristas e a população.
Defendida por movimentos de oposição ao governo, a hipótese do impeachment é vista com reservas por analistas consultados pela Gazeta do Sul. Sem entrar no mérito quanto à situação de Dilma, o professor de Direito Constitucional da Unisc, Edison Botelho, ressalta que, embora tramite em uma instância política (o Congresso Nacional), um processo de impeachment é um processo de natureza jurídica. Assim, como em qualquer outro processo, para haver uma condenação é preciso, antes de mais nada, provas de que uma irregularidade foi cometida pela autoridade, seja por ação ou por omissão. “O impeachment é a punição por um crime de responsabilidade”, definiu.
Os que reivindicam a saída de Dilma costumam apontar fatores como o baixo crescimento da economia, a alta na inflação e nos preços da gasolina e da energia elétrica, além dos cortes nos benefícios adotados como estratégia para equilibrar as contas. Conforme Botelho, porém, o impeachment não é um instrumento de contestação de políticas governamentais. “Alguns países possuem o chamado recall eleitoral para revogar mandatos caso haja insatisfação. Mas isso não existe no Brasil”, colocou.
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Para o professor titular de Direito Constitucional da Ufrgs, Eduardo Carrion, não há, até agora, elementos que atinjam Dilma diretamente, apesar de inúmeros aliados ao governo estarem sob investigação. Por isso, na sua opinião, a abertura de um processo de impeachment no momento seria “precipitada”. “Tem que haver indícios consistentes que comprovem efetivamente algumas das hipóteses previstas na Constituição e na lei, sob pena de virar puro arbítrio”, observou. Carrion admite, no entanto, que, como o julgamento ocorre no Congresso, existe o risco, o qual classifica como “inaceitável”, de um processo prosperar apenas por motivações político-partidárias, sem que haja uma fundamentação jurídica sólida – é o que, ao que tudo indica, aconteceu em 2012 com o então presidente do Paraguai, Fernando Lugo, destituído por um Senado de ampla maioria oposicionista. “Seria muita irresponsabilidade se isso acontecesse no Brasil. É preciso sensatez”, completou Carrion.

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