Quem aparece na porta é o falante Ivan, de nove anos. “Podem entrar, a mana ‘tá’ lá no quarto, mas ela já vem. Vieram fazer fotos?”, pergunta ele. Na sala, que serve também de área de serviço, o sofá é pequeno para todo mundo. A mãe, Lisandra, traz mais duas cadeiras. Ivan e a irmã Isabel, de oito anos, acomodam-se como podem, porque dona Lisandra ensinou que os mais velhos têm preferência na casa dos Rodrigues. 

A tevê é desligada e é Ivan quem toma a iniciativa. Ele conta que a irmã mais velha, a Greici, caiu em lágrimas porque ficou em segundo lugar em uma competição de atletismo. “Foi por um dedinho”, brinca Ivan, justificando que a diferença para a primeira colocada teria sido por milésimos. “Tem que ver, a mana brinca de correr, tio, e ela não gosta de perder. Eu também quero começar a treinar, mas não sei se na minha idade já pode, será que pode?”, questiona Ivan, que continua. “Sabia, tio, que a Greici foi correr lá em Osório e até num hotel ela ficou?”  

Dona Lisandra, com Gabriel de apenas dois anos no colo, intervém na fala do garoto e sugere que um dos filhos busque as medalhas da Greici. E Ivan sai em disparada. Lisandra conta que a filha, corredora, Greicieli Santos Rodrigues, hoje com 13 anos, é um milagre da vida. Greici, como é chamada, nasceu prematura de sete meses e pesando menos de dois quilos. Ficou cinco dias na UTI e quase um mês no hospital até ir para casa. “Fiquei feliz porque era uma menina, eu tinha só um guri, e toda casa precisa de uma menina, não é verdade?”, entende Lisandra. Agora, crescida, é Greici quem limpa a casa, lava roupa, prepara as refeições e ajuda a cuidar dos irmãos menores. Mas Greici nem sempre foi assim, tão responsável. 

SONHO – O esporte mudou o comportamento da menina que “não queria nada da vida”. É Lisandra quem conta: “Depois que começou a treinar ela mudou muito em casa. Antes ela nem o quarto arrumava, agora ‘tá’ mais caprichosa”, relata a mãe. É quando Ivan reaparece na sala com mais de uma dezena de medalhas, acompanhado pela irmã que agora é o orgulho da família. “A Greici demorou porque ‘tava’ ajeitando o cabelo”, antecipa-se o garoto. E ela somente sorri, porque sabe que não adianta contrariar o irmão. “O Ivan fala por todo mundo aqui”, brinca dona Lisandra. 

Mais retraída, agora é Greici quem fala. Ela diz que é fã da atleta santa-cruzense Sabine Heitling e sonha conquistar mais competições de atletismo. “Ah, gosto do jeito que a Sabine corre, e vou treinar bastante pra poder viajar pelo mundo também”, revela ela. O próximo destino de Greici para competir já está marcado: Fortaleza, capital do Ceará. “Pra mim vai ser um sonho”, diz ela. Greicieli é treinada pelo professor Rodrigo Alves França, da Escola Municipal Harmonia, do Bairro Santa Vitória, de Santa Cruz do Sul.