Este espaço, generosamente disponibilizado pelo jornal Gazeta do Sul, nos tem permitido trocar ideias com muitas pessoas. Assim sendo, agradecidos por esta interlocução, tomamos a liberdade de trazer à reflexão, nesse tempo natalino, a temática do entendimento integratório de nós mesmos e do ambiente que nos congrega, até porque tendemos, de forma questionável, a dividir cartesianamente nosso objeto de estudo em tantas partes ou camadas quantas enumeramos necessárias para sua melhor compreensão.
Exemplifiquemos com a busca pelo conhecimento integrado do Cinturão Verde de Santa Cruz do Sul: como compreendê-lo em profundidade e na amplitude necessária?
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De pronto, emerge um percurso bem maior do que algum fato, episódio, elemento, instalação, poligonal, ação e vivência em si mesma. Em cada fragmento de rocha, no fluir de cada gota de água, no farfalhar de cada folha, no zumbir de cada abelha, em cada paredão e em cada ciclo ocupacional brota uma trajetória que se conecta com as antecedentes e surgências. Nos instiga que o arenito formado em ambientes desérticos de acúmulo de dunas sobre os depósitos flúvio-lacustres dos tempos dinossáuricos e que presenciara os potentes derrames basálticos, passasse a se constituir em aquífero e abrigo de espécimes da megafauna.
Quantas pessoas, além das que registraram suas iniciais nessas paredes areníticas, devem ter revelado seus mais secretos desejos a essas rochas e às criaturas que lhes fizeram companhia? Quantas pessoas, nativas e chegadas, solitariamente, lavaram seus pés e mãos nas águas que seguem pelo relevo que se estruturou e erodiu? Rochas, plantas, animais, pessoas, procedimentos, dores, alegrias e sonhos, alguns revelados e outros misteriosamente resguardados…; tudo nos parece mais uma interação em fluxo continuado do que algo que possa ser limitado a um intervalo temporal, circunstancial, operacional ou estratificado em camadas.
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É o melhor caminho sequenciar camadas a partir de eventos considerados “abióticos” (geologia, instabilidades, relevo, drenagem, clima…) para adentrar pelos fatores “bióticos” (flora, fauna, nichos, fluxos gênicos, pressões, mortes…) e aportar nas dimensões sociais, econômicas, culturais, ambientais, gerenciais e de saúde, para então, a partir das partes/camadas devidamente reconhecidas, alcançar a melhor compreensão? Somos tentados a esse sequenciamento evolutivo, considerado lógico. Todavia, como separar o “não vital” do “vital” e do “social”? Não está tudo imbricado num fluxo que não desfaz antecedentes, mas o instrui e sustenta num processo não linear continuado desde sua origem ao porvir? Sigamos um pouco além. Ao trazermos a não linearidade como dimensão, adicionamos a probabilidade de diversificadas outras possibilidades ensaiarem acontecer, estas não engessadas ao alinhamento de causa e efeito.
A exemplificação acima nos acompanha na busca pela compreensão integratória e ação protetiva do próprio Cinturão Verde, como do Rio Pardinho, do Túnel Verde e de tudo o mais, seja no ambiente familiar, estudantil, de trabalho, introspectivo e assim por diante. Com o que, ao invés de nos percebermos em partes/camadas inventariadas em cartas temáticas fracionadas, fluímos em ampliadas interações memoriais colaborativas e gratificantes que nos impulsionam ativamente para uma nova metodologia cognitiva de justo reconhecimento, até porque respiramos o ar da universalidade natalina. Esta, própria do tempo em que podemos renascer no fluxo geobiodiverso da ancestralidade em devir, num continuado “vir a ser” que se oxigena em coletivo, criativo e corresponsável pertencimento. Sim, somos muitos, muitos mais do que apenas nós mesmos, ou seja, sequer somos sem os muitos em suas multilateralidades.
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