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LISSI BENDER

Berlim, mosaico de reminiscências

A visita de Axel Gutmann a minha Wilde Heimat foi mais do que uma honra. Ter Gutmann como hóspede é enriquecer alma e intelecto, é reavivar lembranças de outros tempos em Berlim.

Depois de ter sido cônsul em países árabes e em Portugal, por exemplo, dr. Axel Gutmann foi cônsul-geral da Alemanha em Porto Alegre. Desde a sua saída do consulado, mora em Berlim e sempre volta ao Rio Grande para rever pessoas e lugares. E isso inclui diversas cidades, muitos amigos, inclusive Santa Cruz. Sua presença aqui motivou um encontro com algumas pessoas empenhadas em favor do cultivo do legado cultural de origem germânica e das relações Brasil-Alemanha. Uma enriquecedora e fraternal noite, com sabores autenticamente germânicos, no mais novo Biergarten da cidade que Deisi Steil e Dieter Becker – de Gieβen/Alemanha – instalaram na subida da Hauptstrasse, nossa rua principal, em prédio histórico. Lá, oferecem diversas delícias da culinária alemã.

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Diversas vezes estive em Berlim: em 1995, em uma viagem de estudos, como professora acompanhante de um grupo de estudantes de Unisc, PUC e Ufrgs, a convite do DAAD – Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão; em 1997, em viagem cultural pelo leste alemão, promovido pela Universidade de Freiburg; em 1998, com minha família, a passeio; e em 2022, a convite de Axel Gutmann. Todas proporcionaram valiosas vivências culturais.

A visita de Axel reavivou também antigas vivências berlinenses. A primeira viagem – em janeiro/fevereiro de 1990 –, logo após o início da desconstrução do muro, a convite do Goethe-Institut – München/Berlin. Foi uma vivência bem no espírito do canto Linie1, que conheci naquele tempo, no Krips-Theater. O canto descreve a sensação da primeira chegada a Berlin, no Bahnhof Zoo.

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Deposito aqui a estrofe inicial que eu conheci no Krips-Theater: Der Zug rollt ein, die Bremsen schrein. Der Tag ist taufrisch, der Himmel, blau mit Sahne; Die Sonne piekst mir ins Gesicht; Ich kneif mich ganz fest in den Arm; Ich bin in Berlin! – O trem entra (na estação), os freios chiam; o dia fresco, orvalhado, o céu azul nateado; o sol me pinica no rosto; eu me belisco fortemente no braço; eu estou em Berlim!

A primeira vez que visitamos um lugar costuma ser muito mágico. Em Berlim, o Goethe – Institut proporcionou intensa imersão cultural: encontro com escritores berlinenses, que nos mostraram um pouco de seus processos criativos (neles, reconheci meu próprio processo); visitas a teatros, óperas, museus, muro em desconstrução, do qual guardo algumas pedras. O inusitado vivenciei em um dia livre, para assuntarmos um pouco por conta a cidade. Encaminhei-me em direção ao muro, parcialmente desmontado, na altura do Brandenburgertoor e do Reichstag; flanei pela grande avenida Unter den Linden – assim conhecida por sua alameda de tílias, cultivadas há séculos. Caminhei longamente pelo lado oriental.

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Quando as mãos, pés e nariz começaram a ficar enregelados, entrei numa cafeteria, bem aconchegante. Precisava tomar algo quente para me reaquecer. A cafeteria funcionava ainda dentro do espírito oriental, com atendimento moroso. Lá estava eu sentada esperando, esperando, e nada. Em dado momento, chega um atendente com um cálice de espumante e me entrega. Surpresa por não haver solicitado a bebida, disse: Ich habe keinen Sekt bestellt. O Kelner depositou o cálice sobre a mesa e disse ser a pedido do cavalheiro lá da janela. Levantamos os olhos na direção indicada e não havia mais ninguém lá. Saboreei um Sekt ofertado por quem nunca vi, nunca verei.

Voltei ao lado ocidental, segui por uma rua com lojas, entrei num estabelecimento. Num dado momento, um atendente veio a mim, querendo saber o que queria. Eu lhe disse que estava apenas admirando ali o mundo de coisas novas. Ele se afastou de mim resmungando: Noch so’n Ossi, der nichts kauft – mais um Ossi (alemão do leste) que só olha e nada compra. Estava eu sendo identificada como alemã em minha primeira viagem à Alemanha.

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