Rádios ao vivo

Leia a Gazeta Digital

Publicidade

CONVERSA SENTADA

Causos meus de fundo de campo

A noite foi toda de temporal e vento. Amanhecera com sol.

Nas casas e galpões, nada de anormal, a não ser alguma folha de zinco solta.

Toca o celular: é Joca, caseiro de uma morada no fundo de campo, noticiando que vários cochos de sal tinham tombado ou se destelhado.

Publicidade

Chamei meu capataz, misto de campeiro, zootecnista, veterinário, alambrador, marceneiro, mecânico e outras coisas:

– Tchê, pega o trator piqueteiro, atrela o reboque, carrega com umas “taubas”, pregos, folhas de zinco, ferramentas, pão e carne e vamos rondar as invernadas.

Já na primeira divisamos, ao longe, folhas de zinco espalhadas, na outra o cocho virado. Entre uma e outra ia observando os animais que, ante o rumor do trator, corriam para o rodeio.

Publicidade

LEIA TAMBÉM: Coisas do século passado

Por volta do meio-dia, chegamos a uma das minhas invernadas favoritas – a da Tapera.

É fácil reconhecer o lugar onde um dia já houve uma casa: cinamomos vetustos, alguns carcomidos, algum pé de limoeiro, um resto de cerca de pedra.

Publicidade

Pegamos alguns galhos secos, fazemos fogo e espetamos a carne. Vou até a sanga, lavo as mãos e o rosto. Tirei as botas, sentei-me numa pedra e coloquei os pés na água fria.

Quem teria morado aqui?

Não longe, um túmulo de campanha onde se lê o falecimento ocorrido em 1900.

Publicidade

Seria um posteiro dos Garcia, ou dos Mattos, ancestros donos?

LEIA TAMBÉM: Passando por Fritz e Frida

Retiro-me um pouco da sanga e sento-me ao pé de um angico. Fecho os olhos e escuto o marulhar das águas e o gorjeio dos pássaros. Ouço, ao longe, um tropel de cavalos e as esporas tinindo. Um, fala mais alto e dá ordem de desmontar. Conversam sobre batalhas e cerco ao inimigo. Abro os olhos espantado e nada mais escuto. Cerro-os novamente e logo ouço risadas de crianças se espadanando na água. Usam termos arcaicos, com sotaque quase português. Falam que, quando crescerem, querem ser alferes; outros, que vão defender a República Riograndense.

Publicidade

Abro de novo os olhos e o rumor cessa.

O vento aperta um pouco e as árvores ciliares inclinam-se como a me dizerem que sim, que testemunharam tudo isso, que viram até amor ser feito por aqui. Sim, elas, as árvores, que guarnecem sangas, matos e bichos, são as deusas mudas e guardadoras perenes de tantas histórias.

LEIA TAMBÉM: Sobre pecuária

– Patrão, o churrasco tá pronto.

Vamos comendo a carne e o pão, sem talheres.

Indago ao capataz:

– Tu nunca ouviste, nesses fundos de campo onde nem satélite passa no céu, vozes de gente que já morreu?

– Vozes não, só umas risadas ou algum choro de mulher em noite de lua cheia.
––––––––––––––––––
Para mim o melhor candidato a ocupar uma vaga de desembargador é o Dr. Ricardo Hermany.

*Colaborou Maristela Genro Gessinger

LEIA MAIS TEXTOS DE RUY GESSINGER NO PORTAL GAZ

Quer receber as principais notícias de Santa Cruz do Sul e região direto no seu celular? Entre na nossa comunidade no WhatsApp! O serviço é gratuito e fácil de usar. Basta CLICAR AQUI. Você também pode participar dos grupos de polícia, política, Santa Cruz e Vale do Rio Pardo 📲 Também temos um canal no Telegram! Para acessar, clique em: t.me/portal_gaz. Ainda não é assinante Gazeta? Clique aqui e faça sua assinatura agora!

Aviso de cookies

Nós utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdos de seu interesse. Para saber mais, consulte a nossa Política de Privacidade.