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ELENOR SCHNEIDER

Dia de reencontro

Além de todas as restrições, todos os recolhidos sofrimentos, todas as inconvenientes tristezas, a pandemia, o tempo da pandemia nos infligiu a partida de tantos amigos e conhecidos, verdadeiros fragmentos do nosso coração. Nem todos morreram de Covid, mas esta nos impediu ao menos um olhar de despedida, um abraço solidário a quem viu seus entes partirem para sempre. Como amanhã é dia de Finados, que essas pessoas queridas sejam lembradas com respeito, afeto e, acima de tudo, imenso amor, porque fizeram por merecer.

Como já escrevi em outro momento, Finados, para mim, sempre significou dia de reflexão, de recolhimento interior, de saudade revivida. Tanto é data para celebrar quem partiu, quanto é momento de pensar na própria vida, seus princípios e sua finitude. Não necessariamente se reveste apenas de tristeza, mas demanda também gratidão pelos momentos de alegria e felicidade que parentes e amigos nos proporcionaram. Essa, aliás, é a razão por que milhares de pessoas se dirigem aos cemitérios para prestar sua homenagem.

Há alguns dias, visitei, junto com familiares, um cemitério da minha aldeia de origem, de onde saí aos onze anos de idade. Percorremos os estreitos corredores e, lendo as placas, reconstituímos expressiva parcela de nossa própria vida. Ao mesmo tempo em que lembrávamos as pessoas ali sepultadas, tecíamos um pouco da nossa própria história e da história da localidade. Descansam ali professores, comerciantes, agricultores, ferreiros, moleiros, líderes comunitários, nossos vizinhos, familiares, crianças, jovens precocemente subtraídos da vida.

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“Esta mulher morreu golpeada pelos chifres de um boi, este jovem morreu afogado no rio Taquari quando comemorava o final de ano no Colégio Estrela da Manhã, este casal morreu no mesmo dia sem que a mulher soubesse da morte do marido…”, e assim voltávamos no tempo para reconstruir a própria trajetória, porque esses fatos fizeram e fazem parte da nossa vida. Quando morria alguém da comunidade, todos, solidariamente, compareciam ao velório ou ao enterro. A escola parava as aulas e acompanhávamos o sepultamento.

Vi a pedra tumular de uma mulher que nasceu ou morreu em 1848, não lembro com precisão. Como tem sobrenome germânico, suponho que tenha vínculo com a primeira leva de imigrantes alemães, ocorrida em 1824. E descobri que os poucos registros da nossa localidade estão reduzidos aos escassos dados das pedras tumulares, algumas já apagadas ou perdidas. Quem tinha as melhores memórias já morreu e lamentavelmente não podemos mais contar com o que essas pessoas tinham a narrar, a testemunhar.

O cemitério somente agora me fez perceber a mistura de povos que havia na localidade. Predominam os nomes alemães, mas há vários descendentes açorianos (que eram conhecidos como os ilhéus), tais como Soares, Borba, Pereira, Ferreira, Santos, Lisboa, quase todos agrupados em terras mais ou menos próximas. Há descendentes italianos, como os Ghilardi, e algumas famílias negras, como os Silva, por exemplo, meus amigos de infância. O pai deles nasceu em 1881, talvez ainda filho de escravos.

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Finados, bem como visitas aos cemitérios, nos permitem, então, reviver, reencontrar, regar ou amainar a saudade, nos fazem lembrar a nossa pequenez, os nossos limites, que viemos do pó e ao pó retornaremos. Somos convidados a repensar nossos inúteis orgulhos, nossas incompreensíveis disputas, nossas desnecessárias fortunas, somos convocados, acima de tudo, a valorizar cada momento da vida com nossos familiares e amigos.

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