Das aulas sobre história brasileira, deveríamos ter aprendido com mais atenção aquela que diz respeito ao fato de que o Estado foi criado antes da constituição de uma sociedade civil. Relembrando, à época da colonização não houve resistência local ao modelo e projeto do Estado português. Depois do fracasso das capitanias hereditárias, o governo português inventou os governadores-gerais. E com eles, a burocracia.
Há registros históricos sobre o desembarque de nobres, funcionários públicos, soldados e criminosos (réus e degredados). Aliás, quase todos solteiros e interessados em grana fácil. Não houve a imigração de famílias, ou por motivação religiosa, como na América do Norte. Pois resultou uma estrutura estatal forte, organizada, centralizadora e burocrática. Que não encontrou resistência civil. Consequentemente, nossa incipiente sociedade de então se adaptou a essa estrutura estatal.
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Segundo o ilustre gaúcho de Vacaria, advogado e historiador Raimundo Faoro (1925-2003), a responsabilidade pelo nosso subdesenvolvimento é do aparelhamento burocrático, herdeiro da administração colonial portuguesa. Trata-se do domínio de uma casta de altos funcionários aliada ao patronato político, cujos interesses comuns formam uma associação parasitária.
Juntos compõem uma rede que, espalhada pelo país, extrai dele tudo o que pode (leia Os Donos do Poder, 1958). Repito, a sociedade submissa se adapta! Consequentemente, com o passar do tempo, a lei e a ordem passaram a significar pouco, ou quase nada, em nosso comportamento social. Fraudes, falsificações, desrespeito a contratos, entre outros exemplos, são atitudes que não sofrem imputação ou reprovação moral.
Assim, não surpreendem a corrupção disseminada e os sucessivos escândalos políticos e comerciais. Não faltam notícias e episódios diários que relacionam a conduta do brasileiro ao famoso estigma de “querer levar vantagem em tudo”.
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Os parágrafos acima foram escritos há 16 anos, nesta mesma coluna semanal. É muito tempo. No mínimo, sucederam-se quatro gestões, quatro administrações municipais, estaduais e federais.
Pergunto. Superamos razoavelmente a desigualdade social e econômica? Será um problema somente de administração pública? Cívica e comunitariamente, aprendemos algo relevante com o passar dos anos?
Concluo com uma frase do humanista holandês Erasmo de Roterdã (1466-1536). “Uma necessidade, ainda que demore, não é menos necessária, ao contrário: só os ideais que não se consumaram ou não estejam comprometidos porque não se realizaram seguem tendo efeito em cada nova geração como um elemento de impulso moral.”
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