O previsível Rio Grande do Sul mostra seu potencial, desde a última semana, com os termômetros despencando, com a geada cortando os pés do colono que caminha pelo campo gelado, com a neve dando ar europeu para o Estado mais ao Sul do gigante Brasil. Chegou o frio, antecipando o inverno. É boa notícia para o comércio, que lota as vitrines de pesados agasalhos, com lareiras diversas e até aquele velho fogão de lenha, onde a mãe querida deixa o bule de café, enquanto o sertanejo pega a viola e a sanfona que tocava. Bem lembraram Chitãozinho e Xororó.
Mas não é só de boas memórias, de imagens românticas, que vive esse período. Paulinho Moska cantou “estou debaixo do sol morrendo de frio, procurando qualquer coisa no bolso, mas está vazio”. O morrendo de frio pode ser, no caso da canção, uma figura de linguagem para dizer que está sentindo a baixa temperatura, mas também pode ser o sentido literal da frase. Perdemos dois gaúchos, que viviam nas ruas de Porto Alegre e não suportaram a friaca. A cachaça que costuma esquentar o corpo dos andarilhos talvez tenha lhes acalentado a alma, porque desta vez o frio venceu.
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As condições climáticas não estão perdoando ou dando sossego para a humanidade. É uma resposta à forma como o homem (des) cuida da natureza. E exemplos de que a mudança é real e pode ser agressiva não faltam. Antes os brasileiros viviam às voltas com os problemas da estiagem nordestina, transformada em hinos do cancioneiro nacional na voz do Rei do Baião, Luiz Gonzaga. “Que braseiro, que fornalha, nem um pé de plantação. Por falta d’água, perdi meu gado, morreu de sede meu alazão”, alertou em Asa Branca. Enquanto a secura rachava o chão pisado pelo nordestino, Barbosa Lessa e a família Maicá faziam o Rio Grande do Sul refletir com as oportunidades que surgem de forma insólita. “Oba, viva veio a enchente. O Uruguai transbordou. Vai dar serviço pra gente”, ressaltaram ao destacar o trabalho dos balseiros fronteiriços, que viam na cheia dos rios a chance de ganhar um extra.
Passaram-se os anos, ampliaram-se as formas de agredir o meio ambiente, desrespeitando quaisquer orientações mínimas dos ambientalistas, que eram preservadores e passaram a ser conhecidos como “ecochatos”. A legislação está cada vez mais branda, enquanto isso, o auditório comemora a grosseria contra a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e não está em análise o trabalho dela e a posição política, mas a falta de respeito no estilo grotesco de que não deve descer para o play quem não sabe brincar.
Em meio a isso, não precisa mais chover tanto para as cheias. Nossos rios estão iguais ao de Piracicaba, que “vai jogar água, quando chegar a água dos olhos de alguém que chora”.
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