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Da terra e da gente

Os fortes dos sertões

“O sertanejo é, antes de tudo, um forte.” Foi o que escreveu Euclides da Cunha em Os sertões, livro de 1902, e foi o que me veio à memória quando atravessava o sertão nordestino do Rio Grande do Norte, entre Natal e Mossoró, na última semana, em viagem pela Editora Gazeta, diante do ambiente inóspito e severo que o caracteriza e desperta ainda mais atenção ao se confrontar de perto com ele. Não há como não concluir que quem ali vive, e sobrevive, só pode ser um forte.

Um conhecido escritor potiguar, Luís da Câmara Cascudo, em 1929, descrevia o que ele viu em viagem feita pela mesma estrada, então ainda sem pavimento, e sentindo ainda mais de perto a realidade hostil do agreste nordestino. Em crônica publicada no jornal A República, de Natal, e depois no livro Viajando o sertão, ele aponta: “De Natal-Lages (cidade que fica no caminho) corre-se entre o mato seco – Procurando o Cabugy negaceante (no trajeto impõe-se o chamado Pico do Cabugi, considerado o único vulcão extinto no Brasil que conserva sua forma original e o primeiro ponto visto pelos portugueses ao descobrirem o Brasil em 1500, antes mesmo do Monte Paschoal, na Bahia)… Um ar assustado, opresso, sinistro. Um mormaço pesadão, teimoso e acre bafora quenturas de coivaras. Chique-chiques (cactáceas típicas do sertão). Correrias desabaladas do auto para respirar-se”.

Este mesmo ar ainda se respira ao sair do carro, o que fizemos exatamente em Lages, onde está a marca de outro forte deste País, o gaúcho, ao visitar o Restaurante Chimarrão, que pela identificação já deixa claro tratar-se de investimento de sulista empreendedor que desbrava e deixa suas marcas pelo Brasil. Nas imediações, passa-se por várias pequenas cidades, como Caiçara do Rio do Vento, que não por acaso tem esse nome, pois no rio não corre água e fala-se que ali crianças de 10 anos ainda não viram o líquido em seu leito. O que existe em abundância é, sim, o vento que dá nome ao curso e em partes altas alimenta torres de geração de energia eólica, com seus grandes braços, que de forma diferente também aparecem em outros pontos extraindo petróleo, uma riqueza que brota do fundo desse solo seco.

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A falta de água que o aspecto geral da região evidencia fez lembrar de ex-colega da Editora (Cleiton), em viagem feita pelos sertões com pesquisador da Embrapa, quando estranhou que o único local para pousar em pequena vila não tinha teto e perguntou como faria se chovesse. A proprietária lhe respondeu com muita naturalidade que, se chovesse, a população faria no mesmo dia uma procissão para agradecer e o veneraria como santo milagreiro (Aliás, o seu sobrenome é Santos). E ali não falta a reza pela chuva, que normalmente só aparece, quando vem, no chamado inverno de lá, nos primeiros meses do ano. Ou a água emerge se perfurar muito fundo, a 700-800 metros, onde se encontra o tão precioso líquido para gerar renda e empregos na maior fazenda de melão do mundo, que só assim surge nos sertões de Mossoró, local do maior evento de fruticultura do País, que acompanhei, como a Editora Gazeta faz todos os anos, para reunir informações a serem utilizadas nos nossos anuários brasileiros de agronegócio.

A superação e a obtenção de riquezas em condições tão adversas (a ser contada por mim com mais detalhes em reportagem na Gazeta do Sul), além de revelar a força dos que nele vivem e empreendem, renovam a tão propalada importância da irrigação na agricultura (também para o nosso Sul, onde as secas já não são incomuns) e servem de lição e de ânimo diante de tantas dificuldades que se apresentam em nossas vidas. Sejamos, pois, fortes nos sertões que, de uma forma ou de outra, todos nós temos para enfrentar.

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