As palavras nos explicam. Rage bait foi uma das expressões escolhidas para representar 2025. Diz respeito à agressividade no ambiente virtual, da hostilidade gratuita nas redes sociais, etc. Algo que, não raro, extrapola o mundo dos algoritmos e contagia as relações humanas urgentes, de carne e osso, no dia a dia.
Sempre se soube: as palavras são precursoras de atos, servem como anúncio, “faíscas de incêndios futuros”, na memorável definição do escritor argentino Ricardo Piglia. Quais termos vão nos descrever em 2026? Que seja algo melhor.
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Uma rápida navegação pelo YouTube já nos arremessa em um redemoinho de “Fulano destrói sicrano”, “Sicrana humilha beltrano”, “atropela”, “espanca” e por aí vai. Rage bait, isca para chamar atenção em chamadas de vídeos. Um desavisado pensaria que se trata de brigas de rua, mas não: são pessoas conversando. Um responde, outro rebate, contesta, muitas vezes de modo educado (claro que nem sempre), mas os títulos são bombásticos e “bélicos”.
Não se pode esquecer do que significa o cansativo e gasto verbo “lacrar”, na exata acepção: o ato de fechar ou isolar algo. Como diz o Aurélio, “fechar completamente”. O que não deixa de ilustrar bem o estado neurótico de grande parte das interações online. Se não todos, muitos permanecem presos em bolhas que não estouram.
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Quando as redes sociais surgiram, elas trouxeram – como já acontecera com o rádio e a televisão – a promessa de que seriam um meio de fortalecer a cultura, a troca de informações relevantes, os laços sociais, a aproximação entre culturas e, por tudo isso, a democracia. As pessoas se tornariam mais tolerantes e civilizadas. Obviamente, a realidade não corresponde à expectativa.
As barreiras entre quem pensa e age diferente parecem ter ficado mais espessas. As divergências, mais radicais. Em 2009, quando publicou o livro Informar não é comunicar, o sociólogo francês Dominique Wolton já observava: a palavra “rede” tornou-se mágica. “Mas uma rede reúne, antes de tudo, pessoas com pontos de vista em comum. Essa é a sua força e a sua sedução.”
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Seja qual for seu alcance, uma rede é, antes de tudo, comunidade, agrupamento de semelhantes ou que se enxergam assim. Já a sociedade é outra coisa mais complexa, pois reúne, além de quem partilha valores e interesses comuns, também aqueles – sempre mais numerosos – que são diferentes. Uma sociedade democrática é o lugar da divergência, do contraditório, da multiplicidade de opiniões. Onde não há vozes distintas na praça, também não existe democracia. Existe outra palavra.
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