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OCUPAR ESPAÇOS

A regra é clara: mulher pode estar onde quiser; Luiza Reis escolheu os gramados

Foto: Divulgação

Foto: Juliano Reiher

No início do século 20, quando o futebol – esporte de origem inglesa – começou a se popularizar no Brasil, as mulheres “enfeitavam” os estádios ao acompanhar pais, irmãos e maridos vestidas com trajes inspirados na moda europeia, caracterizada pelos chapéus e plumas. Mas o colorido feminino foi perdendo espaço na mesma proporção em que avançou a violência, principalmente entre torcidas organizadas. E, para deixar claro que as mulheres não eram bem-vindas no mundo do futebol, um decreto assinado por Getúlio Vargas em 1941 as proibiu de praticarem a modalidade.

Esse afastamento entre a mulher e o futebol começou a mudar em 1979, quando a norma foi revogada. Aliás, antes disso, em 1971, a primeira árbitra brasileira, Léa Campos, precisou recorrer ao presidente do País na época, Emílio Garrastazu Médici, para poder exercer a profissão. “É claro que o sistema não é feito para que a gente alcance esse espaço, mas não basta se indignar, é necessário que a gente mude o sistema”, encoraja Luiza Reis, que, 50 anos depois, trilha o caminho aberto por Léa Campos, como árbitra-assistente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

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Aos 33 anos, a santa-cruzense Luiza Reis acumula 13 anos de experiência como bandeirinha e comemora os feitos realizados na função. Já atuou em final de Gauchão – a primeira mulher a fazer isso, em 2020 -, em jogos da Copa do Brasil e de várias divisões do Campeonato Brasileiro. Mas ainda tem sonhos a realizar: trabalhar em campo durante um Gre-Nal (já fez isso na cabine do VAR) e em jogos da série A do Brasileirão.

Esse protagonismo no mundo do futebol, porém, não estava nos planos de Luiza quando ingressou no curso de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), em 2006. Tudo começou com uma parceria entre a Federação Gaúcha de Futebol (FGF) e a Escola de Educação Física, que tinha como objetivo incluir mais mulheres na função de gandula. Ela participou e, depois, foi convidada a se inscrever no curso de arbitragem, que também queria ampliar a participação feminina na mediação dos jogos.

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Mais uma vez, Luiza topou o desafio e, em 2009, ingressou no curso de arbitragem. Nesse mesmo ano, passou a integrar a equipe da FGF, no cargo de assistente. Atualmente, está na categoria A e é uma das sete mulheres aptas a atuar em jogos da Federação Gaúcha. “Quando eu comecei, havia duas mulheres. Hoje, o número dobrou, mas ainda é pouco”, comenta, lembrando que são 174 homens credenciados na FGF. A proporção desigual assusta. O machismo, não.

Luiza Reis acumula 13 anos de experiência como bandeirinha e comemora os feitos realizados na função | Foto: Juliano Reiher

Entre os colegas de arbitragem, segundo Luiza, não há estranhamento em relação à presença de mulheres nos mesmos postos. Quanto aos jogadores, ela avalia que há mais respeito com bandeirinhas e árbitras mulheres do que com os homens. O problema, para a santa-cruzense, está na torcida – principalmente a feminina. “É das mulheres que vêm os xingamentos mais machistas. Isso chateia bastante. Não é algo que dê para se acostumar, mas a gente já sabe como é”, lamenta.

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Essa preparação mental faz parte do curso de arbitragem, que também inclui aulas teóricas, práticas, físicas e de posicionamento. Nos dias de jogo, os preparativos envolvem alimentação balanceada e cuidados com o corpo. Também, pudera. Durante uma partida, ela percorre entre cinco e sete quilômetros, intercalando corrida e caminhada. Além disso, a equipe mediadora também analisa a situação dos times no campeonato válido, histórico de confronto entre os clubes, esquema tático e questões disciplinares.

Pequenas conquistas para grandes mulheres

Conforme Luiza, quando decidiu ser bandeirinha, ela se preparou para enfrentar o machismo e a discriminação. “Não aconteceu”, define. Mais que isso, ela relata que a inclusão progressiva da mulher no futebol fez com que pequenas conquistas fossem alcançadas. Exemplo disso é a implantação de vestiários femininos em praticamente todos os estádios do Brasil. “Antes, as mulheres se vestiam primeiro e depois ficavam esperando do lado de fora”, relembra.

Outra conquista importante, de acordo com Luiza, foi alcançada a partir da luta da ex-assistente de arbitragem Ana Paula Oliveira, atual presidente da Comissão de Arbitragem da Federação Paulista de Futebol (FPF). Há cerca de quatro anos, ela conseguiu a alteração de uma regra injusta: quando uma árbitra ou bandeirinha engravidava, ficava um ano fora, devido à licença-maternidade, e, automaticamente, perdia a licença para atuar. Agora, a gravidez é possível sem qualquer prejuízo.

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Independente disso, ser mãe não faz parte dos planos de Luiza. “Ainda me olham diferente quando expresso esse pensamento, mas a maioria entende que a minha profissão exige uma condição física específica”, disse.

Paixão na pele

Assim que ingressou no rol de árbitros da FGF, a assistente Luiza Reis fez questão de marcar na pele a nova paixão. No pulso, uma miniatura da bandeirinha quadriculada que ela costuma erguer para sinalizar qualquer impedimento, feita por um tatuador de Santa Cruz do Sul, lembra o quanto ela ama a profissão.

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Foto: Juliano Reiher

Surge uma bandeirinha, perde-se uma torcedora

Apesar de nunca ter sonhado em ser jogadora de futebol, Luiza Reis gostava de assistir a jogos – e torcer, é claro. “Eu tinha um time, mas agora eu não consigo torcer para mais ninguém”, garante. Atualmente, vê o esporte com profissionalismo. “Quando comecei o curso, eu achava que isso era impossível, mas é real. Quando vejo um jogo pela televisão, só presto atenção na atuação do árbitro e dos bandeirinhas”, explica.

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Natural de Santa Cruz do Sul, Luiza mora em Porto Alegre desde 2006, quando ingressou na faculdade de Educação Física. Atualmente, é professora na Faculdade Sogipa, nas disciplinas de Atletismo e Ética Profissional. Tem pós-graduação em Jornalismo Esportivo, mestrado em Promoção da Saúde pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e doutorado em Ciência do Movimento Humano pela UFRGS.

Para além das salas de aula, Luiza aproveita o prestígio que tem nas redes sociais para incentivar mais mulheres a ocuparem espaços. “Não basta ser a primeira a conquistar qualquer feito, o que não podemos é ser as únicas. Eu quero abrir portas”, destaca. Nesse sentido, ela prega a união feminina. No Instagram, soma 18,5 mil seguidores – a maioria homens, mas com maior engajamento de mulheres. “É algo que está acontecendo naturalmente, eu expondo minha rotina na arbitragem, os jogos, os perrengues”, brincou. Para segui-la, acesse @luizareisbandeirinha.

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