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LISSI BENDER

Deixem o relógio da igreja na aldeia Lasst die Kirchenuhr im Dorf

Quando Dante Alighieri descreveu um relógio em sua Divina Comédia, lá pelos idos de 1320, os relógios já eram conhecidos e difundidos. Naquele tempo, havia relógios em mosteiros, em torres de igrejas, de prefeituras, em castelos de muitas cidades. A partir do século 15 e, principalmente, desde 1500, as igrejas de quase todas as cidades e aldeias da Europa Central ostentavam relógios em suas torres. Sinos e relógios em igrejas são patrimônios das comunidades e fazem parte de suas vidas há muito tempo.

Valiosa tradição que veio para Santa Cruz junto com os imigrantes. Para se ter uma ideia do significado do badalo dos sinos e relógios para eles, lembremos que, enquanto a igreja evangélica estava proibida de ostentar uma torre, luteranos e católicos se uniram na coleta de dinheiro (Guido Kuhn, 2007) para a instalação de um sino na antiga igreja matriz, já no início da imigração. Tal a importância transcendental do badalar do sino, do relógio, na cultura histórica da nossa comunidade.

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Na igreja luterana, o sino e o relógio oferecem ritmo e estabilidade à vida da comunidade há mais de cem anos. Os sons entrelaçam as gerações passadas com as atuais. “Mais do que marcar horas, os relógios em igrejas simbolizam eternidade e continuidade. Cada badalada ecoa histórias, conecta gerações e mantém viva a essência do lugar sagrado” (in Gazeta do Sul, 8 de maio, 2025, p.6). Silenciá-lo significaria uma perda para a conexão da comunidade com seu passado, com sua herança cultural. Uma ruptura que significaria a instauração simbólica de um domínio estranho à fé e à história de Santa Cruz.

Romper-se-ia também o sentido espiritual de passagem do tempo, dos ciclos da vida, do tempo como uma orientação divina. Seria rompida uma referência fundamental na vida, na comunidade: a das pessoas para com a transitoriedade de suas vidas. O poeta Johann Gabriel Seidl ilustra muito bem o significado, a importância dos sons do relógio para a vida do ser humano, como parte de todos os seus momentos cruciais:

“Sie schlug am Sarge des Vaters, sie schlug an des Freundes Bahr,
Sie schlug am Morgen der Liebe, sie schlug am Traualtar.
Sie schlug an der Wiege des Kindes, sie schlägt, will’s Gott, noch oft,
Wenn bessere Tage kommen, wie meine Seele es hofft.”
“Ele soou junto ao caixão do pai, ele soou no túmulo do amigo,
Ele soou na manhã do amor, soou junto ao altar.
Ele soou junto ao berço da criança e, se Deus quiser, ainda soará muitas vezes, quando dias melhores chegarem, como é do anseio de minha alma.” Johann Gabriel Seidl (1804-1875), escritor austríaco – excerto.

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São os sons do relógio da igreja que diuturnamente nos envolvem e anunciam o compasso dos dias. Cada badalo do relógio é som que ressoa e já ressoou na vida de muitas pessoas que viveram antes de nós, lembrando a presença do Divino para cada ser da comunidade, lembrando-lhe que o tempo é uma passagem inexorável: tempo para ser vivido cada dia, a cada toque do relógio. Lamento que algumas pessoas não conheçam o precioso significado desses sons e, ouvindo-os, poderem sentir que estão vivas, sentir como fazem bem à alma.

Por isso, imploro, deixem o relógio da igreja vivamente presente em nossas vidas – Lasst die Kirche im Dorf (deixem a igreja na Aldeia) é uma expressão idiomática, usada para não exagerarmos ou complicarmos; a expressão também é título de um filme alemão – Valho-me dessa expressão para meu apelo: Lasst die Kirchenuhr im Dorf – permitam que os sons do relógio continuem a nos conectar com o passado, a nos envolver e sentirmos como é bom estarmos vivos e vivermos em Santa Cruz.

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