Um líder populista precisa dizer que representa o povo e que tem o dever de defendê-lo contra seus inimigos, que por vezes são criados no éter fértil da falsidade e do medo exacerbado. A imprensa livre, as universidades, o sistema judiciário e qualquer outra instituição independente que possa apontar corrupção e desmandos do governo central se tornam antagonistas a serem domados e controlados.


Em 1989, na Hungria, a promessa e o desejo de democracia aceleraram a transição do comunismo ao capitalismo liberal, em uma marcha franca para o oeste geopolítico. Nessa época, surge uma liderança estudantil de pró-liberalismo e democracia que rapidamente se traduziria em política partidária.
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Viktor Mihály Orbán nasceu em uma família pobre do interior da Hungria. Ele e seus antigos colegas de universidade criaram um projeto de poder baseado no populismo liberal pró-europeu. Ao assumirem o poder, porém, a política do grupo foi convenientemente se transformando em nacionalismo antiliberal. O projeto foi bem-sucedido, com Orbán como primeiro-ministro desde 2010, e com a democracia húngara sendo gradualmente sacrificada.
Outro inimigo conveniente de Orbán é o bilionário investidor George Soros, um nativo da Hungria que sobreviveu ao holocausto judeu e deixou o país natal ainda na adolescência. A União Europeia também é vista como ameaça à unidade húngara, embora os subsídios que cheguem de Bruxelas sejam sempre bem-vindos, representando mais de 5% do produto interno bruto.
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Resumindo, qualquer ataque a Orbán é visto por seus apoiadores como um ataque à Hungria, característica comum nos governos ultraconservadores. Após 15 anos de Orbán como primeiro-ministro, restaram poucas instituições independentes no país. Além disso, o partido no poder, o Fidesz, considera qualquer imigrante como uma terrível ameaça à unidade nacional. Ironicamente, nunca houve fluxo significativo de estrangeiros na Hungria, que permanece como o país com menor taxa de imigração da Europa.
A situação atual da nação, com alto índice de corrupção, judiciário independente enfraquecido, liberdade de imprensa limitada e sistema de partido dominante nem sequer permitiriam a entrada da Hungria na União Europeia, que a observa com criticismo e por vezes cogita removê-la do bloco.
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O paradoxo do populismo é o afastamento gradual da democracia aprovado pelos eleitores. Orbán assumiu o poder como um ativista liberal e ferrenho democrata para se tornar um autocrata antidemocrático. Além da forte ligação com a Rússia de Putin, o líder promove frequentes encontros com seus pares da extrema-direita europeia, como o português André Ventura, líder do partido Chega, Santiago Abascal, do Vox espanhol, a francesa Marine Le Pen e o holandês Geert Wilders.
Todos eles perfeitamente alinhados com o presidente americano Donald Trump, que não esconde sua admiração e até segue métodos copiados do líder húngaro. Dentro do mesmo grupo ideológico, não é à toa que a embaixada da Hungria em Brasília é cogitada como um dos potenciais refúgios de um ex-presidente brasileiro, no caso de um mandado de prisão.
O populismo, venha de onde vier, faz amiúde com que o povo vote apaixonadamente no próprio carrasco. Esse sonambulismo consciente, na direção da autocracia e do regime de exceção, volta a ameaçar várias nações democráticas. Como diz um ditado japonês, “se pegares o trem errado, desça na estação mais próxima. Quanto mais ficares no trem, mais caro será o retorno para casa”. Eu ainda completaria: evite tomar o trem errado novamente! Um sábio ditado que, é claro, nunca foi sobre trens.
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