Os produtores rurais do Rio Grande do Sul vivem uma cruel sequência de perdas. As últimas safras foram impactadas por quatro estiagens severas e a maior catástrofe ambiental da história gaúcha, deixando 478 dos 497 municípios sob grande quantidade de água em 2024. Diante disso, tornaram-se prementes ações de socorro ao setor primário. Uma das iniciativas é a possibilidade de renegociação das dívidas rurais, com alongamento dos prazos para o pagamento.
Nesta quinta-feira, 22, um grupo realizará a paralisação regional do movimento de agricultores “Securitização Já”. Será às 14 horas, na Praça Erico Raabe, em Pantano Grande, e terá como destaque o apoio ao projeto de lei 320/2025, de autoria do senador Luís Carlos Heinze (PP). É uma forma de conscientizar a população urbana sobre a importância da securitização – que é a possibilidade de alongamento do prazo para a quitação da dívida – e seus possíveis impactos no comércio local.
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O evento conta com o apoio de diversas empresas e a presença de líderes municipais, regionais e estaduais, com destaque para a participação já confirmada do secretário estadual da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação, Edivilson Brum (MDB). Antes do ato principal, às 13 horas, ocorrerá o deslocamento de tratores e demais veículos participantes, com saída do quilômetros 210 da BR-290, em frente à Pousada Casa Verde, em direção ao centro da cidade. O retorno está previsto para as 17 horas, pelo mesmo trajeto.
Um dos organizadores, Cássio Nunes Soares, afirma que se trata de um apelo de sensibilização para a renegociação. “Chama a atenção para a crise vivida pelo setor produtivo. São quatro safras frustradas em sequência”, enfatiza. São contabilizadas perdas em produção e em valores de tributos que deixam de ser arrecadados no Rio Grande do Sul.
Em Venâncio Aires, há uma semana, produtores de Santa Cruz, Passo do Sobrado e Vale Verde demonstraram seu apoio à busca pela securitização das dívidas. Eles não devem ir a Pantano, mas são solidários aos colegas.
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Comissão de Agricultura dá aval à proposta
Os agricultores gaúchos tiveram uma importante conquista na última terça-feira, 20. A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovou o projeto de lei 320/2025, que propõe nova securitização das dívidas acumuladas dos produtores rurais. Não se trata, no entanto, do encerramento dos debates. A proposta do senador Luis Carlos Heinze (PP) segue agora para análise da Comissão de Assuntos Econômicos.
Heinze celebrou o avanço. “Desde fevereiro, trabalho incansavelmente nessa pauta. O que conseguimos é um pequeno passo, mas já representa um alento para milhares de produtores rurais. Ainda temos um longo caminho até a sanção da lei, por isso é fundamental manter a mobilização”, afirmou.
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O parecer aprovado é de autoria do senador Hamilton Mourão (Republicanos), que incorporou uma emenda que amplia os benefícios da proposta para as empresas cerealistas. O projeto 320/25 propõe a conversão das dívidas dos produtores em títulos lastreados pelo Tesouro Nacional, com limite total de até R$ 60 bilhões.
A medida inclui operações de custeio, investimento e comercialização contratadas até 30 de junho de 2025. Cada produtor poderá renegociar até R$ 5 milhões, com carência de três anos e prazo de pagamento de até 20 anos.
O texto também prevê a criação de uma linha de crédito, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para recuperação de solo e investimentos em irrigação, com taxa de juros de até 5% ao ano. Além disso, estabelece taxa de juros de 1% ao ano para beneficiários do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), 2% para o Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp) e 3% para demais produtores. Como bonificação para adimplentes será oferecido desconto de 30% sobre cada parcela paga dentro do vencimento, limitado a R$ 100 mil, e 15% sobre o valor que exceder esse limite.
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“As possíveis consequências da proposta são garantir um prazo adequado para a recuperação dos produtores, manter o crédito rural disponível, viabilizar a renegociação das dívidas em condições mais justas e promover a segurança jurídica e a previsibilidade financeira”, enfatiza o senador Heinze. “Isso permitirá que o setor se recupere dos problemas climáticos e continue contribuindo para o desenvolvimento do País, evitando o aumento no preço dos alimentos.”
Situação semelhante aconteceu na década de 1990, quando o presidente era Fernando Henrique Cardoso (FHC). A lei 9.138, de 1995, autorizou as instituições financeiras a alongarem a cobrança das dívidas rurais, com início do pagamento em outubro de 1997, tendo taxa de juros de 3% ao ano. A quitação, de acordo com a legislação, poderia ser feita em moeda corrente ou o equivalente em unidades do produto agropecuário.
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A apresentação do projeto de lei, em 1995, foi feita a partir das constatações da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Causas do Endividamento Agrícola, instalada em meados de 1993. Na ocasião, o Banco do Brasil era o principal agente de fomento do setor produtivo. Como garantia das operações alongadas, o tesouro emitiu R$ 7 bilhões em títulos da União.
Defesa coletiva
No início do mês, ocorreu encontro técnico entre a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul) e o governo federal. Desta vez, foi com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), às vésperas de se completar um ano da primeira reunião entre ambos para tratar da delicada situação do agronegócio no Estado. Na ocasião, foi feito o primeiro alerta da federação de que o problema não se restringia à catástrofe climática que assolou o Rio Grande do Sul em 2024, mas também tinha relação com o acúmulo de perdas desde 2020.
Passado um ano do encontro, realizado em 7 de maio de 2024, as conversas continuam na busca de uma solução que garanta a manutenção dos produtores em suas atividades, indo além das medidas paliativas adotadas desde então. Na reunião, a Farsul deixou clara a posição de que as prorrogações podem ajudar muito os produtores que tomam crédito controlado, com juros do Plano Safra.
Na terça-feira, 20, o governador Eduardo Leite (PSD) esteve com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, acompanhado dos secretários Arthur Lemos (Casa Civil) e Edivilson Brum (Agricultura). Trataram sobre a pauta sanitária, em função da influenza aviária – que teve registro positivo em granja comercial de Montenegro –, e a prorrogação das dívidas dos produtores rurais, reivindicação antiga do setor. Segundo Fávaro, o encaminhamento para a prorrogação já está pactuado dentro do governo federal. O próximo passo será a construção de uma proposta para reestruturação de perfil das dívidas, criando condições reais para que os produtores possam se recuperar e investir.
“O produtor quer trabalhar, mas as adversidades climáticas dos últimos anos exigem do poder público uma atuação à altura. Vejo disposição do governo federal em construir soluções, e é isso que estamos buscando: garantir a prorrogação das dívidas, mas, mais do que isso, construir um caminho definitivo, com segurança jurídica, técnica e financeira, para que nossos produtores possam seguir produzindo”, destacou Leite.
Fávaro reiterou que o entendimento sobre a necessidade da prorrogação está consolidado. “Está claro para nós que a prorrogação é necessária e já está pacificada dentro do governo federal”, garantiu.