Rádios ao vivo

Leia a Gazeta Digital

Publicidade

RECONSTRUÇÃO

Recanto dos Guerreiros: novo condomínio é símbolo de superação em Rio Pardinho

Foto: Inor Assmann

Moradores do antigo Recanto do Sossego recomeçam em novo condomínio, mais distante do rio

No dia 30 de abril de 2024, o condomínio Recanto do Sossego, localizado em Balneário Panke, foi destruído pelas águas do Rio Pardinho. Da comunidade, que existiu por quase três décadas, sobraram apenas alicerces de 32 residências, enquanto o restante das moradias, a maioria de alvenaria, foi levado pela forte correnteza.

Um ano depois, em um vale situado no interior da Linha Molz, em Rio Pardinho, a cerca de 5 quilômetros do antigo local, as famílias reerguem as casas destruídas em um novo condomínio: o Recanto dos Guerreiros. “Porque o guerreiro é aquele que não se entrega. É aquele que recomeça e vai sempre enfrentar as adversidades”, define o presidente da Associação de Moradores do Recanto do Sossego, Áureo Luiz Jaeger.

Distante das águas do Rio Pardinho, paisagem do novo condomínio é cercada por morros cobertos por vegetação | Foto: Inor Assmann

LEIA MAIS: Rio Pardinho: correnteza arrastou casas e condomínio ficou em ruínas

Publicidade

Situada em um vale, rodeado por morros cobertos de vegetação, a nova propriedade tem 4,8 hectares. Ela foi adquirida em outubro do ano passado por 20 famílias e separada em 23 lotes. Nove delas possuíam residências no antigo condomínio no Balneário Panke. “Lamentavelmente, nem todos os meus vizinhos tinham condições financeiras de adquirir essa nova área e alguns ficaram para trás. Muitos tiveram que fazer financiamento para comprar o terreno e para construir”, explicou Jaeger.

Ele e a esposa Adelma começaram a construir um chalé na nova área em janeiro. Venderam a casa que tinham na área urbana de Santa Cruz e se mudaram recentemente para o novo lar, que ainda está em obras. “É uma casa que foi projetada conforme as nossas necessidades. Não queríamos nada muito grande nem muito pequeno. E vai ficar bem aconchegante”, afirmou o morador.

O recomeço, no entanto, não está sendo fácil. Para chegar ao recanto, são 800 metros de estrada de chão, coberta por pedras. Outra dificuldade é o acesso à energia elétrica.

Publicidade

LEIA MAIS: Associação de Moradores do Recanto do Sossego pede auxílio para reconstrução de moradias

Diante disso, os moradores procuraram a Prefeitura e solicitaram o cascalhamento da estrada para melhorar a qualidade do acesso e diminuir os riscos de danos aos veículos. Também pedem ajuda do Município para intermediar a instalação de rede elétrica no novo recanto. “Foram desafios que enfrentamos há 30 anos e vamos superar novamente”, garantiu Jaeger. 

Áureo e a esposa Adelma se mudaram recentemente para chalé ainda em construção | Foto: Inor Assmann

A nova localidade, longe do rio, foi um alento para Cláudio Juarez Jaeger, irmão de Áureo. Da sua antiga residência no Recanto do Sossego, que havia adquirido em 2020, restou apenas o piso. O resto foi parar dentro da água. 

Publicidade

Com o seu espaço de terra garantido, a ideia é fazer uma pequena cabana onde deseja passar o resto da vida. “Como investi praticamente tudo que tinha na outra residência, estou me capitalizando para morar aqui com a família”, disse. Para Cláudio, é só questão de tempo até o Recanto dos Guerreiros se desenvolver. “Aguardem, vocês vão ver como ficará a nossa comunidade em quatro anos.”

LEIA TAMBÉM: A força para salvar uma terra devastada

Tradição familiar

O antigo Recanto do Sossego começou na década de 1990 pelo patriarca da família Jaeger, Heino Dietmer Jaeger, de 92 anos. Ele comprou o terreno do irmão Enno. Após construir a morada, foi se desenvolvendo aos poucos até se tornar um condomínio, que chegou a ter 32 casas. 

Publicidade

Quatro filhos – Áureo, Cláudio, Beatriz e Elisabete – possuíam moradias no local. Todas foram destruídas no ano passado. Heino saiu do recanto em 2010, após uma enchente.

Áureo construiu sua residência em 1998. Era a primeira do lado direito, logo após passar o portão. Ele e a esposa, Adelma, foram investindo aos poucos e chegaram a instalar um quiosque, garagem e até uma piscina – uma das poucas estruturas que restam no Balneário Panke, apesar de uma parede ter cedido e caído dentro.

Diante da catástrofe, tomaram a difícil decisão de não reconstruir mais a residência no local. “Não foi fácil, era muito apegado ao lugar”, desabafou Áureo. Mas o desejo de morar no interior era mais forte e se mobilizaram para construir um novo condomínio. Assim como seu pai há mais de três décadas, ergueu junto com os irmãos e outros moradores do Balneário Panke o Recanto dos Guerreiros.

Publicidade

Escombros foram tudo o que restou do Recanto do Sossego após a passagem da água | Foto: Alencar da Rosa/Banco de Imagens

LEIA TAMBÉM: Empresa mais antiga de Sinimbu é exemplo de superação na reconstrução pós-enchente

Após sobreviver à enchente, casal inicia nova fase

A primeira casa do Recanto dos Guerreiros a ficar pronta foi a do casal Enio Erni Ebert, 72, e Beatriz Jaeger, 66. Os dois se conheceram no antigo condomínio e estão juntos há quase uma década. Cada um tinha a sua própria residência, mas com o passar do tempo, decidiram mudar-se para a de Enio, de aproximadamente cem metros quadrados. 

Os dois estavam em casa quando a enchente começou. Por terem lidado com outros alagamentos, achavam que seria controlável. No entanto, à medida que a água foi subindo e a correnteza se apresentava mais forte, preocuparam-se. Com a força da água, foram arrastados e ficaram agarrados nas árvores, onde permaneceram por cerca de 12 horas até serem resgatados por um agricultor. 

Após a moradia de um vizinho desabar, os entulhos fizeram com que Beatriz começasse a afundar. “Só pensei que eu não queria morrer, porque tenho duas filhas. Não sei quantas vezes eu afundei. Entreguei para Deus. Foi um milagre sobreviver.”

LEIA TAMBÉM: Rio Pardo espera por casas, mas moradores convivem com a demora e o descaso

Diante do trauma, levaram alguns dias para retornar e ter a certeza de que o lar havia sido destruído. Conforme Beatriz, era difícil saber se o resquício de alvenaria que sobrou era da sua casa ou da de um vizinho. “Eu evito tocar no assunto ou ficar pensando muito, porque quero encontrar uma explicação para tudo isso e não encontro. Foi muito horrível.”

Enio emociona-se ao relembrar da catástrofe. “Me desculpe, mas dá vontade de chorar. A enchente levou tudo, minha gaita, minhas galinhas. Pelo menos não levou as nossas vidas”, desabafou.

Quando chegaram em Linha Molz, o acesso era muito limitado. Mas a esperança e a dedicação mobilizaram os dois para concluí-la. “É maravilhosa”, afirmou Beatriz ao contemplar a nova moradia.

No terreno, Enio já preparou a pequena horta e adquiriu algumas aves. E a plantação de milho já começou a aparecer. “Vai voltar a ser como era antes. Não vou desistir. O dia que eu conseguir comprar tudo que eu tinha, se Deus me chamar, vou morrer tranquilo. Essa é a convicção que eu tenho.”

Para o casal, é só uma questão de tempo para que a comunidade se consolide e faça do Recanto dos Guerreiros uma localidade próspera. “Não será igual, sem dúvida. Mas vai ser a melhor coisa do mundo, porque é um condomínio que preza pela amizade e pela família”, disse Beatriz.

Beatriz e Enio foram os primeiros a se mudar para o novo Recanto dos Guerreiros | Foto: Inor Assmann

LEIA TAMBÉM: Crianças no pós-enchente: como os traumas podem interferir na saúde mental

Morador salvou grade de antigo condomínio como recordação

O ex-educador Alcy Lopes de Souza, 80 anos, resgatou do antigo Recanto do Sossego algo muito inusitado: parte do portão e da grade que dava acesso ao condomínio. O objetivo é instalá-la em sua nova moradia, na Linha Molz. “É uma recordação de um tempo fantástico”, afirmou.

Aposentado há 35 anos, adquiriu uma casa no Balneário Panke há duas décadas. Costumava frequentar a moradia nos fins de semana. “Chegava a passar mais da metade do mês lá.” 

Souza havia passado no local dias antes da catástrofe. Ficou apavorado com o volume de chuva e o avanço da água. Ao chegar, deparou-se com a destruição total. Da sua casa, restou apenas o piso. Para o aposentado, sobraram só as recordações de uma comunidade que era sinônimo de amizade e união. “Era apenas para lazer, mas não era só um patrimônio. Investi muito ali. E levou uma parte da minha história”, desabafou.

Assim que ficou sabendo do Recanto dos Guerreiros, Souza decidiu construir uma nova casa. Enquanto a estrutura ainda não fica pronta, já começou o cultivo de mandioca. Em um caderno, anota a progressão da obra. “De pouco em pouco, logo ela vai estar pronta”, garantiu.

Alcy Lopes de Souza começou a construção do novo lar, onde pretende instalar a grade | Foto: Inor Assmann

LEIA MAIS DAS ÚLTIMAS NOTÍCIAS

Aviso de cookies

Nós utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdos de seu interesse. Para saber mais, consulte a nossa Política de Privacidade.